A poupança, a habitação e o risco duma próxima bancarrota


A pouquíssima poupança gerada em Portugal está a ser literalmente empurrada para ir criar riqueza no estrangeiro.


Numa economia social de mercado, é a poupança das famílias e das empresas que fomenta os investimentos que aumentam a produtividade do trabalho e asseguram a criação de empregos economicamente sustentáveis.

A poupança dos cidadãos é claramente um ato individual de solidariedade coletiva, pois prescinde-se de consumir hoje para criar riqueza futura para o conjunto da sociedade.

É por isso extremamente preocupante que a poupança em Portugal continue a registar, nos últimos anos, valores muito baixos, da ordem dos 4%, que impedem qualquer grau de autonomia estratégica do nosso país em termos da mobilização dos recursos financeiros necessários à construção do nosso futuro .

Com uma dívida global do Estado, das empresas e das famílias que continua a ser das mais altas do mundo, esta baixíssima taxa de poupança é uma enorme vulnerabilidade económico-social do país.

O Governo tem-se alheado deste gravíssimo problema, não fomentando o aforro orientado para atividades socialmente relevantes.

No caso da habitação, a atuação do Governo nos últimos anos pode mesmo caracterizar-se como um atentado direto à economia social de mercado!

O que se reveste duma enorme contradição face à propalada preocupação deste mesmo Governo de tornar mais fácil para as famílias o acesso a uma habitação condigna.

De facto, o Governo diz que quer promover o investimento na habitação e, depois, tudo faz para afugentar e massacrar quem investiu, ou quer investir, na habitação para arrendar.

É o famigerado imposto Mortágua, que confisca exclusivamente os proprietários de imóveis habitacionais.

É a legislação que mantém congeladas, a valores ridículos, por vezes a menos de 100 euros por mês por um T3, rendas de imóveis nos centros de Lisboa e do Porto, e em que o Governo nem sequer permite que sejam aplicados os “coeficientes sociais” que a legislação atualmente prevê para os casos das propaladas “rendas acessíveis”!

E é, agora, o ameaçador “englobamento das rendas no IRS”, que é um verdadeiro confisco das poupanças das classes médias.

Vejamos duas vertentes brutais desta última enormidade que, pelos vistos, está para ser aprovada no próximo Orçamento do Estado. 

Ao considerar como receitas líquidas o valor bruto das rendas, o fisco está a esquecer-se de que os imóveis arrendados são um património físico e, portanto, sujeito a amortização. Só que não há deduções por amortização em sede de IRS! A receita bruta passa automaticamente, e por artes de magia, a receita líquida.

Consideremos, por exemplo, um T2 antigo mas renovado em Lisboa e adquirido por 180 mil euros para ser alugado por 650 euros. A receita bruta das rendas anuais é de 7800 euros e é sobre isto que se propõe que o fisco cobre taxas marginais de IRS de 50%, ou seja, qualquer coisa como 3900 euros por ano.

Só que, considerando que esse andar tem uma vida útil de 20 anos, a amortização correspondente é de 9 mil euros por ano. O que significa que, em termos duma análise económica saudável, o investidor tem um prejuízo anual direto de 1200 euros (7800-9000 euros). E como vai ter ainda de pagar IMI e mais o imposto Mortágua, que em conjunto representam uns “simpáticos” 1200 euros anuais, o prejuízo sobe para 2400 euros. E como, depois deste prejuízo, tem ainda por cima de pagar ao Estado 3900 euros de IRS, este investidor vai perder 6300 euros por ano!

Como incentivo à poupança para investir em habitação, é difícil imaginar uma maior calamidade.

Mas também numa perspetiva de alternativas socialmente mais úteis para a aplicação da poupança, o que temos?

Como as taxas de juro, mesmo dos depósitos a prazo, estão nulas ou negativas, o que resta para os aforradores da classe média? Investir na bolsa em empresas portuguesas? Com os desastres dos últimos 15 anos, é preciso ter muita coragem…

Sobram os investimentos em carteiras de obrigações e ações “seguras”, certamente de títulos estrangeiros.

O que quer dizer que a pouquíssima poupança gerada em Portugal está a ser literalmente empurrada para ir criar riqueza no estrangeiro.

Estamos, pois, numa rota financeiramente insustentável a prazo relativamente curto.

O consumo a crédito, levando a reboque o IVA, o ISP, o IA, o IMT e tantos outros impostos, pode momentaneamente ajudar a manter o défice sob controlo.

Mas sem estímulos às poupanças socialmente úteis, a próxima bancarrota não estará longe, como há poucas semanas já avisou António Horta Osório.

Para evitar políticas erradas como estas, o país necessita duma democracia de qualidade, pelo que convido o leitor a assinar a petição http://peticaopublica.com/pview.aspx?pi=voto-cidadania, que irá finalmente ser discutida na Assembleia da República no próximo dia 20 de dezembro, pelas 10 horas.

