TAP – Transporte Apenas Pr´alguns


A partir de certa altura, a TAP apenas sobreviveu pela benevolência e, na maior parte das vezes, também inconsciência da real noção que os portugueses tinham do que a mesma representava. 


“Esqueça tudo o que sabe sobre empuxo e arrasto, sustentação e gravidade; o que faz um avião voar é o dinheiro”. Esta é talvez uma das frases mais conhecidas e conotadas com o setor de atividade sobre o qual hoje verso, dada a nova problemática em que a TAP se vê outra vez envolvida. E confesso-vos que começo a ficar um pouco enjoado das sucessivas polémicas em que a empresa constantemente vive – umas vezes por culpa alheia, outras por culpa própria.

No entanto, para que não haja aqui quaisquer más ou enviesadas interpretações, quero deixar claro, e repito, bem claro, que estas minhas palavras não se dirigem aos milhares de trabalhadores da companhia, trabalhadores esses a quem todos nós e a própria muito devemos e que vivem, muitíssimos deles, agora, graves e reais dificuldades pelo contexto em que nos encontramos.

Aquilo que começa a enjoar-me, e confesso que não teria a mínima complacência caso fosse governante ou tivesse qualquer influência no setor, é esta alegada pretensão da companhia de reduzir as linhas aéreas que até então operava para o norte do país, passando a existir 71 rotas a partir do Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa, e apenas três com partida do Aeroporto Francisco Sá Carneiro, na Maia, distrito do Porto.

Vamos por partes para ver se me faço compreender, ainda que anteveja já que os carneiros do costume vão nas caixas de comentários começar a destilar veneno e burrice em dimensão e profundidade opostas, para maior, face à sua real inteligência.

A TAP foi durante décadas uma das poucas joias da coroa nacional. Tinha qualidade e até aquele glamour e romantismo tão próprio da nossa grandiosa história nacional. No entanto, como aconteceu em tantas companhias aéreas estatais europeias, os problemas começaram a surgir e a avolumar-se e, para os resolver, houve sempre uma solução apenas: a injeção de capitais públicos na empresa, que é como quem diz milhões e milhões de euros dos bolsos dos portugueses – incluindo-se nesses portugueses tanto os que pudessem voar todos os dias na companhia como aqueles que nela nunca tivessem voado, mais os que pudessem inclusivamente nunca ter voado para lado nenhum e com ninguém uma só vez na vida. Portanto, a partir de certa altura, a TAP apenas sobreviveu pela benevolência e, na maior parte das vezes, também inconsciência da real noção que os portugueses tinham do que a mesma representava.

Tudo isto aliado a opções gestoras, na minha opinião, muitas vezes questionáveis, interesses igualmente estranhos e Governos vários, uns que pareciam querer abandonar a empresa ao deus-dará e outros que pretendiam sempre vendê-la ao diabo. Chegados aqui, o desnorte tornou-se e mantém-se completo. Mas, como sempre, podem todos ter falhado à TAP. Todos menos os portugueses! Esses nunca falharam, quer quando lá punham dinheiro quer quando deixaram de pôr, mas também nunca mais o recuperaram. Nem o dinheiro nem uma empresa que também era sua.

Pois agora vem alegadamente a TAP anunciar uma hipotética reativação da operação da TAP com apenas três destinos a partir do Norte, circunstância que só pode ser entendida como incompetência pura. Ninguém escamoteia o que a covid-19 representa para o setor – também eu estou de acordo que a operação da empresa terá certamente de ser redesenhada –, mas convenhamos que tal não pode passar pela redução de ligações internas.

Se a TAP é e quer continuar a ser uma empresa de interesse público e nacional, então tem de prestar serviços a todo o território por igual. Se este cenário se confirmar, e por isso digo que começo a ficar enjoado com esta palhaçada, a TAP não tem legitimidade para recorrer a quaisquer apoios de natureza pública que visem assegurar a sua operatividade. Muito menos solicitar ao acionista Estado que para lá volte a enviar milhões e milhões de euros, como já se fala novamente.

Tenham vergonha, sejam responsáveis, sejam competentes. Se não forem, ponham-se a milhas da empresa; se não se puserem pelo próprio pé, haja quem os ponha. E que todos respeitem Portugal e os portugueses. Todos eles! De onde quer que sejam!