Vivemos cada vez mais e é o Norte que vai à frente

Vivemos cada vez mais e é o Norte que vai à frente


O INE atualizou os dados sobre a esperança de vida no país. As mulheres chegaram aos 83,43 anos e os homens aos 77,78. A região do Cávado é campeã da longevidade. Ilhas e Baixo Alentejo estão no fundo da tabela, com três anos de diferença.


É mais ano e meio no espaço de uma década. A esperança de vida continua a aumentar em todo o país e atingiu no último triénio os 80,8 anos. As mulheres vivem mais, mas esbateu-se a diferença entre sexos. Os novos dados divulgados esta quinta-feira pelo Instituto Nacional de Estatística mostram melhorias na longevidade e põem também à vista as diferenças no país, com o Norte em vantagem e Alentejo e ilhas no fundo da tabela.

A esperança de vida, como já mostravam análises de anos anteriores, é maior na sub-região do Cávado (81,81 anos) e menor nas regiões autónomas. O INE assinala que o maior aumento deu-se na Madeira, com um ganho de 2,17 anos face a 2008-2010, para os 78,3 anos. Ainda assim, a diferença entre Cávado e Madeira é de 3,51 anos. Nos Açores a esperança de vida à nascença mantém-se a mais baixa do país – 77,85 anos.

No continente, é o Baixo Alentejo que surge com a esperança de vida à nascença mais baixa. Uma criança que nasça hoje no concelho de Braga, um dos municípios que pertence à sub-região estatística do Cávado, pode contar viver mais 3,05 anos do que alguém que nasça no interior do Alentejo, em concelhos como Mértola ou Aljustrel.

Ana Alexandre Fernandes, demógrafa e presidente da Associação Portuguesa de Demografia, diz que algumas variações são expectáveis e podem ser em parte atenuadas, ainda que haja outros aspetos a ter em conta na análise. A investigadora sublinha que, no essencial, a esperança de vida “ressente-se das condições de vida, nomeadamente no final da vida”. Desde o final dos anos 70 aumentou cerca de 10 anos em Portugal e o país convergiu com a União Europeia. “Neste momento estamos a beneficiar de termos melhores condições no final de vida, boa assistência médica, acesso a mais cuidados e de melhores condições económicas”, sublinha a investigadora.

Se os indicadores socioeconómicos podem explicar as diferenças regionais, Ana Alexandre Fernandes explica que, quando se faz a análise ao nível das regiões, pode haver “enviesamentos”. Por um lado, assinala, o cálculo da esperança média de vida à nascença é feito com estimativas para a população em cada região, já que os últimos dados reais disponíveis são do Censos de 2011 – logo as estimativas poderão não coincidir exatamente com a população. Por outro lado, quando se decompõe a população em sub-regiões estatísticas, haver zonas do país com menor densidade populacional ou mais envelhecidas, com maior flutuação no número de óbitos, pode também pesar nas variações.

Feita esta ressalva, Ana Alexandre Fernandes salienta que parte das diferenças resultarão de condições de vida, questões culturais, como as redes familiares e o maior ou menor isolamento dos idosos e ainda da maior ou menor incidência de algumas doenças. A investigadora destaca por exemplo que nas ilhas, onde historicamente a esperança de vida foi sempre inferior à do continente, existe maior mortalidade por doenças respiratórias, o que também está associado ao clima. Diferenças no acesso à saúde são outros fatores que podem pesar, explica.

Os dados do INE mostram que a esperança de vida é maior na região Norte e de seguida na região Centro e há um indicador da Saúde em que são também estas regiões que se destacam pela positiva. Segundo os últimos dados do Ministério da Saúde, na Administração Regional de Saúde do Norte, 99,2% dos utentes inscritos têm médico de família e na região Centro a cobertura abrange 97,5% da população. No Alentejo 94,1% da população tem médico e na região de Lisboa e Vale do Tejo e no Algarve a cobertura ronda 87%.

Homens recuperam terreno A análise do INE conclui que a esperança de vida à nascença continua a ser superior para as mulheres, mas a diferença diminuiu para 5,65 anos, quando em 2008-2010 era de 6,02. Uma rapariga que nasça hoje pode contar viver 83,43 anos e um rapaz 77,78 anos.

Ana Alexandre Fernandes sublinha que esta diferença existe em todos os países e é estrutural: tem a ver com a atitude face à saúde e à exposição ao risco, maior nos homens, dos acidentes laborais à velocidade nos automóveis, exemplifica. Maior preocupação e maior prevenção pode atenuar a diferença, mas não é provável que os homens venham a superar as mulheres. As projeções do INE sugerem que em 2050 a esperança de vida dos homens à nascença estará nos 83,44 anos, perto do valor atual do sexo feminino, e a das mulheres terá descolado para os 88,61. Em 2080, os homens deverão chegar ao patamar dos 87 anos e as mulheres aos 93.

A fotografia europeia A esperança de vida das mulheres em Portugal está dentro da média europeia mas no caso dos homens ainda fica aquém (78,3 anos). Outro indicador em que Portugal continua menos bem no retrato europeu é na esperança de vida saudável depois dos 65 anos. As Tábuas de Mortalidade do INE atualizam a esperança de vida após os 65, que atingiu 19,49 anos em Portugal para ambos os sexos – 17,58 anos nos homens e 20,88 anos nas mulheres.

Os últimos dados, de 2017, revelam que os portugueses vivem apenas 7,9 destes anos sem limitações e as portuguesas ainda menos – 6,7 anos –, quando a média europeia está acima dos nove anos. E na Suécia e na Noruega, em que a esperança de vida é ligeiramente superior à nacional (93 e 92 anos), supera os 15 anos.

Ana Alexandre Fernandes salienta que esta é uma das áreas em que o país pode melhorar, mas também aqui há detalhes a ponderar. “O conceito de esperança de vida saudável é calculado a partir de indicadores também subjetivos, de como as pessoas avaliam a sua saúde. Em Portugal há pouca tendência para promover a autonomia das pessoas, mas os portugueses também avaliam sempre muito negativamente o seu estado de saúde”, diz. Os ganhos na longevidade são positivos, conclui, mas uma coisa é certa: o envelhecimento da população trará novos desafios ao país.

 

Ainda há 14 países abaixo do patamar dos 60

A nível global, a esperança de vida à nascença atingiu em 2016 os 72 anos – 74,2 anos para as mulheres e 69,8 anos nos homens. A última análise da Organização Mundial da Saúde destaca que entre 2000 e 2016 verificou-se o aumento mais rápido na esperança de vida desde os anos 60, de cerca de 5,5 anos. Uma subida que reverteu o declínio registado nos anos 90, quer pela epidemia da sida em África quer nos países do leste Europeu, em que a esperança de vida diminuiu depois do fim da União Soviética. O maior aumento registou-se nos países na região africana, uma subida de 10,3 anos para uma esperança média de 61,2 anos à nascença. A melhoria na mortalidade infantil e no acesso a antiretrovirais são as explicações apontadas pela OMS. Segundo os últimos dados coligidos pelo Banco Mundial, ainda há 14 países onde a esperança de vida à nascença não vai além dos 60 anos, um fosso de 30 anos em relação às regiões do globo com maior longevidade.