O poder local está em profunda transformação. Como por diversas vezes tenho referido neste espaço, se o séc. xx foi o tempo do Estado-nação, o séc. xxi é certamente o tempo da cidade como unidade política mais decisiva na vida social.
As cidades não são apenas os principais motores da economia global; são também os grandes faróis de conhecimento, de criação cultural e de investigação científica; são mosaicos de tolerância, de integração e de diversidade. São os espaços privilegiados de realização do potencial humano e da busca da felicidade.
Este movimento metropolocêntrico reforçou o estatuto das cidades. Mas, por outro lado, criou novas exigências ao poder local. As câmaras nunca mais podem ser geridas de acordo com o velho paradigma de que as questões são para resolver se forem da responsabilidade do poder local – e, se não forem, sacode-se a água do capote se a resposta estiver nas mãos do poder central. Longe vai o tempo em que o problema de um concelho terminava na fronteira com a autarquia vizinha. Vivemos num tempo sobretudo de ligações, de partilha, de conexões. O desafio de um é frequentemente o desafio de muitos.
As cidades têm de gerir pessoas e os problemas das pessoas. E as pessoas exigem respostas. Isso implica que as autarquias entrem em áreas tradicionais do Estado central, como a educação, a saúde, o emprego ou a mobilidade. Estamos a assistir a uma transição de modelo de governação em que as câmaras desta terceira década do século têm, à escala, a exigência de resposta de um Estado social e os presidentes de câmara não são PM (primeiros-ministros), mas são MP (ministros de proximidade).
Em Cascais temos vindo a preparar-nos para estes novos tempos. Não ficamos de braços cruzados à espera que resolvam os assuntos por nós. Arregaçamos as mangas e deitamos mãos à obra. Estamos a construir um verdadeiro Estado social local.
Gostaria de, neste texto, sublinhar o nosso empenho na construção de um Serviço Nacional de Saúde de qualidade, verdadeiramente democrático porque acessível a todos e a cada um dos meus concidadãos. Um SNS que é forte no tratamento e eficaz na prevenção. Um SNS que é personalista e humanista, porque cuida de cada pessoa na sua singularidade.
Para reforçar a capacidade de resposta de saúde municipal estamos a trabalhar em diversos planos.
Temos 15 milhões de euros dedicados à construção de dois novos centros de saúde – Carcavelos e Cascais – e à recuperação e ampliação de um terceiro, São Domingos de Rana. Objetivo: que cada cascalense tenha médico de família.
Trabalhamos as políticas públicas para prevenção e tratamento das doenças mais comuns do séc. xxi.
Com a Associação Protetora dos Diabéticos de Portugal e os centros de saúde do concelho, estabelecemos uma parceria que pretende combater a diabetes e dar qualidade de vida aos doentes. Chama-se “Cascais sem Diabetes” e é um programa que contempla um rastreio concelhio da diabetes tipo 2, a identificação das pessoas que desenvolveram a doença ou estão em pré-diabetes e, feita a análise da população, a implementação de programas de literacia, de apoio de proximidade aos diabéticos e de cuidadores formais e informais.
Com a SER +, a Associação Nacional de Farmácias, ARS LVT, estabelecimentos prisionais e Hospital de Cascais, estamos a trabalhar numa via rápida contra o VIH/sida e as hepatites virais. Queremos quebrar a cadeia de transmissão do VIH/sida até 2020 e das hepatites virais até 2030, cumprindo o triplo objetivo: 90% dos casos diagnosticados, 90% em tratamento, 90% da carga viral suprimida.
Com a Cruz Vermelha Portuguesa e a Fundação Portuguesa de Cardiologia, estamos a criar a Rede Concelhia de Desfibrilhação Automática Externa (DAE). Isto significa o quê? Que muito em breve estarão instalados no concelho 150 desfibrilhadores: em escolas, farmácias, juntas de freguesia, espaços de atendimento municipal, esquadras da PSP e GNR, espaços desportivos e concessionários de praia. A rede inclui ainda formação especializada para que Cascais seja um concelho com uma cidadania pronta e preparada para salvar vidas.
Com a Associação de Médicos Dentistas Mundo a Sorrir, e porque a resposta de saúde oral no SNS é muito débil, vamos abrir durante o ano de 2020 duas clínicas dentárias, em Alcabideche e São Domingos de Rana, que tratarão gratuitamente todos os munícipes que estejam em processos de inclusão social e se enquadrem até ao terceiro escalão de IRS. Ao mesmo tempo potenciaremos o cheque-dentista do Governo, utilizado apenas por 60% da população.
A saúde – pública, tendencialmente gratuita e de qualidade – é um pilar do Estado social. É uma conquista da democracia.
Cascais orgulha-se de não negar responsabilidades e de estar na primeira linha de defesa dos seus cidadãos – sobretudo os grupos de risco ou mais desfavorecidos.
Porque na política não se está para disputar responsabilidades ou jogar ao passa-culpas. Está-se para ir ao encontro dos anseios da população e dar a todos a possibilidade de uma vida digna e feliz.
O SNS é de todos. Dos portugueses, do Estado central e do Estado local. Podemos fingir que não é nada connosco. Ou podemos, sem dogmas nem quintas, dar o nosso melhor para o salvar da morte lenta.
Presidente da Câmara Municipal de Cascais
Escreve à quarta-feira