Já diz o sábio povo e bem que entre duas pessoas, quando uma delas é a última a saber de certas coisas, algo vai mal na relação. Portanto, confrangedor. É este o adjetivo que melhor caracteriza o patético episódio interpretado por António Costa quando, há poucos dias, veio dizer que desconhecia que tinham sido pagos 850 milhões de euros ao Novo Banco.
Mas quando digo confrangedor digo-o em vários domínios: pessoal, político e governativo. No campo pessoal, é burlesca a facilidade com que o primeiro-ministro anda literalmente a gozar com o país. Sobretudo porque, obviamente, eu, pessoalmente, não acredito que António Costa desconhecesse que tal verba havia sido generosamente enviada para um banco, em particular num cenário de crise novamente instalada, agora por efeitos da covid-19, em que voltamos a não ter dinheiro para coisa alguma. Mas, admitindo que realmente desconhecia, tal circunstância consubstanciaria uma verdadeira incompetência. Ora, quando se é governante, tenho para mim que a incompetência é a linha-limite para que quem quer que seja se mantenha no cargo que ocupa.
Num país normal, perante este episódio, só haveria uma de duas opções: ou o primeiro-ministro, se realmente não soubesse, ou soubesse e estivesse a fazer-se passar por parvo, bem como a fazer de parvos todos os portugueses, se demitia, ou então, se não se demitisse, teria de demitir o ministro das Finanças por ter tomado uma decisão sem que previamente tivesse informado o primeiro-ministro. E vamos deixar-nos todos de patacoadas e de cegueira puramente partidária porque, repito, num país normal, só um destes cenários seria admissível para resolver o assunto. Aqui chegados, entramos no domínio político, e convenhamos que nele foi quase vexatória a forma como António Costa se rebaixou ao Bloco de Esquerda, pedindo desculpa pela informação errada que deu por um suposto desconhecimento pontual.
É tudo tão surreal que uma pessoa, por vezes, já não sabe se ria ou se chore. Palavra de honra que me imaginei na posição de Costa e, se fosse primeiro-ministro, além de tentar ser bem mais competente do que ele, certamente preferiria demitir-me a ter de pedir desculpas públicas a qualquer partido. E não é por incapacidade de pedir desculpas. É porque um primeiro-ministro que pede desculpas a outro partido político assina, nesse momento, um atestado de estupidez a si próprio. Não há mais caminho daí para a frente. Mas, uma vez mais, é Portugal! Por último, chegamos ao domínio governativo, e este acaba por ser, no fundo, uma conjugação dos dois domínios anteriores. Se este suposto desconhecimento do primeiro-ministro for real, espelha uma total descoordenação dentro do Executivo, descoordenação essa indigna de quem governa e de quem é governado. Se o primeiro-ministro não estiver a falar verdade – o que, repito, e desculpem, é a minha opinião –, não está a falar verdade ao país, e disso está já o povo farto.