Ana Pedrosa-Augusto entrou na política há menos de um ano e defende que são precisas ideias novas “num país que é avesso à mudança”. A advogada foi convidada para integrar as listas às legislativas, mas prefere não dar ainda esse passo. “A minha profissão é aquilo que me dá brilho nos olhos”, diz.
Já tinha tido alguma atividade política antes de se juntar ao Aliança?
Zero. Nenhuma.
Como surgiu o convite para vice-presidente do Aliança?
Senti que estava na hora de participar num projeto em que me enquadrasse. Há uma tentativa de limitar a iniciativa privada e isso é algo que me transtorna muito. Não é esse o caminho que devemos seguir.
Identificava-se com algum dos partidos em atividade?
Não. Não me sentia representada politicamente. Não me identificava com nenhum partido.
Pesou na sua decisão o facto de o Aliança ser um partido novo?
É muito importante ser um partido novo porque é a única forma de trazermos algo diferente e com ideias novas. Faz falta um olhar fresco sobre as coisas.
Mas, ao contrário do que aconteceu noutros países europeus, os partidos tradicionais continuam a dominar…
Somos um país muito avesso à mudança e com muita dificuldade em perceber que, às vezes, é preciso acordar e fazer algo novo e diferente, mas credível e sério.
Tinha uma ideia negativa dos políticos antes de entrar para o Aliança?
Quem está fora da política tem, invariavelmente, uma ideia negativa dos políticos. Estes meses mostraram-me que fazer política é extremamente difícil. Temos uma postura séria, olhamos para as coisas e fazemos propostas credíveis. Isso dá muito trabalho. No Aliança, todas as pessoas têm a sua atividade profissional e, de repente, estamos a pensar um modelo de país. Isso não é simples. Estamos a falar de pessoas que têm as suas vidas e que encaram isto como uma missão. Só posso louvar as centenas de pessoas que todos os dias trabalham e vão para a rua para dar a conhecer o Aliança, apenas e só pela força de lutar por aquilo em que acreditam. Não temos mais nada a oferecer do que os nossos valores. Contamos apenas com a vontade, sonho e disponibilidade de cada um.
Olha hoje para a classe política de uma forma diferente?
Esta experiência serviu para ter uma ideia do trabalho que é preciso ter e da estrutura que isso implica. Tenho hoje um respeito renovado pela classe política. O que condeno é o distanciamento que a classe política acaba por ter em relação à população que representa. É preciso estar ligado às pessoas e isso não é possível se estivermos fechados num gabinete partidário.
Gostaria de ser deputada?
O partido honrou-me com esse convite, mas não sou candidata. Sou advogada e a minha profissão é aquilo que me dá brilho nos olhos. É aquilo que me dá vontade de acordar todos os dias e sinto que faço bem o meu trabalho.
E ser deputada não a entusiasma?
Ser deputado é exigente. É um cargo em que tem de se ser excelente e ainda não tenho essa experiência e conhecimento. Não seria, hoje, a melhor pessoa para essa função, que tem uma dignidade imensa. Estar naquela casa a analisar e a debater o futuro de cada um de nós deve ser um trabalho muito apelativo.
Ficou desiludida com o resultado do Aliança nas europeias?
Somos otimistas, mas somos realistas. Apostamos no mérito e isso é algo que esperamos que os eleitores percebam. Queremos as melhores pessoas para cada momento. Não basta ter uma cara conhecida ou alguém que aparece a fazer comentários sobre futebol. Levamos isso muito a sério.
Contam eleger deputados nas eleições legislativas?
Temos a expetativa de eleger um grupo parlamentar. E aí queremos ser a voz do que ouvimos tanta vez na rua. As pessoas dizem-nos: “Sejam a nossa voz, sejam vocês a voz da oposição”.
A oposição da direita tem sido fraca?
Chamar-lhe oposição é algo muito difícil. Dizem que a esquerda ocupou o discurso da direita, mas não vejo isso dessa forma. O que existe é uma esquerda que quer implementar uma moral e uma forma de estar que não representam a maioria dos portugueses, mas este Governo entendeu ceder nessa frente para conseguir governar. E temos uma direita que não consegue assumir-se e que tem muito medo. Tenho a sensação que passam mais tempo a discutir o seu quintal do que os problemas do país. Não diz aquilo que é preciso dizer sem medos.
