Mais de duas semanas depois da reabertura de restaurantes, já é possível fazer algum balanço?
O balanço não é muito positivo. Foi uma reabertura tímida, os estabelecimentos têm tido pouca frequência por parte dos clientes. Mas obviamente que isso varia de tipologia de estabelecimento para estabelecimento. Aqueles que dependem muito do turismo internacional estão com sérias dificuldades, mas também os outros que vivem à conta da afluência das pessoas que vêm trabalhar todos os dias para a cidade não estão bem. Temos ainda muita gente em teletrabalho, muitos em layoff, outros com os seus rendimentos diminuídos e que mudaram os seus hábitos, além do receio, que ainda é natural, que as pessoas têm de ir ao restaurante. Está a ser muito difícil. Recebemos todos os dias informações, emails, telefonemas de empresários que estão muito aflitos porque fazem um, dois almoços por dia, tornando a situação muito difícil, quando os custos estão a 100%. Entretanto houve moratórias e fracionamentos de pagamentos ao Estado que, depois do estado de emergência, acabaram por cair. O layoff é só até ao final do mês de junho. Vamos ver se é possível manter o layoff ou outra modalidade similar, mas tudo isso são encargos pesados para quem tem uma receita diminuída e custos acrescidos com a compra de equipamento de proteção individual. O Governo ouviu um dos pedidos da Ahresp no sentido de ajudar essas empresas a comprarem estes equipamentos, mas essa linha já fechou. Para as microempresas, já fechou em todo o território nacional – esteve aberta dez dias – e em relação às PME fechou para as regiões de Lisboa e do Porto. Ainda existe disponibilidade de acesso a estas linhas no Algarve, no Alentejo e no Centro. Não está fácil.
Mas ainda não abriram todos os estabelecimentos…
Ainda temos os bares encerrados e as discotecas também, sem perspetiva de poderem abrir, com sérias dificuldades económicas e sem sequer terem um horizonte temporal que diga “daqui a um mês”, “daqui a 15 dias”. E com estes encerramentos vai-se fomentando aquilo que não se deseja, que são as festas ilegais, concentrações de grandes grupos em zonas sem qualquer tipo de controlo nem de regras sanitárias, o que é lamentável. Temos estado em diálogo com o Governo no sentido de encontrar soluções. Já foram propostas medidas de autorregulação para este setor também poder abrir. O caso das quintas e dos eventos, que também era um subsetor que ainda estava por abrir, foi agora possível, com esta decisão do Conselho de Ministros, encontrar uma possibilidade de irmos gradualmente abrindo, com algumas regras, mas já vai permitir fazer celebrações de casamentos, de batizados, festas familiares, assim como festas corporativas, o que também era vital porque estas empresas também estavam, de facto, em situações muito complicadas. Aguardamos agora as orientações da DGS para saber como podem funcionar mas, pelo menos, já se sabe que poderão começar a iniciar a sua atividade.
A Ahresp entregou um documento ao Governo com algumas medidas para que os bares e discotecas possam abrir. Uma delas sugeria a interdição de entrada de pessoas com mais de 60 anos. Já teve algum feedback por parte do Governo?
Não. Numa das primeiras conversas que tivemos com o primeiro-ministro a propósito das reaberturas já tínhamos salientado que era importante abrir porque as empresas precisavam de voltar à economia, mas que tínhamos de salvaguardar duas grandes questões. Uma delas estava relacionada com a definição de regras sanitárias concretas – preparámos um guia de boas práticas para que fosse validado pela DGS e aprovado pelo Governo, e foi assim que aconteceu para o setor da restauração e bebidas. A segunda condição tinha a ver com os apoios económicos, porque estamos numa situação muito complicada: tivemos dois meses de faturação zero e agora, nesta reabertura, deparamo-nos com encargos avultados e receitas diminuídas. Este guia aplica-se transversalmente a todas as atividades da restauração, e as discotecas são espaços de restauração com espaços destinados a dança, o que significa que grande parte dessas orientações têm de ser cumpridas, mas depois criámos um conjunto de regras adicionais para as particularidades de uma discoteca, porque tem características diferentes. Foram entregues ao Governo, mas ainda não tivemos nenhuma resposta e temos tentado quase diariamente estabelecer a aprovação dessas regras para que essas atividades possam abrir com controlo, à semelhança do que aconteceu com a restauração, hotelaria, parques de campismo.
António Costa já admitiu que se for necessário podemos passar um verão sem discotecas e bares. Como vê essas declarações?
O grande problema é que, por um lado, temos a atividade económica destas empresas, que é significativa, que dá emprego a muitos trabalhadores e a muitas famílias que dependem do setor, e este setor tem um contributo muito importante para a nossa economia. Se não abrirem, esses espaços vão ter de ser apoiados e ajudados com medidas relevantes, para que essa gente toda não vá cair nos subsídios de desemprego. Por outro lado, o facto de este subsetor não abrir e de não ter sequer uma data prevista para reabrir não faz com que especialmente os jovens, numa altura em que já estamos com temperaturas muito amenas, com o verão quase a chegar e as festas a serem desejadas, não as façam. E fazem-nas em qualquer sítio, sem regras, sem controlo e de uma forma em que estamos, obviamente, a potenciar o risco ao máximo. É preferível que estas empresas possam funcionar porque, ao abrirem, vão funcionar com regras de controlo muito apertadas. E é isso que se pretende, para evitar que aconteça o que tem acontecido. Tenho recebido fotografias das coisas mais inusitadas que pode imaginar: concentrações de pessoas à porta das gasolineiras, a comprarem bebidas alcoólicas, a juntarem-se e a fazerem festas aí. Desde festas que são convocadas não sabemos por quem com dias ainda por desvendar, estilo festas-segredo, temos de tudo, e é isso que temos de evitar, não só para manter estes postos de trabalho e essas empresas que muito contribuem para a nossa economia, mas também para não potenciarmos o risco, porque a não abertura destes espaços vai potenciar este tipo de festas e concentrações de forma descontrolada. E há movimentos organizados que organizam este tipo de festas. Ainda hoje recebi uma mensagem a dizer que estavam a publicitar uma festa para jovens, que ainda não sabem o local mas que ocorrerá no dia x e y, e a pedirem para estarem atentos porque na véspera irão divulgar onde a festa vai realizar-se. Então, se isto acontece, porque é que temos estas atividades encerradas?
Já sensibilizou o Governo para este problema dos ajuntamentos?
Havia duas urgências: uma delas ficou resolvida, que tem a ver com as quintas, os casamentos e os batizados, que estavam também numa situação muito delicada. A segunda são os bares, as discotecas e todos estes estabelecimentos de diversão noturna, que ainda se encontram encerrados. Já sinalizámos isso junto do Governo e enviámos um conjunto de normas de autorregulação que foram trabalhadas com o setor. E o setor está disponível para seguir à risca. Não é abrir por abrir, é abrir com regras apertadas. E vamos continuar a falar com o Governo no sentido de explicar que temos conhecimento de várias festas ilegais, várias concentrações de jovens, em particular durante o fim de semana, que estão sem controlo e que, obviamente, serão um foco de potenciação do risco – algo que não é desejável para ninguém. O que queremos é que olhem para as regras que propusemos, proponham outras, caso sintam necessidade, mas é preciso defini-las para que, de facto, estas empresas possam abrir portas.
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