Miguel Albuquerque foi o inequívoco vencedor das eleições regionais. Era o Miguel contra todos. E o Miguel ganhou. Sei que a esquerda há muito esqueceu aquele princípio básico da democracia de que quem tem mais votos ganha e governa. Portanto, podem repetir comigo: é uma vitória do PSD, é uma vitória, é uma vitória.
O PSD ganha ânimo e estes resultados devem ajudar-nos a interpretar a realidade. Não a realidade toda, como é evidente, mas uma parte importante dela. Há repetições de comportamentos que podem levantar o véu sobre tendências. E essas tendências impactam a leitura política nacional. Há cinco lições que podemos reter da Madeira.
Lição número um: a reorganização do espaço político.
Não sendo bipartidária, a política portuguesa está crescentemente bipolarizada. Há dois grandes blocos eleitorais: o centro direita, liderado pelo PSD, e a esquerda, capitaneada pelo PS. Nem a profusão de pequenos partidos nem o comportamento eleitoral dos outros, mais ou menos estabelecidos, altera o padrão: a política portuguesa está partida ao meio.
Governa a esquerda ou o centro direita de acordo com o somatório de votos de um lado ou de outro da trincheira. Antecipo que as maiorias absolutas de um só partido serão tendencialmente mais raras. Mais: uma das consequências de longo prazo na política portuguesa que resulta do arranjo assinado por António Costa em 2015, no qual um partido vencedor, mas minoritário, só encontra condições para governar legitimamente se o seu lado do espetro ideológico for maioritário.
Lição número dois: CDU é o parente pobre da geringonça. Derrota nas autárquicas. Derrota nas europeias. Derrota nas regionais. Três em linha para Jerónimo de Sousa. A CDU é a grande perdedora do frentismo parlamentar. Como não é ator de profissão, como Catarina Martins, o secretário-geral do PC é quem mais perde com o teatro de sombras alimentado permanente pelas esquerdas. Foi apanhado na armadilha do paradoxo: estar com o PS às segundas, quartas e sextas na “viragem da página da austeridade”, e de braço dado com o governo às terças, quintas e sábados nas cativações e degradação dos serviços públicos.
A erosão do PCP é uma tendência confirmada pelos resultados que, ou muito me engano, vão repetir-se em outubro. Curiosamente, Jerónimo de Sousa já sentiu necessidade de negar a renovação de apoio parlamentar a um governo PS. Mas se há coisa que nos apercebemos nos últimos quatro anos é que a palavra do PC nesta matéria vale tanto como os seus resultados eleitorais: muito pouco.
Lição número três: adeus aos extremistas fofos. Uma das boas notícias da Madeira é que o Bloco de Esquerda sofreu, como diria Catarina da Martins, da síndrome de barragem: evaporou-se. Perdeu os dois mandatos conseguidos em 2015 e não consegue ter representação no Parlamento regional. A Madeira deu um pontapé na extrema-esquerda – e talvez Costa apreciasse gentileza semelhante por parte do eleitorado do continente. Não creio, contudo, que o BE seja penalizado na mesma ordem de grandeza. Mas atenção: se os últimos dias de campanha trouxerem uma aproximação do PSD ao PS, o BE vai ser muito apertado.
Houve mais boas notícias: o PAN não existe; o PTP de José Manuel Coelho desapareceu; os populistas do JPP, que no continente serviram de barriga de aluguer a vários movimentos xenófobos e demagógicos, viram a sua representação cair de 5 para 3 deputados. O princípio do fim?
Lição número quatro: não há direitos naturais de governo. Quando nos aproximamos de eleições é sempre assim. Instala-se a ideia de que, independentemente da vontade expressa pelos portugueses em eleições, o PS é o vencedor. Quem não se lembra das legislativas de 2015, quando Passos Coelho era dado como acabado a um mês das eleições? Na Madeira, a dada altura, Miguel Albuquerque também foi posto fora de jogo. A vitória do PS seria uma inevitabilidade e aos eleitores caberia apenas carimbar nas urnas esse caminho pré-determinado. Pois bem: a Madeira voltou a mostrar que quem manda são os madeirenses e os seus votos contados.
Mais: ao contrário do que muitos gostariam, o PS não tem um direito sobrenatural para governar, quer ganhe ou perca. O PS não é o Estado – embora tente. O PS não é dono do regime – embora gostasse. Os portugueses não vão deixar que o PS subverta perpetuamente os resultados eleitorais.
Lição número cinco: o poder de uma AD. Não deixa de ser surpreendente que até aqui o principal partido da oposição ao PSD na Madeira fosse o CDS. Os resultados mostram que os madeirenses querem que o centro-direita se ponha de acordo na governação do arquipélago e empurram o CDS para a esfera do poder. E eu pergunto: num ambiente político e intelectual de supremacia da esquerda, e sabendo que o método de Hondt favorece as coligações, que resultado poderia ter tido uma AD regional? Como há muito aqui venho dizendo, Assunção Cristas e Rui Rio deveriam ter refletido seriamente sobre este assunto a nível nacional. Agora é tarde. Mas não é tarde para a mobilização maciça do eleitorado centro-direita nas próximas eleições legislativas.
Última nota: os principais cargos executivos no plano nacional estão a ser disputados por ex-autarcas. Miguel Albuquerque contra Paulo Cafofo (Funchal); Rui Rio (Porto) contra António Costa (Lisboa). Uma prova de como o perfil de autarca é dos que mais prepara o homem político para as funções executivas.
Presidente da Câmara de Cascais.
Escreve à quarta-feira