Dei por mim, esta semana, a contar uma das histórias que aprendi no meu tempo de menino aos meus dois pequeninos – acordo estabelecido em família para cumprir todas as noites, antes do adormecer.
Se por um lado contei aquela história de memória, por outro, fui obrigado a inventar ao sabor do momento alguns pormenores de que nunca tinha ouvido falar. Porque os habituámos a ouvir uma história antes de adormecer, todas as noites dedicamos os últimos minutos do dia a contar-lhes aventuras, muitas aventuras.
É sabido que alguns contos tradicionais têm uma forte componente moral, outros, porém, valem simplesmente pelo mero entretenimento, pelo tempo que partilhamos com os nossos. Desta vez escolhi a história d’Os Três Porquinhos.
Vi-me obrigado a ser inventivo, para responder a um conjunto de perguntas apresentadas por esta espécie de comissão de inquérito infantil: “Qual a roupa que os porquinhos vestiam? Como era a casa? Porque é que não pediram ajuda? Não tinham telemóvel? Porque é que o lobo era mau? Onde estavam os pais dos porquinhos?”
Ser pai ou ser mãe é duro, exigente, é gratificante, um desafio permanente.
Admito que escolhi a história dos três porquinhos pela sua simplicidade e por ser fácil de contar. Estava exausto, queria repousar. Como são muito pequeninos, os meus filhos não entendem o significado maior desta história. Para o sucesso do momento basta empurrar as culpas para um tal lobo mau e mostrar o fracasso dos porcos preguiçosos em contraste com o sucesso do porco trabalhador. Enfim…
Adormeceram e o facto de serem crianças permitiu-lhes viver aquela espécie de magia decorrente do prodígio de se adormecer num lado e acordar noutro. Aliás, considero marcante na vida de qualquer um deixar de ser transportado para a cama sem dar por isso, depois de adormecer num sofá ou noutra cama que não a sua.
Concluindo. No dia seguinte fomos passear, dar um mergulho e depois demos-lhes tempo livre. Decidiram ir brincar para um estaleiro que por aqui há e eu, pai zeloso, impedi-os de o fazer com os materiais das obras, para não se magoarem. Entre choro e birra ficaram aborrecidos comigo e eu zangado com eles. Felizmente, ao contrário dos adultos, as crianças não ficam zangadas por muito tempo.
Quanto a mim, ainda sinto a consciência pesada. É que, já de noite, antes de adormecerem, não quiseram que fosse eu a contar a história, preferiram a mãe. Quando lhes pedi que me explicassem porquê, o mais velho disse-me que não queria as minhas histórias porque depois eu não os deixava “brincar às histórias”, explicando-me que tinham ido brincar para o estaleiro porque queriam construir uma casa para todos nós – para nos protegermos do lobo mau!!
Tinha toda a razão o pequeno Afonso. Com pele de cordeiro, ele anda por aí…
Posto isto, passei-lhes um alvará que lhes permitiu iniciar de imediato a construção do almejado abrigo. É justo.