Lille. Os Mastins saíram da sombra e arreganharam os dentes

Lille. Os Mastins saíram da sombra e arreganharam os dentes


Pela quarta vez campeão de França, o LOSC interrompeu mais um ciclo do PSG e parece viver um tempo firme da sua história.


Que foi uma surpresa das antigas, lá isso foi, sem dúvida alguma. O Lille interrompeu uma lista de três vitórias consecutivas do Paris-Saint Germain no campeonato francês e, mais do que isso, interrompeu mais uma tentativa de domínio absoluto parisiense, tal e qual aconteceu com o Mónaco em 2017 – reparem que desde 2013 o PSG só perdeu estes dois títulos. Quatro portugueses fizeram parte da aventura levada a cabo pelo clube da pequena cidade (cerca de 230 mil habitantes) do norte de França, quase junto_à fronteira com a Bélgica e que tem um estádio ao bom estilo inglês, o Stade Pierre-Mauroy, que não deixa de influenciar as equipas visitantes com a sua acústica impressionante – José Fonte e Renato Sanches estão presente na convocatória de Fernando Santos para o Campeonato da Europa que bate aí à porta, Tiago Djaló e Miguel Ângelo da Silva Rocha, conhecido por Xeka, que foi cedido pelo Braga em 2017,

Este é, portanto, o quarto título do Lille no campeonato de França: 1946, 1954, 2011 e 2021. Títulos que ganham força e importância num clube que nasceu com o nome de Stade Lillois em 1944 graças à fusão de dois clubes de diferentes bairros da cidade, o Olympique Lillois e Sporting Club Fivois, que tinham sido fundados, respetivamente, em 1902 e 1901– vinha ao mundo o Lille Olympique Sporting Club, que os franceses frequentemente reduzem ao acrónimo LOSC.

O Olympique Lillois orgulhava-se de ser o primeiro clube a vencer o campeonato de França da era profissional, em 1933, e tinha, obviamente, um peso especial na nova instituição. Curiosamente, a a despeito de estar instalado numa das zonas do país mais massacradas pela II_Grande Guerra, o Lille surgiu absolutamente dominador logo após o armistício. O campeonato de 1946 foi festejado como todos vós podem imaginar. Na década que se seguiu ganhou cinco Taças de França e voltou a ser campeão em 1956. Estávamos perante um clube que não era para brincadeiras. Lechantre, Baratte, Bourbotte e Sommerlinck eram jogadores de renome e titulares da seleção francesa. E tudo parecia correr bem ao clube a quem alguns tratavam por Os Leões e outros por Os Mastins.

 

Crise

De repente, e como acontece com todos os clubes, tenham eles o tamanho que tiverem, uma profunda crise económica arrasou o LOSC. Aliás, a crise foi de tal forma dura que o clube desistiu do futebol profissional em 1969 e foi relegado para as divisões mais rasteiras.

O sofrimento acabou em 1980, por via do auxílio fundamental da “mairie”, a Câmara Municipal, que ajudou a estabelecer um projeto de recuperação económica que acabaria por se transformar numa privatização em 1999. Hoje em dia, o presidente do novo campeão de França é Olivier Létang, CEO da empresa Merlyn Partners SCCp. E ninguém pode dizer que o Lille não está bem entregue.

O facto de se terem alegremente juntado num só clube não varreu para debaixo do tapete todas as rivalidades que vinham de trás. Até 1949, por exemplo, o Lille jogava alternadamente nos campos dos clubes que estiveram na origem da fusão. Finalmente instalaram-se no Estádio Henry-Jooris, que era propriedade do Olympique, até que foi demolido em 1975 para dar lugar ao Grimonprez-Jooris. Foi precisamente aí que se gravaram várias cenas do filme Le Corps de Mon Ennemi realizado por Henri Verneuil – numa delas, Jean Paul Belmondo observa encantado o novo espaço desportivo que ganhou o nome oficial de Stade Auguste Beaumont-Liégeard. Nessa mesma altura, Eric Castel, essa personagem de banda desenhada que teve sucesso e se fazia transferir do Milan para o Lille. Mas o crescimento contínuo da agremiação obrigava a mais. Aliás, o Lille também ganhara outra designação no interim LOSC Métropole. E o campo de jogos foi erguido em Villeneuve-d’Ascq e chamava-se, o mais simplesmente possível, Lille Métropole. Desde a época de 2012-2013, fixou-se no Pierre-Mauroy, um dos quatro maiores estádios de França.

É esta a história resumida a meia dúzia de linhas do campeão da França, capaz de bater o monstro que se chama PSG. Os Mastins desde que se viram no primeiro lugar da tabela, ferraram os dentes à vontade indomável de serem campeões e aí os teremos na próxima edição da Champions League. Dando razão a uma frase posta na boca de Aimé Jacquet, treinador da França campeã do mundo em 1998: “ L’ogre lillois, tapi dans l’ombre, qui attend son heure !” A hora já chegou.