A ADSE só será viável a longo prazo se forem tomadas medidas que garantam benefícios atrativos, mais jovens entre os beneficiários e mais receitas. O alerta é do Tribunal de Contas, que esta quarta-feira publica o relatório de uma auditoria de seguimento às recomendações feitas em 2015 e 2017 para a sustentabilidade do subsistema de saúde dos funcionários públicos. O sinal é vermelho e a sustentabilidade continua a não estar garantida.
No relatório, a que o i teve acesso, os auditores traçam duras críticas ao atual modelo de gestão do subsistema de saúde dos funcionários públicos, um instituto público tutelado por Saúde e Finanças. Alertam para a falta de uma estratégia a prazo e avisam que com um universo de beneficiários cada vez mais envelhecido, e as despesas de saúde nas faixas etárias mais velhas a aumentar, a partir de 2020 a ADSE começará a dar prejuízo e a almofada não vai chegar para muito tempo.
A previsão é de um défice anual de 17 milhões de euros já no próximo ano, com os auditores a projetar que os excedentes acumulados até 2019 (535ME) acabarão por esgotar-se em 2026.
O TdC recorda a intenção de alargar o universo de beneficiários, decisão adiada pelo Governo na última legislatura, e avisa que os 100 mil novos beneficiários estimados por exemplo com a abertura da ADSE a funcionários do Estado com contratos individuais de trabalho já não garantiriam a sustentabilidade. “Seria necessário um alargamento adicional a cerca de 300 mil novos titulares com uma idade média de 30 anos, para garantir que o saldo acumulado da ADSE seria suficiente até 2028. Para assegurar um saldo anual positivo até esse ano, o alargamento teria que ser na ordem dos 1,1 milhões de novos quotizados”.
No contraditório, a ADSE contestou as projeções, considerando que as estimativas do TdC não têm em conta as medidas de controlo de despesa – recorde-se que foi reforçado o controlo de faturação e foram introduzidos mecanismos de autorização prévia para alguns tratamentos. Para o TdC, o impacto das medidas a longo prazo não foi estudado e a fraude comprovada, uma das frentes de ataque, é “residual”.
E este não é o único reparo à atual gestão da ADSE. Perante a resposta do conselho diretivo de que medidas sobre o sistema de benefícios e taxas de desconto cabem ao legislador, o TdC considera que “a argumentação (…) não é compatível com uma gestão técnica da ADSE, com o seu autofinanciamento pelos beneficiários, nem com os riscos, para a despesa, associados ao aumento de idade média dos beneficiários e consequente pressão sobre os custos de saúde”.
Beneficiários mandam pouco O TdC contesta a atual representação dos beneficiários nas estruturas de decisão da ADSE, que acabam por ter participação maioritária do Estado, assinalando que a composição do Conselho Geral e de Supervisão traduz-se em apenas 4 dos 17 elementos a representarem diretamente os beneficiários, quando os seus descontos representaram, em 2017, 93% das fontes de financiamento da ADSE. Esta é uma das recomendações ao Governo: rever o modelo de administração da ADSE, mas também garantir que encargos suportados pelo subsistema mas que são da responsabilidade do Estado para com todos os cidadãos sejam assumidos pelo Orçamento do Estado. É o caso de tratamentos no estrangeiro, cuidados continuados ou transporte de doentes para o SNS. Ao conselho diretivo do instituto, o TdC recomenda medidas para aumento da receita, alargando os beneficiários mais jovens e cobrança de dívidas do Estado e das regiões autónomas (184 ME em 2018). Pede também medidas de racionalização de despesa mas “devidamente quantificadas e suportadas em estudos (custo-benefício), o que atualmente não ocorre”.
ADSE poupa 500 ME ao SNS O TdC alerta que “a sustentabilidade da ADSE está dependente de não ser percecionada como um sistema a prazo”. Caso o panorama não mude, a solidariedade entre gerações seria quebrada, “frustrando as legítimas expectativas dos atuais quotizados que vêm descontando ao longo da carreira ou que já se encontram aposentados”.
Num cenário de insustentabilidade, os mais prejudicados serão os beneficiários com rendimentos mais baixos e familiares, cerca de 453 mil beneficiários “que terão mais dificuldades para substituir a ADSE por seguros disponíveis no mercado”, alerta o TdC. Mas o impacto seria pesado no SNS. O tribunal argumenta que a ADSE possibilita aos quotizados não estarem sujeitos aos tempos de espera no SNS, “o que, eventualmente, poderá traduzir-se na diminuição do absentismo dos funcionários públicos por motivo de doença e no aumento da produtividade”. Por outro lado, diz o TdC, os beneficiários da ADSE aliviam o OE em cerca de € 500 milhões anuais de despesa em saúde, que financiam autonomamente. Em suma: “Uma eventual insustentabilidade da ADSE seria prejudicial não só para os seus beneficiários mas também para os cidadãos em geral, tendo em conta o aumento de procura que se verificaria no SNS”.
Descontam 14 meses, usufruem 12
A auditoria considera os atuais descontos para a ADSE pouco transparentes. O desconte de 3,5% é feito 14 vezes por ano: incide nos subsídios de natal e de férias, o que na prática significa uma taxa de ,6% e 7,9% sobre o vencimento líquido. Para o TdC, o esforço financeiro tem de ser clarificado.