Se a arte de fazer golos é um dom no futebol que poucos dominam, mais difícil de dominar ainda é a arte de fazer grandes golos. Qualquer jogador tem o sonho de ao longo da sua carreira fazer, pelo menos, um daqueles golos de levantar qualquer estádio, que seja quiçá merecedor de um prémio FIFA Ferenc Puskás – prémio atribuído ao melhor golo do ano. Contudo, nem todos conseguem concretizá-lo. Son Heung-min, avançado sul-coreano do Tottenham, pode muito bem ter entregue a sua candidatura este sábado.
Doze segundos. Foi tudo o que Son Heung-min precisou para fazer o golo de uma vida. O Tottenham já vencia o Burnley por 2-0 – com golos de Harry Kane e Lucas Moura – quando, à passagem do minuto 32, aquele que foi considerado o melhor jogador asiático do ano pela terceira vez consecutiva decidiu soltar o seu génio interior.
O Burnley bateu um livre para a área da formação londrina. Jan Vertonghen, defesa belga dos spurs, cortou para Son, e aí começou a magia. O avançado sul-coreano recebeu o esférico ainda à entrada da sua grande área e percorreu mais de 70 metros até chegar à baliza. Pelo meio driblou sete jogadores da equipa adversária (não, não é engano). Brady, Tarkowski, Hendrick, McNeil, Pieters, Mee e Lowton, todos eles foram vítimas de Son, que foi serpenteando por todos os jogadores do Burnley até que surgiu na cara de Pope e aí finalizou para o 3-0 (a equipa de José Mourinho viria a marcar mais dois golos, fixando o resultado nos 5-0). Foi um total de 11 segundos, 11 toques na bola, sete adversários driblados, mais de 70 metros percorridos e um golo para Son entregar a sua candidatura ao Puskás desta época, com este golo maradoniano.
O golo foi de tal ordem espetacular que levou o Special One a fazer uma daquelas comparações que deliciam os ouvidos de qualquer atleta. Na conferência de imprensa após o final do encontro com o Burnley, José Mourinho contou a alcunha que o seu filho já tinha dado ao jogador asiático e afirmou que este golo a justificava: “Mesmo antes deste golo, o meu filho já lhe chamava Sonaldo Nazário, e hoje ele foi Sonaldo Nazário”, referindo-se a Ronaldo, o fenómeno brasileiro.
O técnico português recordou ainda um golo que em muito se assemelhou a este de Son Heung-min. “Aquilo que me veio à cabeça foi um golo que tive a honra de ver sentado ao lado de Sir Bobby Robson: Compostela-Barcelona, 1996, quando o Ronaldo pegou na bola a meio-campo e marcou um golo parecido. Foi o que me veio à cabeça”.
Quanto ao jogador dos spurs, esse não escondeu a satisfação por aquele que considerou ser o “melhor golo da carreira”. “Quando recebi a bola tentei passá-la ao Alli. Como não o vi… fui correndo, correndo. Não sabia o que ia suceder até rematar. Foi o melhor golo da minha carreira”.
No dia 12 de outubro de 1996, a cidade de Santiago de Compostela avistava um golo semelhante, esse tal golo referido por Mourinho. Na altura, Ronaldo Nazário, também conhecido no mundo do futebol como Ronaldo Fenómeno, vestia a camisola do Barcelona – na sua única época ao serviço dos catalães – e justificou o porquê dessa sua alcunha.
A jogada começou vulgar e nada fazia prever o que aí vinha. Ao minuto 36, Gica Popescu, antigo defesa romeno do Barcelona, ganhou a bola ainda no meio-campo da sua equipa e colocou-a no centro do campo. Aí surgiu ele mesmo, o Fenómeno, que na raça ganhou a bola no meio de três jogadores da Sociedad Deportiva de Compostela, driblou outros dois e arrancou pela ala esquerda do campo. Depois de largos metros cavalgados, fintou mais dois jogadores já dentro da área adversária e rematou, rasteiro, para o canto inferior esquerdo da baliza dos da casa, fazendo um golo que ficou na história do futebol. Nessa época, o avançado brasileiro fez um total de 47 golos em 49 jogos pelos blaugrana, vencendo a Taça das Taças, a Supertaça espanhola e a Copa do Rei. No final da época seria transferido para o Inter de Milão e o resto, como se costuma dizer, é história.
Estes sprints intermináveis a serpentear por entre adversários e a acabar no fundo das redes adversárias é também uma moda entre os jogadores que vêm da Argentina. Lionel Messi, astro do Barcelona e atual Bola de Ouro, tornou este tipo de golos quase uma prática comum ao longo das suas 17 temporadas enquanto profissional. No entanto, antes, Diego Armando Maradona era já perito nestas cavalgadas. Exemplo disso mesmo foi o seu grande golo frente à Inglaterra nos quartos-de-final do Mundial de 1986, no México, em pleno Estádio Azteca, quando o argentino recebeu a bola ainda no seu meio-campo defensivo, percorreu mais de 60 metros e fintou seis adversários, incluindo o guarda-redes inglês, fazendo o 2-1 que garantia a passagem da Argentina à próxima fase. Esse foi o encontro da mítica “mão de Deus”, que acabou por ser secundarizada por este golo maradoniano.