Defendeu há um ano que Luís Montenegro seria uma boa solução para a liderança. Vai apoiá-lo?
Vou apoiar Luís Montenegro. Ele apresenta uma grande diferença estratégica em relação a Rui Rio. Essa diferença consiste na maneira como se vai lidar com o Partido Socialista. Rui Rio tem sido um excelente amparo de António Costa e, como está provado, o PS não tem vontade, nem capacidade, de fazer as reformas de que o país precisa. É preciso criar uma alternativa à governação socialista.
O PSD não conseguiu fazer isso?
Rui Rio mostrou-se incapaz disso. Não conseguiu criar essa alternativa durante o tempo em que esteve a liderar o PSD e nas eleições legislativas teve um dos piores resultados de sempre.
Responsabiliza Rui Rio por esse resultado?
Responsabilizo porque não conseguiu criar a perceção no país de que era capaz de liderar uma alternativa ao Governo socialista. Foi um péssimo resultado.
Foi apoiante de Rui Rio nas últimas eleições internas. Esperava outra coisa desta liderança? Foi uma desilusão?
Foi uma desilusão. Rui Rio foi uma espécie de amparo de António Costa. Tentou fazer acordos com António Costa. O Partido Socialista não cumpriu esses acordos, mas ele continuou sempre a insistir numa boa vontade excessiva em relação a António Costa. Até me fez lembrar aquele ditado popular: “Quanto mais me bates, mais gosto de ti”. E, por isso, para o bem da democracia, o PSD precisa de alguém que apresente um programa com uma alternativa ao PS. Rui Rio já demonstrou que não é capaz de o fazer. Não tem a disponibilidade e o rasgo para o fazer. Luís Montenegro tem desde o início essa vontade e essa capacidade de mobilização.
A postura do PSD em relação ao Partido Socialista é a grande diferença entre os candidatos?
A grande diferença política é a maneira de lidar com o Partido Socialista. Montenegro diz ao que vem. Diz que quer afastar-se do Partido Socialista e unir o partido. Rui Rio não vem ao que diz. Há aqui uma grande diferença. Para evitar o nascimento de partidos mais radicais e mais populistas há aqui uma obrigação do PSD de cumprir aquilo que é a sua história. O PSD é um partido plural que cobre uma área política muito alargada. Os militantes do PSD podem agradecer ao dr. Rui Rio o nascimento da Aliança e do Chega. São partidos que têm origem no PSD.
Porque houve tantas divergências internas no partido durante os últimos tempos?
Rui Rio não foi um líder agregador e esse foi outro dos motivos para a minha desilusão. Pinto Luz, por exemplo, foi excluído das listas e poderia ter dado um excelente deputado e até um bom líder parlamentar. Maria Luís Albuquerque foi excluída. Rui Rio olha para o PSD de uma forma muito autoritária. Não faltam exemplos de exclusão por parte de Rui Rio – exclusão essa muitas vezes motivada por questões de birra e capricho pessoal. Isso faz-nos pensar que ele olha para o PSD como um partido portátil, mais pequeno… um partido que ele possa levar para onde lhe der mais jeito, retirando-lhe a dimensão e a grandeza que fazem parte da sua história, um partido que ele possa conduzir de forma a controlá-lo como lhe der mais jeito. Essa foi a segunda desilusão, essa incapacidade de Rui Rio agregar aquilo que é a pluralidade típica e histórica do PSD.
A direita está a passar um momento difícil. É possível ultrapassar estas dificuldades a curto prazo?
Em política é tudo muito rápido. É muito difícil fazer previsões. Tanto podemos assistir a resultados eleitorais muito negativos como, muito rapidamente, assistir ao contrário. Os eleitores têm essa capacidade de mudar. Não me parece que esta derrota clamorosa assuma um caráter definitivo. Isso aconteceu porque as pessoas não identificaram no centro-direita uma alternativa ao Partido Socialista. Rui Rio não conseguiu mostrar essas diferenças.
Teria sido possível ganhar com outra liderança?
Era possível ganhar e a prova disso é o resultado do Partido Socialista. É um resultado perfeitamente acessível ao PSD. Se o PS tivesse governado bem, não teria tido 36%, teria tido muito mais.