Professor catedrático do Instituto Superior Técnico

Subscritor do “Manifesto: Por Uma Democracia de Qualidade”

A poupança, a habitação e o risco duma próxima bancarrota


A pouquíssima poupança gerada em Portugal está a ser literalmente empurrada para ir criar riqueza no estrangeiro.


Numa economia social de mercado, é a poupança das famílias e das empresas que fomenta os investimentos que aumentam a produtividade do trabalho e asseguram a criação de empregos economicamente sustentáveis.

A poupança dos cidadãos é claramente um ato individual de solidariedade coletiva, pois prescinde-se de consumir hoje para criar riqueza futura para o conjunto da sociedade.

É por isso extremamente preocupante que a poupança em Portugal continue a registar, nos últimos anos, valores muito baixos, da ordem dos 4%, que impedem qualquer grau de autonomia estratégica do nosso país em termos da mobilização dos recursos financeiros necessários à construção do nosso futuro .

Com uma dívida global do Estado, das empresas e das famílias que continua a ser das mais altas do mundo, esta baixíssima taxa de poupança é uma enorme vulnerabilidade económico-social do país.

O Governo tem-se alheado deste gravíssimo problema, não fomentando o aforro orientado para atividades socialmente relevantes.

No caso da habitação, a atuação do Governo nos últimos anos pode mesmo caracterizar-se como um atentado direto à economia social de mercado!

O que se reveste duma enorme contradição face à propalada preocupação deste mesmo Governo de tornar mais fácil para as famílias o acesso a uma habitação condigna.

De facto, o Governo diz que quer promover o investimento na habitação e, depois, tudo faz para afugentar e massacrar quem investiu, ou quer investir, na habitação para arrendar.

É o famigerado imposto Mortágua, que confisca exclusivamente os proprietários de imóveis habitacionais.

É a legislação que mantém congeladas, a valores ridículos, por vezes a menos de 100 euros por mês por um T3, rendas de imóveis nos centros de Lisboa e do Porto, e em que o Governo nem sequer permite que sejam aplicados os “coeficientes sociais” que a legislação atualmente prevê para os casos das propaladas “rendas acessíveis”!

E é, agora, o ameaçador “englobamento das rendas no IRS”, que é um verdadeiro confisco das poupanças das classes médias.

Vejamos duas vertentes brutais desta última enormidade que, pelos vistos, está para ser aprovada no próximo Orçamento do Estado. 

Ao considerar como receitas líquidas o valor bruto das rendas, o fisco está a esquecer-se de que os imóveis arrendados são um património físico e, portanto, sujeito a amortização. Só que não há deduções por amortização em sede de IRS! A receita bruta passa automaticamente, e por artes de magia, a receita líquida.

Consideremos, por exemplo, um T2 antigo mas renovado em Lisboa e adquirido por 180 mil euros para ser alugado por 650 euros. A receita bruta das rendas anuais é de 7800 euros e é sobre isto que se propõe que o fisco cobre taxas marginais de IRS de 50%, ou seja, qualquer coisa como 3900 euros por ano.

Só que, considerando que esse andar tem uma vida útil de 20 anos, a amortização correspondente é de 9 mil euros por ano. O que significa que, em termos duma análise económica saudável, o investidor tem um prejuízo anual direto de 1200 euros (7800-9000 euros). E como vai ter ainda de pagar IMI e mais o imposto Mortágua, que em conjunto representam uns “simpáticos” 1200 euros anuais, o prejuízo sobe para 2400 euros. E como, depois deste prejuízo, tem ainda por cima de pagar ao Estado 3900 euros de IRS, este investidor vai perder 6300 euros por ano!

Como incentivo à poupança para investir em habitação, é difícil imaginar uma maior calamidade.

Mas também numa perspetiva de alternativas socialmente mais úteis para a aplicação da poupança, o que temos?

Como as taxas de juro, mesmo dos depósitos a prazo, estão nulas ou negativas, o que resta para os aforradores da classe média? Investir na bolsa em empresas portuguesas? Com os desastres dos últimos 15 anos, é preciso ter muita coragem…

Sobram os investimentos em carteiras de obrigações e ações “seguras”, certamente de títulos estrangeiros.

O que quer dizer que a pouquíssima poupança gerada em Portugal está a ser literalmente empurrada para ir criar riqueza no estrangeiro.

Estamos, pois, numa rota financeiramente insustentável a prazo relativamente curto.

O consumo a crédito, levando a reboque o IVA, o ISP, o IA, o IMT e tantos outros impostos, pode momentaneamente ajudar a manter o défice sob controlo.

Mas sem estímulos às poupanças socialmente úteis, a próxima bancarrota não estará longe, como há poucas semanas já avisou António Horta Osório.

Para evitar políticas erradas como estas, o país necessita duma democracia de qualidade, pelo que convido o leitor a assinar a petição http://peticaopublica.com/pview.aspx?pi=voto-cidadania, que irá finalmente ser discutida na Assembleia da República no próximo dia 20 de dezembro, pelas 10 horas.

Professor catedrático do Instituto Superior Técnico

Subscritor do “Manifesto: Por Uma Democracia de Qualidade”