Condecorar ou não Arménio Carlos pelos dois mandatos em que esteve à frente da CGTP? O tiro de partida foi dado por António Costa ao sugerir ao Presidente da República que condecorasse o secretário-geral cessante da CGTP-IN, que abandonou funções este sábado, dando lugar à nova líder da central sindical, Isabel Camarinha.
“No dia em que cessa funções como secretário-geral da Intersindical, quero agradecer o contributo de Arménio Carlos para a consolidação do diálogo tripartido em Portugal e por todo o trabalho desenvolvido em prol de um país mais justo”, escreveu o primeiro-ministro na sua conta pessoal no Twitter, acrescentando que “como reconhecimento público da sua dedicação em defesa dos direitos do trabalho e dos trabalhadores, irei sugerir ao senhor Presidente da República que promova a condecoração de Arménio Carlos, pelos serviços meritórios praticados nestas funções”, justificou.
Contactado pelo i, Arménio Carlos admitiu ter ficado surpreendido com a sugestão de António Costa e prometeu reagir no momento em que isso for anunciado. “Não recebi nenhuma proposta. Não comento propostas que não recebi. Creio que quem terá de apresentar uma proposta é o senhor Presidente da República e só me pronunciarei quando isso acontecer e, se isso acontecer, lá estarei no momento certo”, afirmou.
O até aqui secretário-geral da Intersindical disse, no entanto, que “neste momento, quem deve ser condecorado é a CGTP pelos seus 50 anos e pelo contributo que deu para a valorização do trabalho e dos trabalhadores” – uma situação que, no seu entender, não seria inédita, já que a central sindical foi condecorada quando fez 25 anos, altura em que Mário Soares era Presidente da República. “É comum serem condecoradas várias organizações pelo trabalho que desempenham. Fazer isso com a CGTP não seria inédito”, diz ao i.
Para já, Marcelo Rebelo de Sousa manifestou-se disponível para condecorar o ex-secretário-geral da CGTP-IN como propõe o primeiro-ministro, se Arménio Carlos aceitar, ou a confederação sindical. “Como é natural, sabia da proposta. Não ia saber pela comunicação social. Pareceu-me compreender que o condecorado ou eventual condecorado preferia uma homenagem coletiva. Tenho de apurar isso, só é possível apurar falando com ele em Portugal”, afirmou o Presidente da República, à margem de uma visita de Estado à Índia.
De acordo com Marcelo, há duas soluções possíveis: “Um caminho é, de facto, aceitar a condecoração, e aí eu condecorarei, como condecorei antigos líderes de confederações, por exemplo, patronais – o antigo líder da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP)”. Mas deixou a ressalva, “se se tratar de uma condecoração coletiva, também não há problema, porque ou já estavam condecoradas ou eu condecorei praticamente todas as confederações patronais e a outra confederação sindical. Falta a CGTP. É sempre possível condecorar a CGTP, e não o antigo líder”.
Anterior líder Carvalho da Silva, outro líder histórico da CGTP, que veio a ser substituído por Arménio Carlos, recusou ser condecorado pelo ex-Presidente da República Jorge Sampaio. Esta recusa foi revelada pelo próprio numa entrevista à rádio Antena 1, antes de deixar o cargo.
Aliás, esta passagem de testemunho ficou longe de ser pacífica. Na entrevista dada ao i, Arménio Carlos promete “ajudar a camarada a assumir rapidamente a coordenação da central”, afastando o cenário do que lhe aconteceu quando assumiu a liderança, em 2012. “Como era comunista, fui imediatamente associado à linha mais ortodoxa dos comunistas. O que quer que faça? Ainda nem sequer tinha ido ao alfaiate e já me tinham feito um fato à medida, e entrei como ortodoxo. Sabe o que me dá prazer? É sair e camaradas meus de outras sensibilidades que aqui estão representados terem reconhecido o meu trabalho de rigor, seriedade, abertura”, referiu.
Rival comenta O secretário-geral da UGT, Carlos Silva, diz “não ter nada a obstar” relativamente a qualquer condecoração que venha a ser atribuída ao último líder da CGTP, mas garante que não quer que lhe façam o mesmo. “Espero que quando eu me for embora, o primeiro-ministro não se lembre duma coisa destas em relação a mim”, disse ao Expresso.
Ainda assim, critica a ideia de António Costa. “O primeiro-ministro entendeu encontrar um argumento para justificar a sua iniciativa, dizendo que a CGTP muito contribuiu para o diálogo tripartido. Mas eu gostaria de lembrar que, até hoje, se não fosse a UGT, não havia acordos assinados na concertação social”, acrescentando que “cada um tirará as suas ilações”.
O líder da UGT lembrou, no entanto, que o seu antecessor, João Proença, foi condecorado duas vezes, pelo ex-Presidente Cavaco Silva e pelo atual Governo.
Recorde-se que Carlos Silva anunciou recentemente que não iria avançar para um novo mandato da central sindical. “O desgaste tem sido tremendo. Sinto que hoje, mesmo ao nível do PS, não tenho o necessário apoio nem a necessária compreensão para me poder recandidatar. Não vale a pena continuar a chover no molhado”, afirmou, para sublinhar que sente que é visto como “uma força de bloqueio”, pelo que não pretende continuar.
Já o eurodeputado Nuno Melo criticou a sugestão de António Costa. No seu entendimento, condecorar Arménio Carlos – “um braço político do PCP e da esquerda, depois da repetida violência contra quem só se esforçou para pagar as dívidas de mais uma bancarrota legada pelo PS” – teria um significado político que “ninguém de centro-direita neste país deveria esquecer”.
Em relação a estas críticas, Arménio Carlos preferiu não comentar, dizendo apenas “que vai acompanhado as reações”.