As bétulas são árvores tristes. Têm um tronco branco, quase sinistro. 50o, 2’ e 09”de latitude norte; 19o, 10’ e 42’’ de longitude este. Olho em volta e só vejo troncos brancos. Brancos e cúmplices. Quem veio desvendar o seu segredo? Quem veio procurar entre elas o ponto mais baixo da humanidade? Auschwitz é um nome fétido. Cheira a fumo e a queimado junto à chaminé de tijolo, monumento eterno ao tempo em que assassinaram a fraternidade. E a ternura? Em que lugar ficava a ternura? As bétulas calam-se. De vez em quando, uma brisa no silêncio. É o seu murmúrio. Ah! Quantos segredos têm as bétulas por contar? Murmuram de umas para as outras a vergonha que sentem de nada terem podido fazer para combater a barbárie. Eu desculpo as bétulas. Deus também não se mexeu, não ergueu o dedo da sua omnipotência, não cerrou o punho da sua eternidade. Teve medo. Teve medo das botas que marchavam arrastando a gravilha por baixo da porta de ferro que diz “Arbeit macht frei”. Deus/Cristo também teve medo: afinal, era judeu. Preferiu o madeiro metafórico dos nossos pecados, preferiu a quase nudez do sudário, não teve a coragem de entrar para lá destes muros carregados de arame farpado vestindo um pijama às riscas e de caminhar, de cabelo rapado, na fileira infinita dos seus irmãos abandonados. Quantos Cristos em Auschwitz? Contaste-os, Deus? Dois, três, quatro milhões? Não tens dedos para contá-los, Tu que fizeste o homem à Tua imagem e semelhança. Quais deles eram mais à Tua imagem e semelhança? Os que vestiam a farda com o emblema da caveira ou os que eram caveiras adiadas até ao momento de nem caveiras poderem ser?
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