Eduardo Miranda não tem dúvidas: não são só os empresários do alojamento local que estão a atravessar dias difíceis. Todas as pessoas envolvidas neste setor estão a viver o mesmo problema, desde quem fazia limpezas aos que davam apoio ao check-in e check-out, assim como todos os serviços à volta desta atividade: lavandarias, talhos, mercearias, entre outros. O presidente da ALEP admite que muitos já estão a encontrar alternativas, como arrendamento para estudantes ou de média duração, mas lembra que a carga fiscal para quem abandona este negócio funciona como um entrave à mudança. Para já, a migração para o arrendamento de longa duração será reduzida, e considera que ela não irá resolver o problema da habitação.
Um dos setores afetados pela pandemia é o alojamento local. Que impacto está a ter nesta atividade?
A situação, com o prolongar da crise e principalmente com o agravamento da mesma, está a tornar a situação dramática para os operadores. Das pessoas que estão ligadas ao alojamento local é importante salientar que a maioria vive desta atividade, ou seja, são profissionais do turismo e do alojamento local. Neste momento não há procura e, sem mobilidade e com o confinamento, a lógica do turismo não é viável. Estamos a falar hoje de quedas de faturação que nos centros urbanos chegam aos 90% e ultrapassam mesmo os 90% em alguns casos. A nível nacional, regiões como o Algarve e algumas zonas do interior conseguiram, durante a época do verão, reduzir o impacto da quebra de turistas durante duas ou três semanas, mas a partir de setembro/outubro também começaram a ver a sua atividade a cair e estão com um negócio muito baixo ou quase parado. Está a tornar-se um problema social gravíssimo a nível nacional, e não só o alojamento local em si só: são os funcionários, as empresas envolvidas, os fornecedores, as empresas que fazem as limpezas, as pessoas que fazem o check-in e o check-out, a manutenção, as lavandarias de bairro. Havia aqui todo um ecossistema de empresas e de gestão que também acabam, indiretamente, por ser afetadas. Sem falar no comércio local: muito do comércio local que está envolto nessas zonas tinha uma componente grande dos clientes que eram provenientes do alojamento local.
Acaba por afetar uma série de atividades…
Sim. O alojamento local representava qualquer coisa como 40% das dormidas. Em Lisboa e no Porto chegava aos 50% e, no caso do Porto, até ultrapassava. Estamos a falar daquilo que era um dos pilares para o turismo. Sem alojamento não há turismo. Isso significa que para não deixarmos cair tudo aquilo que fizemos no turismo até hoje temos de optar por duas vias importantes. Uma delas é a do apoio às empresas – não há quem consiga sobreviver quase um ano sem receitas. Já saíram alguns apoios, mas estavam pensados para aguentar três, quatro ou cinco meses de paralisação, e agora estamos numa fase em que é preciso um reforço importante. Além disso, temos uma situação que ainda é mais agravante: muitos são empresários em nome individual, o que cria uma série de obstáculos para terem acesso aos apoios, porque muitos dos apoios estão destinados às empresas e a quem tem contabilidade organizada. No caso das empresas, o layoff tem sido uma ajuda importantíssima, mas agora precisamos de mais apoios – como é o caso do Apoiar.pt – porque as empresas não tiveram acesso a um financiamento a fundo perdido e o endividamento está a chegar a uma situação-limite. A outra parte diz respeito às alternativas: temos de ter sempre em mente planos B. Numa crise tão profunda como esta, é normal e razoável que haja quem não consiga aguentar e precise de encontrar alternativas. Mas aí esbarramos no grande obstáculo que existe neste momento para quem precise de encontrar uma alternativa, que é a questão da mais-valia. Não há histórico de nenhum setor que esteja de alguma forma aprisionado na atividade por uma questão fiscal. É algo que estamos a tentar resolver há alguns anos e, quando pensámos que ia ficar resolvido este ano, infelizmente, a proposta que foi apresentada no Orçamento do Estado dá um passo à frente e depois dá dois para trás.
Esse problema foi agravado?
O nosso problema sempre foi o facto de termos de pagar um imposto quando se quer desistir da atividade. Ou seja, quem é proprietário de um alojamento local tem de pagar à saída um imposto como se tivesse vendido um imóvel, mesmo que não tenha vendido nada. Trata-se de um imposto fictício. Desistir do alojamento local é quase a mesma coisa que vender um imóvel. Mas, como é natural, se não houver uma venda, as pessoas não têm condições para pagar um imposto e, como tal, não podem sair da atividade do alojamento local. E isso era uma questão que queríamos ultrapassar. A nossa proposta era muito simples e era fazer como qualquer cidadão faz: só paga imposto de mais-valias se vender o imóvel. Pagar essa mais-valia só tem sentido se realmente for vendido o imóvel. O que a lei diz é que deixar a atividade é equivalente a desistir do imóvel. Entretanto, a proposta que foi agora entregue responde ao nosso pedido, o que é de bom senso, ao determinar que só se paga o imposto quando se vender o imóvel, mas não resistiram e criaram um outro e que não é solução. Ou seja, criaram um novo imposto e que também é pago à saída. No momento em que se abandona a atividade é necessário pagar um imposto ainda mais fictício e que não tem qualquer explicação, já que terá de ser pago em função do valor patrimonial do imóvel e que será multiplicado por todos os anos em que o imóvel esteve em atividade.
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