O esquema que esteve na origem dos vistos ilegais dados a iranianos

O esquema que esteve na origem dos vistos ilegais dados a iranianos


No verão foi noticiada a suspensão de vistos para cidadãos iranianos mas, na altura, o ministro dos Negócios Estrangeiros recusou dizer por que motivos, invocando apenas a segurança. O i revelou à data que se tratava de um esquema de entradas ilegais no espaço Schengen.


O Departamento de Investigação e Ação Penal de Lisboa, coadjuvado pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, desmantelou uma rede de auxílio à imigração ilegal que era encabeçada por um funcionário da secção consular da embaixada de Portugal em Bissau. O suspeito foi detido ontem em território nacional.

Segundo o SEF, esta investigação começou quando as autoridades alemãs detetaram sete cidadãos iranianos no aeroporto de Frankfurt “titulares de vistos portugueses apostos nos passaportes e relativamente aos quais existiam suspeitas de terem sido obtidos fraudulentamente”.

Recorde-se que no verão foi tornado público que Portugal não estava a emitir vistos aos cidadãos iranianos que queriam entrar em território nacional. Na altura, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, disse no Parlamento que a decisão se prendia com questões de segurança nacional.

“Sim, suspendemos por razões de segurança”, explicou em julho Augusto Santos Silva, quando questionado pelo deputado do CDS/PP Gonçalves Pereira durante uma comissão regimental dos Negócios Estrangeiros da Assembleia da República. “Darei explicações mas não em público, por questões de segurança”, reforçou Santos Silva, adiantando que as autoridades “não brincam com as entradas em território nacional”.

O i revelou à data que em causa estariam movimentações suspeitas de cidadãos iranianos que teriam lançado um alerta junto dos serviços, numa altura em que as autoridades europeias estavam já de sobreaviso. Mas a informação nunca foi confirmada oficialmente, tendo jornais como o Público avançado que a suspensão dos vistos poderia ter sido justificada com o facto de um funcionário da embaixada ter sido alvejado a tiro.

SEF confirma as entradas suspeitas de iranianos na UE

Agora, meses depois de o assunto ter sido tornado público, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras explica que, no âmbito da investigação, foi possível pôr fim a uma rede montada por um funcionário consular de Bissau que terá sido responsável pela emissão dos vistos falsos detetados na Alemanha. Esta investigação, refere ainda, foi levada a cabo em estreita colaboração com o Ministério dos Negócios Estrangeiros.

“O suspeito, agora detido em território nacional, arrogou a sua qualidade de funcionário consular para apoderar-se de vinhetas de visto em branco que vendia a outros indivíduos que pretendiam entrar em Espaço Schengen. Os vistos, genuínos, depois de comercializados foram ilegalmente preenchidos e permitiram a entrada de indivíduos de nacionalidade iraniana na Alemanha”.

Este órgão de polícia criminal esclarece também que “foi ainda possível identificar 209 vinhetas de visto processadas pelo suspeito desde 2012, que desapareceram, e sobre as quais subsistem fortes indícios de que também possam ter sido vendidas”.

Suspeito simulava informaticamente a emissão de vistos

Segundo revelou ontem o SEF, o “detido montou um esquema no qual simulava informaticamente a emissão de vinhetas referentes a pedidos de vistos de cidadãos guineenses, anulando-as logo de seguida, ainda em branco”.

Depois disso, emitia “vinhetas a favor dos requerentes locais e apoderava-se das vinhetas anuladas, ainda por preencher, que depois comercializava a troco de avultadas quantias monetárias”. Este funcionário da embaixada de Portugal em Bissau é, por isso, suspeito da “prática de múltiplos crimes de auxílio à imigração ilegal, falsificação de documentos, corrupção passiva, tráfico de seres humanos e outros”. Será presente nas próximas horas ao Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa para ficar a conhecer as medidas de coação.

operação Visa Branco em Portugal e na Guiné Esta operação foi desencadeada ontem, com diligências simultâneas em Portugal e na Guiné-Bissau. Segundo as autoridades, “envolveu a participação de 20 inspetores do SEF e de uma equipa multidisciplinar especializada – SOS tráfico –, culminando com a realização de buscas à secção consular da embaixada de Portugal na Guiné-Bissau e à residência do suspeito em território nacional”.

No decurso das diligências, os investigadores terão conseguido apreender “abundante prova dos crimes identificados”. Foi ainda possível “resgatar uma mulher de nacionalidade guineense como possível vítima de tráfico de seres humanos, que se encontrava em casa do suspeito”.