Hoje à noite, Paulo Gonzo e a sua banda sobem ao palco do Rosa Mota, no Porto. Amanhã estará em Lisboa, no Campo Pequeno, num regresso aos concertos ao vivo depois de vários meses de confinamento, apesar de ter estado em palco em Almeirim, com a banda reduzida, devido às imposições da Direção-Geral da Saúde. Gonzo admite que o confinamento não o inspirou e que o disco que agora promove foi feito antes da pandemia.
Estes dois concertos, hoje e amanhã, servem para apresentar o novo CD.
Este é uma chancela da Sony, é uma marca original americana e chama-se “Essential” – o logo é igual, o lettering é igual, a cor é igual. No meu caso tivemos de pedir autorização à Sony americana para mudarmos o “t” para um “c”, para que as pessoas não pensassem que existia um erro ortográfico na capa e ainda não tinham começado a ouvir o disco. Normalmente, este “Essential” é atribuído a artistas com alguma longevidade e que tenham a carreira mais instalada.
É um CD lançado com músicas novas?
Tem três inéditos e o resto são temas, em que uns veem de 1992. É um disco com 19 temas e foi-me pedido pela Sony antes da pandemia. Estes inéditos estavam feitos antes da pandemia. Aquele título “Está tudo bem” não tem nada a ver com esta história e, por acaso, ainda bem, porque é um disco que não fere muita gente, ou seja, é um disco com muitas músicas que as pessoas queriam e estavam à espera, e não é um disco só com originais. É um disco instalado numa pandemia que cai muito bem.
Mas com a pandemia não tiveram vontade de fazer alguma alteração?
Não. Aliás, a escolha foi feita antes da pandemia.
Mas como saiu depois…
Este disco devia ter saído em março, mas só foi lançado em outubro, com uma antecipação de dois temas – temas que tive tempo, já depois do confinamento total, de fazer dois videoclipes para cada uma destas canções: “Está Tudo Bem” e “Quem Foi”, com a Maria João Bastos [veja abaixo]. Foi extraordinária, foi muito generosa. Por acaso havia algum receio, porque a ideia era arranjar uma sequência de imagens e, como ela nunca tinha feito um clipe, tudo foi feito com ela a ver se gostava ou não.
Ainda na semana passada, alguém na Assembleia da República disse “Dei-te quase tudo”. Primeiro,
o que sente quando vê um deputado usar uma música sua para responder a alguém e, em segundo lugar,
essa música também faz parte do disco?
Isso não é inédito. Já tinha visto há muitos anos num programa na RTP, o Contra-Informação, quando saiu o “Dei-te Quase Tudo”, aparecia o Mário Soares na bateria e interpretavam o tema, cantando e tocando o tema. É um tema que dá para quase tudo. Em relação à Assembleia, achei graça porque, normalmente, as pessoas reveem-se muito nos meus temas e nas minhas canções. Uma delas, o “Jardins”, é uma música de fertilidade. Há muitas pessoas que nasceram por causa dessa música. As pessoas dizem-me: “Casei por sua causa”, “Separei-me por causa de si”, “Tenho dois filhos à sua custa”. Essas coisas acontecem, e ainda bem.
Este novo CD tem essas músicas icónicas?
Tem. Tem o “Jardins”, o “So Do I” e algumas versões ao vivo. Tem uma das músicas gravadas em Nova Iorque, outras em Bruxelas. Esse lado foi o mais difícil porque tem a ver com a logística, porque tinha de pôr uns créditos nesse disco com temas de 1992 e gravados com outros músicos, com outros produtores, com músicos estrangeiros. Isso foi o que deu mais chatices e tive de fazer uma mastreação toda de forma a equilibrar esses temas antigos que tinham sido gravados em condições diferentes e com meios técnicos diferentes.
Parte deste disco foi gravado em Nova Iorque?
Um dos temas foi, outro foi gravado em Madrid, outro em Bruxelas, e há alguns duetos, como é o caso da Ana Carolina.
Mas porquê? Os músicos estavam lá?
Os músicos estavam lá, gravei lá e tinha de recuperar. Os técnicos eram americanos e esses créditos têm de estar lá todos, inclusive com músicos belgas e franceses que participaram em alguns temas. Portanto, é um disco que me deu mais chatices, passe a expressão, do que os outros.
Fala em temas icónicos e quando o vi tem palco disse “Deixem-me tocar blues”. É um duplo sentimento? De um lado estão as canções que dão um grande sucesso comercial e, de outro, as que dão um grande gozo pessoal?
Isso tem uma explicação e que está relacionada com as raízes que tenho. Mesmo nos temas mais pop, todos têm um cordão umbilical que unem esses conceitos, que são os instrumentos utilizados e a sonoridade que uso. Faço uma ligação em termos de conceito.
Mas o que pergunto é se tivesse uma pistola apontada à cabeça e tivesse de escolher entre a música comercial e os blues, o que salvava?
Não consigo responder. Está a perguntar-me o que escolhia, o meu pai ou a minha mãe.
Enquanto músico, como viveu o confinamento?
Já houve pessoas que me colocaram esta questão e perguntaram-me se isso serviu para me inspirar. Não me inspirei em rigorosamente nada. Nem sequer pensei em música. Há pessoas que dizem que cantam no duche – nunca cantei no duche, nem na banheira. Cozinhei. Aquilo foi um estalo, foi uma pedrada no charco. Acho que muita gente não percebeu logo isso ao princípio, mas o que é um facto é que teve repercussões e durou. O meu último espetáculo foi a 7 de fevereiro no Casino da Póvoa. A nossa vida mudou e tudo o que parecia meio estranho passou a ser uma coisa muito real e cruel, que é o que vemos hoje. Desde então, só agora é que voltei a ensaiar com os meus músicos. Parecíamos uns miúdos. No espetáculo em Almeirim estava muito apreensivo no que iria acontecer e o que seria um espetáculo em cima do palco, tendo as pessoas metade da cara coberta. O que limita muito a postura das pessoas que estão a assistir, dado que não se podem exprimir, não se podem levantar. Já pensei nisso várias vezes, como vamos entrar para não magoar as pessoas e instalar as pessoas e dar uma sequência ao concerto agradável sabendo que não as vemos a rir nem a cantar.
Leia o artigo completo na edição impressa do jornal i. Agora também pode receber o jornal em casa ou subscrever a nossa assinatura digital.