por Joana Faustino
A polémica estalou em outubro de 2012 quando a Comissão de Informação do Congresso dos Estados Unidos lançou um relatório onde alertava que as tecnologias das chinesas Huawei e ZTE poderiam representar um perigo para a segurança do país. Mas nesse mesmo ano, o governo de Barack Obama serenou os ânimos. Em 2018, já com Donald Trump como Presidente dos Estados Unidos, o governo foi proibido de usar qualquer aparelho tecnológico da Huawei e da ZTE. Em maio do ano seguinte, Trump, aconselhou as organizações norte-americanas a não fazerem negócio com a gigante tecnológica. Entre essas organizações está a Google, detentora do sistema operativo Android. A transição já está em curso. Cerca de 30% dos telemóveis que a Huawei vendeu globalmente, desde o início do ano até agora, já não estão equipados com a Play Store, loja de aplicações da Google. Em vez disso, usam a sua própria loja de aplicações, a AppGallery, que já registou 184 mil milhões de downloads na Europa só no primeiro semestre deste ano. Uma vez que muitas das aplicações que usamos nos nossos smartphones só podem ser descarregadas através da App Store (da Apple) e da Play Store, a empresa chinesa está a tentar tornar a oferta da AppGallery o mais semelhante possível à da concorrência.
Perante as restrições que enfrenta face à Google e ao sistema operativo Android, a empresa chinesa vai lançar já no próximo ano o primeiro smartphone com um sistema operativo próprio desenvolvido pela Huawei, o HarmonyOS 2.0, que até agora só era utilizado em televisões. O CEO da tecnológica chinesa, Richard Yu, confirma que os telefones equipados com o Harmony OS 2.0 “já estão prontos há algum tempo, mas devido a um acordo com a Google, estão a aguardar” o momento oportuno para chegar ao mercado. O telemóvel Huawei Mate 40, com lançamento previsto para este mês, poderá ser o último da empresa a funcionar com sistema Android.
Quanto à nova versão do sistema operativo, vai ser lançada oficialmente esta semana, na conferência 2020 HDC Developers Conference, a 10 de setembro.
E quem já tinha um Huawei vai deixar de poder usar aplicações como o Youtube ou o Gmail? Ou de poder atualizar o telemóvel? A marca descansa os utilizadores: “A Huawei continuará a fornecer atualizações de sistema e patches de segurança. Todos os smartphones Huawei pré-instalados com o Google Play ainda podem usar a Play Store para descarregar e atualizar apps”. Ou seja, quem ainda tem esse serviço instalado no seu telemóvel continua a poder usá-lo, assim como às aplicações descarregadas. No caso dos aparelhos com o novo sistema operativo, mesmo sem os serviços da Google, o utilizador continua a ter a possibilidade de aceder ao motor de busca e aos respetivos sites (como Youtube, Gmail, etc.). O que deixa de ser possível é o download das aplicações, visto que a AppGallery não possuiu nenhuma aplicação que seja detida pela Google.
Expansão na Europa
Walter Ji, o presidente da Consumer Business Group da Huawei, anunciou no dia 3 de setembro a sua previsão de expansão na Europa, abrindo pelo menos mais oito lojas espalhadas por Espanha, França, Bélgica, Itália, Alemanha e Reino Unido. A empresa vai também começar a investir em opções mais sustentáveis a nível ambiental, reduzindo o plástico dos sesus produtos.
Entretanto, em Portugal, a Huawei anunciou uma parceria com a Porto Editora. Quem, até 30 de setembro, comprar um computador portátil ou tablet da marca vai ter direito a subscrever gratuitamente a Escola Virtual durante um ano letivo. Esta plataforma de e-learning disponibiliza materiais e conteúdos digitais para que os estudantes do 1º ao 12º ano possam estudar em casa.
Os EUA e as proibições
A Huawei não foi a única empresa chinesa e sofrer com as restrições impostas por Donald Trump, no âmbito da guerra comercial que opõe os EUA à China. Também a rede social TikTok está em vias de desaparecer dos Estados Unidos, a não ser que passe para mãos americanas. Donald Trump acusa a empresa detentora do TikTok, a ByteDance, de espionagem, dizendo que “captura grandes pedaços de informação sobre os seus utilizadores, ameaçando dar ao Partido Comunista Chinês acesso a informação pessoal sobre os norte-americanos”. A Microsoft está em negociações com a ByteDance e pretende garantir a compra da rede social TikTok, onde se partilham vídeos com menos de um minuto e uma das mais populares entre os jovens, até 15 de Setembro. Neste momento o TikTok está presente em 141 países já tendo sido descarregado aproximadamente 2 mil milhões de vezes em todo o mundo. Em Portugal são mais de 1,7 milhões os utilizadores. Nos Estados Unidos, esse número chega aos 100 milhões.
Outra das empresas atingidas pelas decisões de Donald Trump é a Tencent, detentora da plataforma WeChat. A 6 de agosto o Presidente norte-americano assinou um decreto lei que proíbe todas as transações entre o seu país e ambas as empresas.
A tensão comercial e política ente os Estados Unidos e a China está a escalar a um nível inigualável fazendo-se sentir também na Europa. Depois de a Grã-Bretanha ter banido a Huawei do 5G, em julho passado, os chineses ameaçam cortar os negócios com a empresa finlandesa Nokia e a sueca Ericson.
A Huawei está na “lista negra” de entidades com quem as empresas dos Estados Unidos não podem fazer negócio desde maio de 2019 e a TikTok para para lá caminha.
UE aconselha a limitar “fornecedores de alto risco” no 5G
Os Estados Unidos têm feito pressão sobre os seus aliados para que restrinjam as atividades da Huawei. Austrália, Nova Zelândia, Japão e Grã-Bretanha já anunciaram que não vão permitir que a empresa faça parte do desenvolvimento das redes 5G. A República Checa advertiu os seus cidadãos relativamente às empresas Huawei e ZTE, acusando-as de cooperar com os serviços de informação chineses.
A Comissão Europeia aconselhou os países da UE, em janeiro deste ano, a limitarem a participação dos “fornecedores de alto risco”, incluindo a Huawei, no desenvolvimento das redes 5G.
E em Portugal? O Governo português não baniu a empresa, mas as três grandes operadoras de telecomunicações portuguesas – NOS, Altice e Vodafone – também não deverão ter equipamento Huawei na sua rede de core 5G, que diz respeito aos servidores e mecanismos que encaminham o tráfego das antenas e tratam da conectividade à rede e da rapidez das operações. A esse propósito a NOS, por exemplo, fez saber que escolherá os “melhores parceiros” para cada uma das componentes da rede.
Atualmente, não há redes core 5G operacionais em Portugal (a primeira fase do 5G irá funcionar em redes core 4G).
Visto que não há provas de que a China, ou especificamente a Huawei, façam espionagem, este parece ser um golpe com fortes interesses políticos. Luís Correia, professor de telecomunicações no Instituto Superior Técnico, disse em entrevista à Rádio Renascença que, na guerra comercial entre os Estados Unidos e a China, “como em qualquer guerra, usam-se as armas que estão disponíveis e uma delas, neste momento, é a tecnologia das comunicações móveis, a quinta geração”.
*Editado por José Cabrita Saraiva