Com a pandemia a assolar o país e o mundo há mais de um ano, deixando sequelas em muitos dos doentes recuperados da covid-19, o Turismo do Porto e Norte de Portugal (TPNP) decidiu investir na promoção das mais de duas dezenas de estâncias termais da região, sublinhando o produto como potenciador de saúde e bem-estar. Em simultâneo, a Associação das Termas de Portugal está a desenvolver programas direcionados para a recuperação dos doentes pós-covid. A nova marca Termas do Porto e Norte de Portugal quer apostar na divulgação das termas no âmbito da terapêutica, mas também no âmbito do bem-estar e do lazer, “para que seja um produto turístico opcional para férias e/ou fruição de fins de semana com valor acrescentado daquilo que a água termal tem para oferecer, mas também de todas as infraestruturas e ofertas turísticas das imediações”. E já tem uma equipa de especialistas a estudar em como fazê-lo.
AS TERMAS NA LINHA DA FRENTE DO SÍNDROME PÓS-COVID “Atualmente, as termas são muito mais do que locais para tratamento de doenças (…). Desde o início deste século, que estas têm investido fortemente na modernização de infraestruturas, equipamentos e serviços, com o intuito de se reposicionarem como locais de promoção de Saúde, Bem-Estar e Lazer”, informa João Pinto Barbosa, secretário geral da Associação Termas de Portugal (ATP), em declarações ao i.
A pandemia trouxe “a alteração de comportamentos e motivações de procura de bens e serviços turísticos e de saúde”, constata Pinto Barbosa. O interesse por serviços de saúde para prevenção de doenças, reforço de imunidade e promoção de comportamentos e estilos de vida saudável assistiu a um grande aumento e, o responsável acredita que “continuará a ter um crescimento exponencial nos próximos anos”.
As mudanças começaram a notar-se no verão do ano passado. A procura de “destinos desmassificados no interior do país”, de “destinos e momentos de lazer em contacto com a natureza” e “em unidades de alojamento turístico de menor dimensão”, revela-se “uma tendência que tende a perdurar”, diz o secretário-geral da ATP. Neste sentido, tanto as termas, como os territórios termais têm, nesta nova realidade, fortes oportunidades para afirmarem o seu posicionamento como destinos de saúde e bem-estar, seguros e saudáveis.
Luís Pedro Martins, presidente do Turismo do Porto e Norte de Portugal (TPNP), vai mais longe e acrescenta que falar do produto turístico de saúde e bem estar é “falar de um produto que excede a simples motivação de lazer, mas que se direciona para um conjunto de motivações que impulsionam o cliente para a recuperação do seu bem-estar físico e psíquico e, também, para realização de tratamentos específicos e medicamentos prescritos”.
A Associação das Termas de Portugal está a desenvolver um trabalho exaustivo com a sua comissão técnico científica, que adianta ser “composta por reputados médicos especialistas em hidrologia médica e nas áreas de maior incidência de patologias resultantes de sequelas pós-covid-19”. E está em curso a preparação de um conjunto de programas e procedimentos do ponto de vista médico e de gestão de serviço para que possam estar preparadas para acolher clientes que apresentem sequelas.
A maioria dos doentes recupera totalmente, mas segundo os dados da Organização Mundial de Saúde, cerca de 10% evidenciam queixas sistémicas, respiratórias, neurológicas, vasculares, cardíacas e gastrointestinais. “As termas podem dar resposta a essas sequelas, porque são unidades prestadoras de cuidados de saúde na maioria das áreas em questão, estando preparadas para cuidar de doentes no atual contexto”, considera.
As regras ficaram definidas na reabertura do ano passado. Implementaram-se os requisitos da Orientação nº 031/2020 da Direção-Geral de Saúde (Estabelecimentos Termais e covid-19) “que define os procedimentos a adotar na reabertura e funcionamento dos estabelecimentos termais em contexto pandémico enquanto instrumento adicional ao cumprimento das normas e disposições legais vigentes”. É nesse quadro que a ATP se propõe a desenvolver um trabalho para dotar as termas de condições específicas para receber e dar resposta aos doentes com síndrome pós-Covid-19. A ATP está ainda “em permanente contacto com as suas congéneres na Europa”, pois esta estratégia de atuação e de inovação está também “alicerçada na declaração do Parlamento Europeu”.
AS TERMAS Tuteladas pelo Ministério de Marta Temido, as termas prestam cuidados de saúde através de tratamentos prescritos nos cuidados de saúde primários do Serviço Nacional de Saúde, sendo as despesas com consultas e tratamentos prescritos sujeitos a comparticipação do Estado. “As águas minerais naturais, genericamente apelidadas também de águas termais, têm propriedades terapêuticas reconhecidas oficialmente e validadas cientificamente para tratamento de patologias crónicas diversas, entre as quais as alergias respiratórias e dermatológicas, reumatismos e outras patologias músculo-esqueléticas, patologias do aparelho digestivo, doenças metabólicas entre outras”, explica o secretário-geral da ATP.
Cada água termal tem o seu “ADN”, conferindo-lhe uma identidade única do ponto de vista dos benefícios para a saúde. “Esse é o principal elemento que confere à terapêutica termal a sua identidade e a sua diferenciação face às restantes opções terapêuticas”, continua. O que muitos portugueses desconhecem é que a terapêutica termal, alicerçada na denominada Hidrologia Médica, está integrada na Ordem dos Médicos, através de um Colégio da Competência em Hidrologia Médica e é reconhecida e integra a lista de especialidades médicas da Organização Mundial de Saúde desde 1985.
