A vida do país não é uma matriz


É tempo do PS deixar de governar em função da matriz. A permanente redução da vida económica e social do país a um quadradinho colorido é insustentável no curto prazo. A vida das famílias portuguesas e das empresas não pode estar pendurada naqueles pontinhos que andam para cima e para baixo ao sabor dos contágios.


Portugal, e muito em particular a Área Metropolitana de Lisboa, está a braços com aquilo a que os especialistas apelidam de “quarta vaga” pandémica. As mutações sucessivas do vírus deram origem à variante delta, popularmente conhecida como mutação indiana, que é muito mais infeciosa e tem guiado a um aumento drástico de incidências, sobretudo na população mais jovem, os não vacinados.  

Renascem medos, incertezas e a ameaça de novos fechamentos prolongados. Atendendo a que levamos mais de 18 meses de conhecimento sobre a pandemia, que a vacinação corre a bom ritmo e que o perfil dos infetados é muito diferente daquele verificado nas vagas anteriores, considero inaceitável ponderar sequer recorrer às soluções implementadas no auge da ignorância científica e política sobre a pandemia. Não podemos fazer tábua rasa de todo o processo de aprendizagem que obtivemos no último ano e meio.

Mais do mesmo conduziria a um agudizar da já grave crise social e económica que arrasta milhares de famílias para a precariedade e de empresas e pequenos negócios para as falências. O regresso a soluções de confinamento total ou parcial, como se vê já em países do hemisfério sul, constituiriam duros golpes nas noções de liberdade, democracia e participação cidadã que são a alma das nossas comunidades.

Com níveis de vacinação a aproximarem-nos da imunidade de grupo, se é que ela vai existir, a covid-19 evoluirá favoravelmente da condição de pandemia para a de endemia.

Como a doença pode nunca ser erradicada, vamos ter viver com ela. Um “novo normal” em que a covid-19 será encarada como outras doenças que não desapareceram mas com as quais aprendemos a lidar.

É crítico que os poderes públicos façam essa aprendizagem de forma célere para que novas soluções sejam colocadas em cima da mesa. Há uma reflexão que tem de ser feita sobre as medidas que funcionaram bem, as que não funcionaram e as que, tendo efeito, não podem ser repetidas pela desproporção entre meios e fins, aproveitando o conhecimento e a experiência local, nacional, europeia e internacional.

O risco é inerente à vida em sociedade. O país não se pode dar ao luxo de fechar a cada contrariedade. Admito que fechar, fechar tudo, seja uma solução limite porque politicamente mais penalizadora. Todavia, há que dizê-lo, é também aquela que é intelectualmente menos exigente.

Até porque as circunstâncias mudaram, os portugueses não compreenderiam que baixassem sobre as nossas vidas novas cortinas de ferro pandémicas. Recorrer a novos confinamentos em circunstâncias endémicas é como tentar matar mosquitos com canhões: acabaremos sempre por causar mais danos não intencionais do que concretizar objetivos específicos.

Aos Governos exige-se que sejam audazes. Que olhem para o problema com novas lentes e que apresentem novas soluções para um desafio que, sendo antigo pela medida de tempo no mundo digital, não deixa de nos causar ainda muitos constrangimentos políticos, económicos e sociais.  

Olhando para a minha realidade, a local, estimo que dentro de 30 a 60 dias, na pior das hipóteses até ao fim de agosto, esteja concluída a vacinação no meu concelho. Até lá, até pelo menos toda a gente ter uma das doses, continuaremos a apostar num programa de testagem massivo com cinco autocarros que percorrerão as ruas e bairros de Cascais. Para se ter uma ideia da importância deste tipo de programas na quebra de cadeias de contágio, em apenas 7 dias de operação, entre jogos da seleção e idas aos mercados e feiras, foram testados voluntariamente 3500 cidadãos. Resultado? Identificados 1% de infetados. Todos assintomáticos, jovens e não vacinados. Uma vez mais, o perfil demográfico mais afetado pela variante delta. Tomando esta amostra para a minha análise, 1% de incidência pode sugerir que há ainda 2000 pessoas em Cascais já infetadas ou em risco de o serem e nem sequer sabem que o estão. Quando a pandemia estalou, foi colocado em cima da minha secretária um estudo que apontava para um total 25 mil infetados em Cascais. Estamos em 18 mil, cerca de 18 meses depois. Tomando como bons estes números, há ainda potencial para mais 7 mil infetados nos tempos mais próximos. 

