Mundial de clubes. Jesus sabe bem que os ingleses não são nada católicos

Mundial de clubes. Jesus sabe bem que os ingleses não são nada católicos


O Flamengo-Liverpool de amanhã (17h30) não será, como o de 1981, um jogo do talento contra a energia. Até porque há na equipa inglesa uma dose industrial de talento. Cabe a Jesus tirar ao adversário o espaço de que ele tanto gosta e abusa.


Praticamente inevitável. A final de amanhã entre Flamengo e Liverpool, quero dizer. Aliás, o Mundial de clubes, como é pomposamente chamado, foi fabricado para ter na final o campeão sul-americano e o campeão europeu, e seria uma desfeita para quase toda a gente que tal não viesse a suceder. Já bastou o atrevimento do Al Ain, na última edição, tirando o River Plate do jogo decisivo frente ao Real Madrid.

Com algumas dificuldades pelo meio, as equipas de Jorge Jesus e de Jürgen Klopp deixaram pelo caminho o Al-Hilal, da Arábia Saudita, e o Monterrey, do México. Mais complicado o apuramento dos ingleses, que necessitaram da entrada de Firmino no final do encontro da meia-final para apontar um golo para lá dos descontos. Mas tudo está bem quando acaba bem, já dizia o grande William Shakespeare de Stratford-upon–Avon, e o embate desejado por todos está agendado para amanhã, 17h30 de Portugal continental, no Estádio Internacional Khalifa, em Doha, capital do Catar, o impante organizador do próximo Campeonato do Mundo de Futebol.

Não há como não antever favoritismo ao Liverpool num embate que irá pôr um ponto final na ditadura espanhola na prova: Real Madrid (2014), Barcelona (2015), Real Madrid (2016), Real Madrid (2017) e Real Madrid (2018). Facto indesmentível é que o futebol europeu parece estar, neste momento, muito mais avançado em termos físicos, conjunturais e estratégicos do que o futebol que se pratica nas várias Américas. Mas a forma como os mexicanos do Monterrey conseguiram enfiar grãos de areia – um dos quais com o golo de Funes Mori, antigo benfiquista – na engrenagem dos moços de Merseyside serve certamente para que Jorge Jesus, devolvido ao seu aparato de “rei da tática”, vá preparando um camião dela para aplicar nas rodas dentadas da máquina de Klopp.

Duas conceções de jogo irão estar frente a frente e talvez seja esse o maior aliciante do confronto de amanhã. Tal como sucedeu em 1981, em Tóquio, quando o Flamengo de Zico limpou sem apelo nem agravo o Liverpool de Kenny Dalglish por uns bem redondinhos três a zero.

Más memórias Jesus tem más memórias do Liverpool e bem pode queixar-se de si próprio por elas quando teve a ideia peregrina de ir a Anfield com a invenção de David Luiz a defesa esquerdo e saiu de lá goleado por 4-1, tal como, com a mesmo opção, saiu espezinhado das Antas perante Villas-Boas (5-0).

Espera-se do treinador português que invente mais uma vez, de forma a contrariar o futebol largueirão dos ingleses, cheio de cavalgadas assustadoras, sobretudo aquelas que são protagonizadas por Mané e Salah. Convenhamos: são moços com habilidade e pezinhos de brasileiro e não ficarão a perder, nesse capítulo, perante Gabigol ou Bruno Henrique.

O tempo da força bruta dos britânicos já lá vai. E, mesmo que se olhe para uma e outra equipa e se reconheça maior envergadura do lado europeu, não será por aí que, como gosta de dizer o povo do Mamodeiro a Vilar de Perdizes, o gato irá às filhoses, logo agora que é tempo delas. Mas, não sendo católicos, também não perdoam…

Na forma como o Flamengo for capaz de suster a voracidade de espaços que abunda no Liverpool estará, na minha opinião, o segredo do equilíbrio. E desse equilíbrio poderá partir, depois, para a fase seguinte: a do desequilíbrio. Não é um frente-a-frente entre energia e talento puro e duro. De forma alguma. Basta pensar no talento que reveste os campeões da Europa e a forma como dele tiram proveito. Será, com certeza, um duelo de terreno. Reduzir o tamanho do campo ao adversário é a maior tarefa para o português que em seis meses encantou o Brasil. Ele diz que é o jogo mais importante da sua vida. Nada melhor do que ganhá-lo.