Charlie Hebdo. Alegados cúmplices do ataque no banco dos réus

Charlie Hebdo. Alegados cúmplices do ataque no banco dos réus


Três suspeitos serão julgados in absentia, após fugirem para o califado do Estado Islâmico. Reabriu a discussão sobre o direito à blasfémia.


Começou o julgamento de 14 suspeitos cúmplices dos massacres na redação do Charlie Hebdo e no supermercado judio Hyper Cacher, em 2015, que fizeram 17 mortos. Os ataques marcaram o início de uma série de atentados extremistas islâmicos por toda a Europa. Também geraram uma onda de solidariedade por todo o mundo, tornando o grito “Je suis Charlie” conhecido de todos e aquecendo o debate sobre o direito à blasfémia em França.

Durante os próximos dois meses, o tribunal escutará cerca de centenas de testemunhas e especialistas, com um interesse duplo: “aproximar-se da verdade” e dar às vítimas “um momento de expressão”, salientou o procurador antiterrorismo francês, Jean-François Ricard, citado pela France Press. Elas “poderão explicar, perguntar, tentar compreender. E isso é fundamental”, considerou.

Contudo, no banco dos réus há ausências de peso. Nomeadamente os responsáveis diretos do ataque ao Charlie Hebdou, os irmãos Chérif e Saïd Kouachi. Bem como Amédy Coulibaly, que se aproximou de Chérif quando estavam na prisão, matou uma polícia no dia seguinte ao atentado e barricou-se no Hyper Cacher. Eventualmente, os três jihadistas foram abatidos pela polícia francesa, num assalto quase simultâneo ao Hyper Cacher e a uma gráfica em Dammartin-en-Goële, onde se entrincheiraram os irmãos Kouachi. A ausência é uma “fonte de frustração”, admitiu Jean-François Ricard. Mas sobram os seus alegados cúmplices. 

 

Julgamento Entre as acusações enfrentadas pelos arguidos incluem-se crimes como cumplicidade com os ataques, financiar e participaram em redes terroristas. Contudo, apenas 11 dos acusados entraram na sala apinhada do tribunal, esta quarta-feira: os restantes três serão julgados in abstentia.

Pensa-se que escaparam para o autoproclamado califado do Estado Islâmico, na Síria e Iraque, dias antes dos atentados. Foi noticiado que dois dos alegados cúmplices dos atentados, os irmãos Belhoucine, acusados de abrir canais de comunicação com o Daesh, terão morrido na queda do califado. O paradeiro da outra fugitiva, Hayat Boumedienne, namorada de Coulibaly, continua em paradeiro desconhecido, suspeitando-se que ainda esteja escondida na Síria.

Entre os alegados cúmplices detidos, destaca-se Ali Riza Pola, de 35 anos. É suspeito do crime com maior gravidade, cumplicidade com um ato terrorista, que pode acarretar pena perpétua. Segundo a investigação, Pola esteve presente em cada passo do planeamento dos ataques, organizando linhas telefónicas seguras, comparando o preço de explosivos e munições e viajando com o seu bom amigo Coulibaly até à Bélgica. Os restantes suspeitos estão perante acusações de associação terrorista, que acarretam penas entre os dez e os vinte anos de prisão.

 

Blasfémia Na fundo do ódio dos irmãos Kouachi ao Charlie Hebdo estavam uma série de cartoon blasfemos sobre o profeta Maomé, publicados pela revista satírica: na véspera do julgamento, decidiram republicá-los. “O ódio que nos atingiu ainda está lá”, explicou o atual diretor da revista, Laurent “Riss” Sourisseau, que foi ferido no atentado. “Nunca desistiremos”.

“Somos um país onde a liberdade de blasfémia existe e queremos continuar a sê-lo”, concordou o Presidente Emmanuel Macron, numa conferência de imprensa no Líbano. “Nunca é o papel de um Presidente da República julgar a escolha editorial de uma redação, nunca”.