WalkeTalk. São Miguel não espera, está em toda a parte

WalkeTalk. São Miguel não espera, está em toda a parte


Até 19 de julho, decorre mais uma edição do Walk&Talk. Edição 9.5, chamaram-lhe num ano que, apesar da pandemia, para este festival de artes é de tudo menos um ano de espera.


“O que é afinal a internet, o que é afinal esta ideia de rede em que estamos hoje?” As respostas serão várias, necessariamente mais complexas do que parecem, e talvez seja exatamente este o tempo certo para nos aventurarmos em busca delas. Online versus onsite, a dicotomia que se impõe em tempos de pandemia é o lugar de que parte a edição do festival de artes Walk&Talk que decorre até 19 de julho não apenas na ilha de São Miguel, nos Açores, como vem sendo hábito, mas por toda a parte.

Foi também o lugar de que partiu a curadora Ana Cristina Cachola na conversa que inaugurou a série de dez podcasts que integram este ano a programação do festival para a qual convidou o sociólogo digital e artista Rodrigo Ribeiro Saturnino, que discorre sobre o contexto bélico em que ela surgiu, a internet, no tempo ainda em que Estados Unidos e a então União Soviética se batiam numa guerra invisível. E que há de nos falar também sobre as metáforas que nos vimos obrigados a criar para nos conseguirmos relacionar com ela – a internet. Afinal, a ideia de sítio, de lugar esteve sempre lá, desde o início. Como a de rede, essa rede que em tempos de pademia, com mais ou menos confinamento, continua a ser a que nos conecta.

Dos speakers de um computador, de um par de auriculares de um iPhone, de um ecrã, do dispositivo que for, é dessa  forma nos vêm chegando conversas como esta (a primeira da série de dez podcasts que integram a edição deste ano do Walk&Talk, dos quais cinco foram já transmitidos e podem ser reouvidos) por estes dias e atá ao próximo dia 19 de julho. É a edição de 2020 do festival de artes Walk&Talk, que continua a acontecer na ilha de São Miguel, nos Açores, sim, mas com um novo epicentro — online (a acompanhar em 9.5.walktalkazores.org). Walk, listen, watch and talk, na verdade (o último numa janela de chat em que é possível entrar através de um simples registo de nome de utilizador, como naqueles longínquos anos em que internet significava isso, um chat).

Na impossibilitado de existir nos moldes regulares no ano daquela que seria a sua 10.ª edição, o Walk&Talk, festival de artes que vem desempenhando um papel central no redesenhar da paisagem artística da ilha de São Miguel (e da Terceira, à qual se foi também estendendo), nos Açores, o festival reinventou-se, resenhou-se, deslocou-se para um lugar em que o epicentro deixa de ser uma ilha e passa a ser a rede que a conecta ao mundo.

Descreve este exercício Sofia Carolina Botelho, codiretora artística do festival ao lado do cofundador Jesse James, como “um teste à forma como continuamos a mover ideias entre lugares e públicos, e o primeiro momento de uma conversa sobre comunalidade que vamos desenvolver até à 10.ª edição do festival, no nosso programa de residências e em atividades do Circuito de Conhecimento”.

Mas um festival como este não poderia, pelas características com que nasceu, na que sempre o caracterizou, deixar de existir “onsite”. É aí que surge um outro lado da programação deste Walk&Talk:_aquele do qual será ainda assim possível fazer parte no lugar – o lugar físico em que a equipa do festival constrói as obras pensadas pelo conjunto de artistas convidados para esta edição. Num gesto provocatório, João Pedro Vale e Nuno Alexandre Ferreira inauguraram a programação com… um perfume. Chamaram-lhe “Ó subalimentados do sonho! A poesia é para comer. (Aroma a fim de festa espalhado por uma rua de Ponta Delgada)”.

A esta juntam-se as obras e intervenções de Brum Atelier e Atelier Caldeiras, Tropa Macaca, COBRA’CORAL, Luísa Salvador, Nadia Belerique, Gustavo Ciríaco, Sofia Caetano, Ponto Atelier, Mané-Pacheco, Ilhas, Flávio Rodrigues, Alice dos Reis, Pedro Maia, Diogo Lima, Danny Bracken, Elliot Sheedy, entre outros. Em São Miguel ou em live streaming (e veremos de que forma nos chega uma obra em forma de perfume) ou numa série de podcasts a pensar este novo tempo que vivemos.

Para 2021 ficaram adiadas as apresentações dos projetos resultantes das residências artísticas da edição do verão do ano passado. Como se nada se perdesse, apenas se transformasse nesta edição de Walk&Talk que, na reflexão a que é sempre propícia a espera, veio afinal provar que as circunstâncias não são uma fatalidade, ou não necessariamente, que podem sempre ser aquilo que se quiser fazer delas.