A APOSTA NAS COMUNIDADES LUSODESCENDENTES Além desta aposta em estratégias de “combate” ao síndrome pós-covid-19, o presidente do Turismo do Porto e Norte de Portugal adiantou que o destino Porto e Norte está a “desenvolver ações para captar as comunidades lusodescendentes” para que sejam “clientes parceiros” e também “embaixadores” do produto turístico termal nos países para onde emigraram: “O Turismo do Porto e Norte de Portugal tem trabalhado de forma muito ativa com a Associação das Termas de Portugal e a Associação Internacional dos Lusodescendentes. Alinhámos a nossa estratégia de atuação neste o período pandémico no âmbito do Turismo de Saúde e Bem-Estar, para a afirmação do Norte de Portugal enquanto destino turístico de excelência”, informa.
O responsável revela ainda que este trabalho conjunto tem especial enfoque nas comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo, “no sentido de inovar e encontrar soluções, valorizando-as, demonstrando que a sua presença é importante e que poderão também ser portadoras do seu testemunho junto das comunidades do seu país de acolhimento”.
Posto isso, a rede de Termas do Porto e Norte de Portugal poderá ajustar-se aos tratamentos prescritos pelos médicos de família e apoiados pelos sistemas de seguros e de saúde dos vários países, podendo os lusodescendentes “articular esse momento com a visita às suas famílias, proporcionando-lhes matar saudades e momentos verdadeiramente inesquecíveis”, sublinha. “Queremos realçar a importância que têm para todos nós os momentos de felicidade e reencontro das comunidades que têm estado tanto tempo separadas. Saber dar a devida importância a estes momentos de afetos e reencontro, e não ter apenas uma racionalidade economicista, é muito importante”, realça o presidente.
A ESTRATÉGIA LÁ FORA Não é só Portugal a querer a aproveitar a retoma nesta área. Os efeitos dos programas de vacinação para um regresso a uma normalidade afiguram-se como um raio de esperança e de acordo com um relatório da Global Wellness, o turismo de bem-estar está programado para crescer a uma taxa média anual de 7,5% até 2022.
Um estudo recente realizado pela American Express constata que, em 2021, os viajantes estão focados no planeamento de viagens futuras como “uma forma de relaxar, seja por meio de experiências focadas no bem-estar, descobertas culinárias ou encontros com familiares e amigos”.
No que toca aos destinos escolhidos, os países do sudeste asiático têm sido um dos pontos no mapa na área do wellness. Chiang Mai, na Tailândia, e Bali, na Indonésia, muito conhecidos pelas suas rotas de ioga, meditação e peregrinação, podem beneficiar com o aumento da procura, apontou uma análise publicada em março por dois investigadores da Universidade Bournemouth, no Reino Unido e da Universidade West Chester, na Pensilvânia. As pessoas viajam para esses locais com o intuito de “aprender e praticar a atenção plena, a fim de recarregar as baterias, alcançar a realização espiritual, aumentar seu bem-estar espiritual e encontrar um verdadeiro eu”, lê-se na análise.
Como caminho, defendem no entanto que não se volte ao mesmo e que se procure uma abordagem mais sustentável para todos, forasteiros e comunidades locais. Desde logo, começar por atrair turismo doméstico. Neozelandeses, por exemplo, proibidos de fazer viagens internacionais, migraram para as remotas ilhas de Chatham, pouco visitadas; os cambojanos aproveitaram a ausência de cerca de três milhões de turistas anuais para visitar Angkor Wat. A pandemia, por isso, foi vista como um momento que permitiu redefinir desequilíbrios sociais de longa data que acabavam por impedir a população local de desfrutar dos seus próprios espaços.
A aposta na melhoria do turismo doméstico não ajuda apenas a melhorar os negócios locais desses destinos, como também contribui para o bem-estar das próprias comunidades. Mas nem todos têm as mesmas ferramentas de promoção: os instrutores locais de ioga balinesa, entre influencers e redes sociais, tiraram muito proveito disso ao longo dos últimos anos. Mas durante a pandemia muitas foram as instalações locais que lutaram pelos seus negócios sem as capacidade técnica e hardware para competir. Dessa forma, o estudo da American Express aponta que deve ser fornecido apoio a pequenas empresas de turismo de bem-estar de propriedade local.
E, por último, o documento chama a atenção para a importância do combate da gentrificação. À medida que o turismo renasce gradualmente, é importante que as empresas e governos não se concentrem apenas no mercado de bem-estar de luxo. Os governos locais, autoridades de turismo, grandes empresas e organizações internacionais devem apoiar empresas de pequena escala baseadas na comunidade em áreas remotas para construir um setor de turismo de bem-estar mais abrangente de forma a ajudar na redução da desigualdade económica, criando novos meios de subsistência, especialmente em áreas rurais onde as taxas de pobreza são altas. Por exemplo, além dos destinos populares da Tailândia e Índia, sugerem que se comece a dar mais enfoque a locais mais pobres como o Laos, o Nepal e o Sri Lanka.