 As sociedades ocidentais, e a portuguesa não é exceção, estão muito desgastadas com as necessárias limitações às liberdades. As medidas confrontam-se cada vez com a chamada fadiga pandémica. As pessoas estão zangadas com muitos erros que foram cometidos. Mas, sobretudo, não perdoam a falta de consistência de algumas políticas que nem sempre foram coerentes.

A pandemia evoluirá para uma endemia em dois ou três meses. Este é o tempo que o Governo tem para pensar uma estratégia, que tem de ser sólida, coerente e perceptível.

Quem tem um pouco de memória ainda se lembra de ouvir o PS acusar Pedro Passos Coelho de Governar com um Excel no tempo de emergência da troika. Pois é tempo do PS deixar de governar em função da matriz. A permanente redução da vida económica e social do país a um quadradinho colorido é insustentável no curto prazo. A vida das famílias portuguesas e das empresas não pode estar pendurada naqueles pontinhos que andam para cima e para baixo ao sabor dos contágios. O país reivindica uma verdadeira mudança de paradigma. A matriz importa, mas é só parte da história, não é a verdade toda.

Precisamos de menos matriz e de mais política, de mais audácia e de mais coragem.  

As quarentenas, os isolamentos e os confinamentos podem ter os dias contados. Assim tenhamos coragem de pensar diferente. E fazer o que é preciso.

 

Presidente da Câmara Municipal de Cascais

Escreve à quarta-feira


A vida do país não é uma matriz


É tempo do PS deixar de governar em função da matriz. A permanente redução da vida económica e social do país a um quadradinho colorido é insustentável no curto prazo. A vida das famílias portuguesas e das empresas não pode estar pendurada naqueles pontinhos que andam para cima e para baixo ao sabor dos contágios.


Portugal, e muito em particular a Área Metropolitana de Lisboa, está a braços com aquilo a que os especialistas apelidam de “quarta vaga” pandémica. As mutações sucessivas do vírus deram origem à variante delta, popularmente conhecida como mutação indiana, que é muito mais infeciosa e tem guiado a um aumento drástico de incidências, sobretudo na população mais jovem, os não vacinados.  

Renascem medos, incertezas e a ameaça de novos fechamentos prolongados. Atendendo a que levamos mais de 18 meses de conhecimento sobre a pandemia, que a vacinação corre a bom ritmo e que o perfil dos infetados é muito diferente daquele verificado nas vagas anteriores, considero inaceitável ponderar sequer recorrer às soluções implementadas no auge da ignorância científica e política sobre a pandemia. Não podemos fazer tábua rasa de todo o processo de aprendizagem que obtivemos no último ano e meio.

Mais do mesmo conduziria a um agudizar da já grave crise social e económica que arrasta milhares de famílias para a precariedade e de empresas e pequenos negócios para as falências. O regresso a soluções de confinamento total ou parcial, como se vê já em países do hemisfério sul, constituiriam duros golpes nas noções de liberdade, democracia e participação cidadã que são a alma das nossas comunidades.

Com níveis de vacinação a aproximarem-nos da imunidade de grupo, se é que ela vai existir, a covid-19 evoluirá favoravelmente da condição de pandemia para a de endemia.

Como a doença pode nunca ser erradicada, vamos ter viver com ela. Um “novo normal” em que a covid-19 será encarada como outras doenças que não desapareceram mas com as quais aprendemos a lidar.

