Pequenino, sonhou ser ator. Já graúdo, na Faculdade de Económicas e Financeiras, decidiu um dia romper com o suceder dos dias e faltou a uma aula, ficando à porta, a decidir o que fazer naquela hora. Mal sabia que a gazeta lhe mudaria o rumo: passou entretanto um colega que ia para a Emissora Nacional gravar um programa de teatro radiofónico, que o desafiou a acompanhá-lo. Ele assim fez e, logo nesse dia, substituiu um ator em falta. E foi desta forma que Luís Filipe Costa acabaria por, aos 19 anos, abraçar uma carreira no mundo da comunicação que se espraiaria em várias frentes e ficaria pautada por uma longa relação com a RTP. A história deste começo foi contada por Maria João Gama, logo no início de uma entrevista biográfica pontuada a imagens de arquivo com o jornalista, radialista, escritor e também realizador. Luís Filipe Costa morreu ontem, aos 84 anos, avançou a RTP3.
Nascido a 18 de março de 1936, em Lisboa, estudou na antiga escola comercial Veiga Beirão. Depois de virar na encruzilhada da rádio, revolucionou-a e foi um dos nomes, na década de 60, a contribuir para reforma do jornalismo radiofónico no país. O mérito foi reconhecido: venceu prémios da Casa de Imprensa para o melhor radialista (1966 e 1974) e o Prémio SER (Sociedade Espanhola de Radiodifusão) em 1968.
Dirigiu ainda o serviço de noticiários do Rádio Clube Português (RCP), e, a partir do estúdio, ficou indelevelmente ligado à história do país. Foi ele quem leu, em pleno 25 de Abril, os comunicados do Movimento das Forças Armadas. No dia seguinte à revolução continuava ao microfone, para um serviço noticioso histórico em que recapitulou os acontecimentos mais relevantes da Revolução – a emissão pode ser ouvida online nos arquivos da RTP.
Foi após o 25 de Abril, e já na RTP, que encetou a carreira como realizador. Um caminho que já tinha ensaiado na rádio com programas como Quem tem Medo de Brahms?, distinguido inclusivamente com o Prémio da Rádio Húngara. Na televisão viria a assinar mais de trinta telefilmes e séries documentais e de ficção, partilhando por vezes a cadeira de realizador com a de argumentista. Morte D´Homem, Arroz Doce, e Esquadra de Polícia são alguns exemplos. Morte D´Homem (1988) recebeu em 1988 o Grande Prémio do Festival de Cinema para Televisão de Chianchino (Itália) e o 2º Prémio do Festival Internacional de Cinema da Figueira da Foz. Visionário e atento ao curso dos tempos, é ainda da sua autoria série documental Há só uma Terra. O programa, estreado há trinta anos e apresentado pelo próprio, pôs pela primeira vez a ecologia na agenda e na programação da televisão em Portugal, tendo sido distinguido com Prémio da Crítica do Diário de Lisboa.
Entre outras distinções, recebeu ainda o Grau de Comendador da Ordem da Liberdade e o prémio de consagração de carreira da SPA, em 2011. E deixou ainda dois romances nos quais os esquissos cinematográficos que lhe comandavam o pulso são bem patentes: Agora e na Hora da sua Morte (Vega, 2008) e A Borboleta na Gaiola (Vega, 2009), um romance que também adaptou ao ecrã. Mas o projeto do cinema teve, porventura, a mais bonita consagração no seu legado familiar: Luís Filipe Costa era pai do cineasta Pedro Costa.