Greta exagera? Podemos ficar à espera


Cada vez mais cercada de suspeitas sobre como pode estar a ser manipulada, o que também terá pouco de inocente, Greta não deixa de ter razão no pouco que foi feito 


A onda negativa em torno de Greta Thunberg, depois do discurso de segunda-feira com os membros do painel a acenar com a cabeça enquanto atirava à sala furiosos “como se atrevem”, acabou por tornar-se o resultado mais palpável da cimeira climática da ONU em Nova Iorque, que de resto pouco de novo trouxe. Insolente, encenada – as reações multiplicaram-se e as imagens geram um misto de sentimentos.

Cada vez mais cercada de suspeitas sobre como pode estar a ser manipulada, o que também terá pouco de inocente, Greta não deixa de ter razão no pouco que foi feito – e se a ativista assume o papel de representante de jovens defraudados pela falta de visão, a narrativa só é diferente na forma da que tem sido alimentada por Guterres quando posou dentro de água e assumiu o fracasso da sua geração.

Podem estar a exagerar e podemos ficar sentados à espera, mas tudo parece indicar que é má ideia. O problema está nas soluções e no tempo que vai avançando sem que haja sinais de que conter o aquecimento a 1,5ºC é algo exequível. Greta falou do conto de fadas do crescimento económico eterno, mas a questão não parece assim tão simples. Quando governos anunciam planos de milhões de euros para a neutralidade carbónica, o dinheiro vai ter de sair de algum lado.

Diminui-se o consumo – vaca, telemóveis, plástico, roupa, o que for – aceita-se o decrescimento económico como parte da solução para conter as emissões de CO2, mas como garantir rendimentos condignos, cumprir os objetivos de desenvolvimento, assegurar justiça social e pagar os próprios investimentos tecnológicos necessários para a transição para energias mais limpas e para a inovação e desenvolvimento em todas as outras áreas?

O clima já afeta a economia, como a saúde, mas clima e saúde em todas as políticas parece um princípio mais difícil de implementar do que a teoria.Terá de o ser, num esforço coletivo e sem guerras de gerações, pois os mais velhos e os mais pobres que menos consumiram também não é justo que paguem a fatura de uma menor proteção social e que verbas que poderão prover-lhes melhores condições de vida sejam desviadas para financiar carros elétricos e eólicas. O desafio é complexo e centrar a questão nas virtudes e defeitos de Greta é, como já muitos disseram, desviar do essencial. Trump dar-se ao luxo de ir gozar com uma miúda de 16 anos no Twitter, cavalgando num momento de fragilidade para desvalorizar mais uma vez o problema de fundo, mostra bem como estamos longe de uma solução.