É crítico que os poderes públicos façam essa aprendizagem de forma célere para que novas soluções sejam colocadas em cima da mesa. Há uma reflexão que tem de ser feita sobre as medidas que funcionaram bem, as que não funcionaram e as que, tendo efeito, não podem ser repetidas pela desproporção entre meios e fins, aproveitando o conhecimento e a experiência local, nacional, europeia e internacional.

O risco é inerente à vida em sociedade. O país não se pode dar ao luxo de fechar a cada contrariedade. Admito que fechar, fechar tudo, seja uma solução limite porque politicamente mais penalizadora. Todavia, há que dizê-lo, é também aquela que é intelectualmente menos exigente.

Até porque as circunstâncias mudaram, os portugueses não compreenderiam que baixassem sobre as nossas vidas novas cortinas de ferro pandémicas. Recorrer a novos confinamentos em circunstâncias endémicas é como tentar matar mosquitos com canhões: acabaremos sempre por causar mais danos não intencionais do que concretizar objetivos específicos.

Aos Governos exige-se que sejam audazes. Que olhem para o problema com novas lentes e que apresentem novas soluções para um desafio que, sendo antigo pela medida de tempo no mundo digital, não deixa de nos causar ainda muitos constrangimentos políticos, económicos e sociais.  

Olhando para a minha realidade, a local, estimo que dentro de 30 a 60 dias, na pior das hipóteses até ao fim de agosto, esteja concluída a vacinação no meu concelho. Até lá, até pelo menos toda a gente ter uma das doses, continuaremos a apostar num programa de testagem massivo com cinco autocarros que percorrerão as ruas e bairros de Cascais. Para se ter uma ideia da importância deste tipo de programas na quebra de cadeias de contágio, em apenas 7 dias de operação, entre jogos da seleção e idas aos mercados e feiras, foram testados voluntariamente 3500 cidadãos. Resultado? Identificados 1% de infetados. Todos assintomáticos, jovens e não vacinados. Uma vez mais, o perfil demográfico mais afetado pela variante delta. Tomando esta amostra para a minha análise, 1% de incidência pode sugerir que há ainda 2000 pessoas em Cascais já infetadas ou em risco de o serem e nem sequer sabem que o estão. Quando a pandemia estalou, foi colocado em cima da minha secretária um estudo que apontava para um total 25 mil infetados em Cascais. Estamos em 18 mil, cerca de 18 meses depois. Tomando como bons estes números, há ainda potencial para mais 7 mil infetados nos tempos mais próximos. 

 As sociedades ocidentais, e a portuguesa não é exceção, estão muito desgastadas com as necessárias limitações às liberdades. As medidas confrontam-se cada vez com a chamada fadiga pandémica. As pessoas estão zangadas com muitos erros que foram cometidos. Mas, sobretudo, não perdoam a falta de consistência de algumas políticas que nem sempre foram coerentes.

A pandemia evoluirá para uma endemia em dois ou três meses. Este é o tempo que o Governo tem para pensar uma estratégia, que tem de ser sólida, coerente e perceptível.

Quem tem um pouco de memória ainda se lembra de ouvir o PS acusar Pedro Passos Coelho de Governar com um Excel no tempo de emergência da troika. Pois é tempo do PS deixar de governar em função da matriz. A permanente redução da vida económica e social do país a um quadradinho colorido é insustentável no curto prazo. A vida das famílias portuguesas e das empresas não pode estar pendurada naqueles pontinhos que andam para cima e para baixo ao sabor dos contágios. O país reivindica uma verdadeira mudança de paradigma. A matriz importa, mas é só parte da história, não é a verdade toda.

Precisamos de menos matriz e de mais política, de mais audácia e de mais coragem.  

As quarentenas, os isolamentos e os confinamentos podem ter os dias contados. Assim tenhamos coragem de pensar diferente. E fazer o que é preciso.

 

Presidente da Câmara Municipal de Cascais

Escreve à quarta-feira