Mas o Governo teve sempre alguma popularidade ao longo dos quatro anos da legislatura.
Foi um Governo que teve oportunidade de estar quatro anos no poder e de implementar medidas do agrado popular. Mas o PSD não conseguiu mostrar às pessoas que tinha um programa alternativo. Não é por capricho ou por clubismo partidário que acho que o PSD deve distanciar-se do Partido Socialista. António Costa já demonstrou a sua incapacidade para fazer reformas. E, por isso, parece-me bem que Luís Montenegro já tenha esclarecido que votaria contra este Orçamento mesmo sem o conhecer. OPSD não pode dar moções de confiança a este Governo socialista.
Não é precipitado?
Não. Este Partido Socialista não vai fazer nenhum Orçamento nos próximos anos que consiga corrigir o mal que causou ao país, nomeadamente em setores de cariz social. No Serviço Nacional de Saúde, na educação, na segurança social…
Este Governo também tem condições para durar quatro anos?
Sim. Tem todas as condições para fazer quatro anos, mas o PS tem de resolver essa questão com o PCP, o Bloco de Esquerda, o Livre e o PAN.
Rui Rio chegou à liderança com a ideia de que era necessário recentrar o PSD. Esta é uma disputa entre um PSD mais ao centro ou mais à direita?
O PSD é um partido que deve agregar tendências ideológicas que tenham denominadores comuns que permitam fazer uma governação coerente. É essa a sua vocação natural. O PSD é um partido de banda larga. Deve ir do centro-direita até à social-democracia.
O PSD não mudou com a liderança de Pedro Passos Coelho, tornando-se mais liberal?
Acho isso muito injusto. Passos Coelho governou em circunstâncias muito difíceis. Pertenci a esse Governo [como secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação] e tenho essa perceção de uma forma muito forte. Não tínhamos autonomia orçamental e estávamos muito condicionados pela troika. Havia um programa que, no essencial, era imposto por entidades externas ao país. Mas mesmo com todas essas limitações, o Governo de Passos Coelho teve uma grande preocupação social.
Em que áreas identifica essa sensibilidade social?
Na recuperação daquilo que era o Sistema Nacional de Saúde, que tinha dívidas elevadíssimas…
Mas a contestação social foi muito maior.
Houve um clima muito duro para o Governo. O PS e os partidos de esquerda não entenderam as dificuldades que o Estado tinha do ponto de vista financeiro. O PS assobiou para ar, fingindo que as dificuldades financeiras que o país estava a atravessar não tinham nada a ver com a governação do primeiro-ministro José Sócrates.
Há uma parte do PSD que continua muito fiel às ideias do ex-primeiro-ministro. Faz sentido falar na possibilidade de Passos Coelho regressar à política no caso de a crise na direita se aprofundar?
É natural que haja um reconhecimento do trabalho desenvolvido por Passos Coelho. Foi um trabalho que permitiu a António Costa distribuir os peixes que ele pescou e meteu dentro do balde. Conseguiu em pouco tempo retirar o país da bancarrota e dar-lhe credibilidade internacional. É natural que haja um reconhecimento que depois se concretiza em nostalgia. Passos Coelho soube estar na vida pública de uma maneira substancialmente diferente da maior parte dos políticos. Não é um político trauliteiro e de promessas vãs. Quando ao futuro político, só ele saberá. É uma questão que não se coloca neste momento porque o futuro do PSD depende destas eleições diretas.
Montenegro está mais próximo daquilo que foi o passismo do que Rui Rio…
Rui Rio fala muito das dificuldades que os críticos lhe criaram, mas foi sempre um crítico da governação de Passos Coelho. Luís Montenegro foi líder parlamentar durante esses seis anos. Fez um trabalho muito positivo e é natural que as pessoas entendam que há uma maior proximidade entre Montenegro e Passos Coelho.
O PSD está entusiasmado com a atuação de Marcelo Rebelo de Sousa?
O país estava muito crispado quando Marcelo Rebelo de Sousa chegou à Presidência. As pessoas não estavam habituadas a que um partido ganhasse as eleições e não fosse para o Governo. Isso dividiu o país e o Presidente da República fez um trabalho notável. O país deve-lhe muito. Conseguiu com a sua autenticidade afetiva amenizar a crispação social.
