Nirvana. Bebé da capa icónica do álbum Nevermind processa banda por “exploração sexual”

Nirvana. Bebé da capa icónica do álbum Nevermind processa banda por “exploração sexual”


30 anos depois do lançamento do álbum de sucesso Nevermind, Spencer Elden, o bebé protagonista da famosa capa do grupo, muda de ideias relativamente ao “privilégio” de ter sido o escolhido e pede uma indemnização de 150 mil dólares pela “exploração sexual infantil” de que diz ter sido vítima.


Imagine se milhões de pessoas o tivessem visto nu antes sequer de ter idade para poder decidir ou não se se queria expor dessa maneira… Imagine que o mundo inteiro o conhecesse apenas a partir de uma fotografia tirada aos quatro meses… Imagine ainda que essa fotografia tivesse valido milhões a alguém que a utilizou, “sem o seu consentimento” e sem que você tivesse sequer visto um cêntimo. O que sentira? Pois bem… Essa é a história de Spencer Elden, o protagonista da icónica capa do álbum Nervermind (segundo álbum de estúdio da banda grunge americana Nirvana, lançado em 24 de setembro de 1991).

A capa mostra Elden, um menino de quatro meses mergulhado numa piscina que segue uma nota de um dólar pendurada numa linha de pesca. À primeira vista pode parecer algo inofensivo… Há uns anos Elden até lhe achava bastante piada, afirmando que esse facto lhe abriu portas e o “ajudou com as miúdas”. Contudo, o seu ponto de vista tem-se alterado ao longo dos anos, até agora, momento em que o jovem americano decidiu processar a banda. Na passada terça-feira, 24 de agosto, Elden não só processou os membros da banda, como várias editoras, diretores de arte e outros indivíduos por alegadamente “violarem leis de pornografia infantil” e por lhe causarem sofrimento de longa duração ao “traficarem” a sua imagem por todo o mundo.

ACUSAÇÕES Elden defende que a sua “identidade e nome legal estão para sempre ligados à exploração comercial sexual que experienciou enquanto menor”. De acordo com o processo, os acusados “produziram, possuíram e publicitaram comercialmente pornografia infantil com Spencer, e lucraram com isso”. O processo diz ainda que “o uso de pornografia infantil fez parte do esquema de promoção do disco para gerar atenção, ganhar notoriedade, aumentar as vendas e conquistar atenção mediática e críticas”. Em entrevista ao The Guardian, o jovem afirma que “sofreu e continuará a sofrer danos ao longo da vida” como resultado da obra de arte, incluindo “sofrimento emocional extremo e permanente”, bem como “interferência no seu desenvolvimento normal e progresso educacional, tratamento médico e psicológico”.

“As imagens expuseram a parte íntima do corpo de Spencer e exibiram lascivamente os seus genitais desde o tempo em que ele era um bebé até a atualidade”, lê-se nos documentos legais. De acordo com as leis dos EUA, “as fotografias não sexualizadas de bebés não são consideradas pornografia infantil”. No entanto, o advogado de Elden, Robert Y. Lewis, argumenta que a inclusão da nota de um dólar (que foi sobreposta depois da foto ter sito tirada) faz com que o menor pareça “um trabalhador do sexo”.

Além disso, segundo a acusação, os pais de Spencer Elden nunca terão dado autorização por escrito para o uso das fotografias tiradas ao seu filho num centro aquático de Pasadena, em 1991. Alegam também que a banda prometeu cobrir os órgãos genitais de Elden com um adesivo, mas o acordo não foi mantido.

Também por não ter recebido qualquer compensação ou pagamento ao longo dos anos, a defesa pede uma indemnização de 150 mil dólares, 127 mil euros, a cada um dos 17 acusados, sejam eles indivíduos ou empresas.

O BEBÉ ESCOLHIDO Spencer Elden tinha apenas alguns meses de idade quando os seus pais receberam um telefonema do amigo e fotógrafo subaquático Kirk Weddle, que perguntou se poderia usar o seu bebé recém-nascido como parte de uma sessão fotográfica para uma banda emergente chamada Nirvana. Na época, o pai de Elden ajudava com cenários e adereços para sessões de fotografia. Inicialmente, Weddle tentou fotografar bebés numa aula de natação, mas nenhuma dessas imagens se encaixava naquilo que a Geffen Records (produtora norte-americana) procurava. Os pais aceitaram, por um valor simbólico de 200 dólares, o equivalente a 170 euros, talvez sem a consciência das proporções que a foto tomaria. Passado três meses e depois de já terem esquecido a sessão fotográfica, o casal viu o álbum a explodir e a imagem do seu filho por toda a parte. Nevermind, que incluiu os sucessos Smells Like Teen Spirit, Come As You Are e Lithium, vendeu 30 milhões de cópias em todo o mundo.

INCOERÊNCIAS “Eu fiquei feliz por eles me escolherem”, admitiu Elden numa entrevista dada em 2015 ao The Guardian. “A fotografia é forte porque acho que retrata o abandono da inocência e a maneira como toda a gente persegue o dinheiro cada vez mais rápido”, acrescentou. O jovem revelou também que esse facto “sempre foi uma coisa positiva que lhe abriu portas” e o ajudou “com as miúdas”: “Tenho 23 anos e sou um artista e a verdade é que esta história me deu oportunidade de trabalhar com Shepard Fairey (artista americano de arte urbana contemporânea). Ele é um grande conhecedor de música e quando soube que eu era o bebé dos Nirvana, pensou em mim!”, contou.

Ao longo dos anos, Spencer Elden já recriou a foto subaquática três vezes para marcar o 10.º, 20.º e 25.º aniversários do álbum, chegando também a tatuar a palavra “Nevermind” no peito. Mais recentemente, o seu ponto de vista começou a mudar e aquilo que outrora lhe ofereceu coisas boas, começou a ser sinónimo de uma grande “nuvem negra” sobre si. Em 2016 o seu discurso já não era o mesmo e Elden disse à Time Magazine que “estava a ficar cada vez mais chateado com a sua notoriedade à medida que envelhecia”. “Eu nasci já a fazer parte deste grande projeto e é chato porque me sinto famoso por nada”, explicou. “É difícil não ficar chateado quando se sabe a quantidade de dinheiro que esteve envolvida, sem que eu tenha ganho absolutamente nada”, sublinhou o jovem, exemplificando também o seu desconforto em alguns momentos: “Quando vou a um jogo de beisebol, penso que toda a gente que lá está já deve ter visto o meu pénis pequenininho e isso faz-me sentir que tive parte dos meus direitos humanos revogados”, frisou.

Os representantes do Nirvana e as produtoras ainda não responderam às reivindicações. O álbum fará 30 anos no próximo mês… Será que Elden voltará a mudar de ideias recriando a capa do álbum, mais uma vez?