Pais e filhos. Parlamento discute residência alternada

Pais e filhos. Parlamento discute residência alternada


São hoje debatidas as propostas de PAN, BE, PS, PSD e CDS. Apesar das diferenças, todas vão no mesmo sentido: privilegiar o regime da residência alternada, colocando sempre o interesse da criança em primeiro lugar.


Dez dias em casa da mãe, dez dias em casa do pai. Várias crianças já vivem sob este regime, mas não existe nada na lei que aconselhe a que assim seja. Os partidos debatem hoje as cinco propostas apresentadas no sentido de privilegiar o modelo de residência alternada. Apesar das nuances nos projetos de lei, todos estão de acordo numa coisa: o principal objetivo é assegurar o bem-estar das crianças.

Esta questão ganhou um novo fôlego no ano passado, com a petição da Associação para a Igualdade Parental. Esta tinha como objetivo que a Assembleia da República procedesse à alteração do Código Civil, por forma a “estabelecer a presunção jurídica da residência alternada para crianças cujos pais e mães se encontrem em processo de divórcio, separação judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do casamento, ou seja, da partilha entre mãe(s) e pai(s) de 33% a 50% do tempo de residência e do envolvimento continuado nos cuidados, na educação e na vida quotidiana dos seus filhos e filhas, como regime preferencial nas políticas públicas dirigidas à proteção das crianças”.

O PAN foi o primeiro partido a avançar com um projeto de lei. No documento apresentado, o PAN realça que o quadro legal atual dita “uma notória desigualdade no exercício das responsabilidades parentais”, com um dos pais a passar mais tempo com os filhos. Apesar disso, o partido realça que “20% dos pais e mães portugueses já têm os filhos/as em residência alternada”.

Citando vários estudos, o PAN explica que este regime diminui exponencialmente os conflitos entre os pais, diminui a possibilidade de uma das partes se sentir marginalizada, diminui o nível de stresse das crianças e melhora a adaptação à separação dos pais. “No caso específico de crianças muito pequenas, afigura-se como muito importante a regularidade da interação entre ambos os pais com a criança assente numa rotina que abarque pernoitas, maximizando-se desta forma relações douradoras e vinculações seguras entre as partes”, refere o projeto de lei.

“O que nós propomos é que este regime possa ser colocado como primeira hipótese no caso de separação”, explica ao i a deputada do PAN Bebiana Cunha. Apesar de ser visto como o melhor regime a ser aplicado, o PAN defende que existem situações em que não deve ser aplicado: “Excluímos a possibilidade de existir residência alternada em casos de violência doméstica, de negligência ou abuso infantil. Defendemos que aí, como é lógico, esse regime não deve ser posto em cima da mesa”, diz a deputada.

O Bloco de Esquerda também defende a implementação da residência alternada como uma “solução positiva”. “Apesar de o regime de residência alternada já ser um dos regimes de possível aplicação, há ainda algum caminho por fazer. Seja porque este regime exige um maior equilíbrio entre os interesses das mães e pais e os direitos das crianças, seja porque ainda subsiste uma ideia retrógrada de que à mulher devem caber todas as tarefas extralaborais, incluindo a educação dos/as filhos/as, a mudança legislativa agora proposta surge com o intuito de sinalizar a importância de procurar desenvolver este regime”, frisam os bloquistas.

Também o PS pede na sua proposta que se privilegie a residência alternada, “independentemente de mútuo acordo nesse sentido”, por forma a garantir que os interesses da criança sejam salvaguardados. No entanto, a deputada Cláudia Santos diz que este regime não deve ser visto como algo estanque e que todas as situações devem ser analisadas: “A residência alternada só é admitida quando não for contrária ao interesse da criança. Não existe nenhuma presunção de que esta é a ‘solução-regra’”, garantiu ao i.

 

Contra a “chapa 5”

Apesar disso, PSD e CDS preferem ser cautelosos e expor nas propostas a necessidade de não estabelecer regras fixas. Os sociais-democratas referem que existindo uma “diversidade de fatores e circunstâncias que condicionam a opção deste modelo como o mais benéfico para a criança, por manifesta falta de correspondência ao seu superior interesse ou até por impossibilidade objetiva dos seus progenitores em adequar-se a ele, não se reconhece a necessidade ou vantagem de acolher a fixação da residência alternada como regime-regra”, lê-se na proposta apresentada.

“Os tribunais fixam logo provisoriamente um regime e esse vai ficar a vigorar durante a pendência do processo, se as partes não chegarem a acordo. Isto pode durar um ano ou dois. Tem de haver uma situação de bom senso. Quando se fala de pessoas não pode haver presunções jurídicas, porque aquilo que é bom para mim pode não ser bom para outra pessoa. Não pode haver chapa 5 nos regimes de responsabilidade parental”, explica ao i a deputada Mónica Quintela.

Também o CDS rejeita “o estabelecimento de qualquer presunção legal para o efeito ou qualquer regime-regra ou preferencial”, lê-se no documento. “Acho difícil que se pense que com um determinado regime legal se resolvem todos os problemas de todas as crianças. Não há nada que substitua aqui o bom senso e o estudo de cada caso”, diz ao i Cecília Meireles.

 

Pensão de alimentos

Outro ponto defendido tanto pela direita como pela esquerda é a necessidade de não permitir que a aplicação deste regime seja usada como “fuga” às obrigações alimentares.

“A residência alternada não pode ser usada por um dos progenitores para não pagar pensão de alimentos. A opção por este regime não prejudica o dever de um progenitor ter de pagar pensão de alimentos se a sua situação económica for muito mais favorável do que a outra”, diz ao i Cláudia Santos. “Na legislatura passada adotou-se uma expressão interessante: ‘Não se quer que a criança seja pobre numa semana e rica na outra’. Aquilo que se pretende é que a residência alternada corresponda ao melhor interesse da criança, e não ao interesse dos progenitores em não pagar pensão de alimentos”, acrescenta a deputada socialista.

Uma coisa é certa: todos os partidos têm como principal objetivo assegurar o interesse da criança. “Mais do que os direitos dos progenitores, trata-se do direito das crianças a terem uma relação satisfatória, completa e feliz com os pais, quer vivam juntos ou separados. Todos pretendemos isso, a questão é qual a melhor maneira jurídica de lá chegar”, conclui Cecília Meireles.

• É um tipo de custódia parental que prevê que os filhos vivam com os dois pais aquando do processo de divórcio, num registo de coabitação. O habitual é que os filhos estejam uma semana em casa de um progenitor e outra na casa do outro, mas o tempo é sempre definido em tribunal, variando também entre dez e 15 dias em cada casa. Este regime não está ainda expressamente previsto na lei portuguesa; contudo, os tribunais apontam como argumentos a favor o facto de os filhos poderem manter uma igual vivência com ambos os progenitores e uma maior organização da parte dos pais no tempo que estão com os filhos. o que é a residência alternada• É um tipo de custódia parental que prevê que os filhos vivam com os dois pais aquando do processo de divórcio, num registo de coabitação. O habitual é que os filhos estejam uma semana em casa de um progenitor e outra na casa do outro, mas o tempo é sempre definido em tribunal, variando também entre dez e 15 dias em cada casa. Este regime não está ainda expressamente previsto na lei portuguesa; contudo, os tribunais apontam como argumentos a favor o facto de os filhos poderem manter uma igual vivência com ambos os progenitores e uma maior organização da parte dos pais no tempo que estão com os filhos.

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