Não favoreceu o Governo, como algumas pessoas achavam dentro do PSD?
Marcelo Rebelo de Sousa obrigou o Governo, em algumas situações, a apresentar soluções. Foi o que aconteceu no caso dos incêndios. Ele deu visibilidade às situações mais precárias.
Não é daquelas pessoas que acham que há um certo excesso na atividade do Presidente da República?
Respeito essas opiniões, mas essa avaliação é uma injustiça. Essa intensidade tem evitado que surjam mais forças políticas populistas.
Como olha para o aparecimento de partidos como o Chega?
Não vejo o Chega de forma diferente dos partidos à esquerda do Partido Socialista. Meto-os na mesma gaveta. Eles têm o seu espaço, a sua legitimidade, mas classifico-os da mesma forma. Não vejo que seja mais perigoso um partido como o Chega do que um partido como o Bloco de Esquerda.
André Ventura pode ser uma ameaça para o PSD?
É evidente que partidos como o Chega podem ganhar espaço se o PSD não conseguir dar respostas ao país em áreas como a corrupção, as questões sociais ou a necessidade de travar um capitalismo selvagem. E por isso é que é necessário um PSD mais agregador e com um programa que possa dar respostas a essas áreas mais críticas. Mas comparando com outros países europeus, isso ainda não é um drama em Portugal.
Mas pode vir a ser?
Os partidos têm de dar respostas sérias às preocupações das pessoas. Caso contrário, os partidos populistas, que também não tem soluções para estes problemas mas conseguem pôr o dedo da ferida, vão fazer a conversa que o eleitorado quer ouvir e ganham votos. A responsabilidade de travar o crescimento desses partidos depende muito do PSD e, por isso, precisa de ser mais inclusivo e mais plural.
É possível o PSD voltar a conseguir uma maioria absoluta?
Penso que é possível, mas tem de ser um partido que mantenha a pluralidade. Luís Montenegro foi líder da bancada durante seis anos e manteve a bancada estável. Manteve o diálogo com outra força política. Se ele transportar essa filosofia para a liderança do partido vai ter um partido mais unido.
Rui Rio falou em interesses pouco transparentes e da influência da maçonaria dentro do PSD. A maçonaria tem influência dentro do partido?
Há um certo exagero nisso, mas quem ocupa lugares públicos deve ter a obrigação de ser transparente em relação às organizações a que pertence. Mas deixe-me levar a conversa mais para o lado do humor. O que acontece é que há falta de ideias e falta de combate político. Rui Rio não tem capacidade para fazer oposição e aparece com estas intrigas. Tem de ser mais claro e mais direto devido ao lugar que ocupa. Se tem alguma acusação a fazer, deve fazê-la diretamente e não deve fazer insinuações.
Mas são conhecidas as ligações dos candidatos…
Luís Montenegro já desmentiu isso.
Sentiu alguma vez a influência da maçonaria quando era deputado ou dirigente do PSD?
Nunca senti isso e ocupei lugares no partido de alguma relevância. Fui secretário-geral adjunto com Durão Barroso e Santana Lopes, fui vice-presidente do grupo parlamentar, fui membro do Governo… Nunca senti pressões desse género. Não sei se quem fala nelas as sentiu mas, se isso aconteceu, deve ser claro e deve concretizar. A pior coisa que pode haver na vida e na política é a insinuação.
Decidiu renunciar ao lugar de deputado no final do ano de 2018. Estava desiludido com a política?
Quis fazer outras coisas profissionalmente e dar espaço a novas pessoas. Cheguei ao Parlamento em 2002 e estava na altura de sair. Entrei no Parlamento com uma enorme esperança de fazer coisas e, enquanto fui deputado, tive essa energia. Quando nós sentimos que já não temos o mesmo entusiasmo, a mesma energia, a mesma disponibilidade mental, devemos dar o lugar a outros. Não podemos ficar agarrados aos lugares. A minha vida não se esgota na política.
Isso pode ser uma vantagem para quem está na vida política?
Tenho amigos da escola primária, da universidade, da vida profissional… Também fiz amigos na política, mas a minha vida não se resume à política. Hoje sou um homem completamente livre. Não estou à espera de nenhum lugar.