Onde vê o medo da direita?
Parece que têm medo de dizer às pessoas aquilo que pensam. Nós não temos medo de dizer aquilo que somos e aquilo que achamos que deve ser um país a sério. Temos medidas que se preocupam com as pessoas e com aquilo que é viver com dignidade neste país. Viver com acesso à saúde, à educação, à justiça…
Isso é o que querem todos os partidos…
Há uma diferença entre esquerda e direita. A esquerda tem uma perspetiva de nivelar por baixo. Não se preocupa com o rigor, a ambição, a excelência, o crescimento… A direita, que não se assume como direita, não sabe bem onde vai. Tem medo de dizer que é liberal e vive presa ao passado. Nós não temos essas amarras.
Mas este Governo do PS com o apoio da esquerda parece ter a simpatia das pessoas. É por falta de alternativa que aparece à beira da maioria absoluta?
Poderá ter maioria absoluta. Temos um grave problema de abstenção. As pessoas já não querem saber e temos de mostrar que é preciso querer saber.
Tem receio de uma maioria absoluta do PS?
Honestamente, não sei se é pior uma maioria absoluta do Partido Socialista ou uma nova geringonça. Tenho muito medo de uma nova geringonça. Pessoalmente, acho que é pior uma nova geringonça. Tenho muito receio da imposição moral, da tentativa permanente de destruição de valor que tem esta extrema-esquerda que apoia o PS. Assusta-me muito ficar refém da extrema-esquerda.
A direita está a viver um momento difícil. Julga que ainda está a pagar pelas medidas de austeridade que aplicou no tempo da troika?
Há várias razões. A direita teve de implementar medidas de austeridade para sobrevivermos e está a ultrapassar uma crise de valores. Não soube dizer o que quer e continua sem saber. E também houve uma incapacidade da direita em unir-se em torno daquilo que é mais importante para o país.
O país foi confrontado com vários casos de corrupção. Até que ponto estes processos, que envolvem uma parte da elite política e financeira, afetam a vida política e a credibilidade do país?
Têm toda a influência. Infelizmente, temos uma justiça que é lenta. Temos megaprocessos que são praticamente ingeríveis. Demoram muito tempo e as pessoas acabam por ser julgadas na praça pública antes de haver um julgamento efetivo. E depois temos uma comunicação social que empola muito estes julgamentos em praça pública e as pessoas ouvem e dizem: “É tudo a mesma coisa, são todos corruptos”.
Mas quando se trata, por exemplo, de um ex-primeiro-ministro, é impossível ignorar…
Por isso é que a justiça tem de funcionar de forma célere. Tem de haver uma forma de a justiça ser rápida e eficaz. A morosidade da justiça é um dos piores problemas que temos em Portugal. É uma das razões de não existir mais investimento estrangeiro em Portugal.
O que não funciona?
Temos falta de recursos humanos e poucos meios de investigação. Temos de reconhecer que há um problema para, a seguir, encontrar as medidas para resolver esse problema. É preciso desburocratizar, simplificar, eliminar papel, eliminar recursos desnecessários e pouco eficientes. As taxas de justiça são muito elevadas, mesmo para processos que envolvam valores muito baixos.
Concorda com a ideia de que existe uma justiça para ricos e outra para pobres?
Isso é uma coisa fácil de dizer. Quem menos tem depende daquilo que o Estado lhe faculta. Quem tem mais pode pagar um atendimento privado. Nós somos liberais, mas o Estado tem de ser forte para proteger os fracos.
Mas o Aliança quer um Estado mais pequeno?
Tem de ser muito mais pequeno. Não somos a favor, por exemplo, de manuais gratuitos para todos. Há pessoas que podem pagar. Acho curioso que o PCP queira creches gratuitas para todos. Como é que um partido de esquerda consegue dizer que os ricos não têm de pagar a creche? Temos de ter um Estado que protege quem precisa. É aí que o Estado tem de ser forte. As pessoas conseguem fazer a sua vida mas, para isso, têm de ser livres. É preciso deixar as pessoas respirarem. A educação tem de ser excelente, mas passamos a vida a nivelar por baixo. Precisamos de pessoas que queiram ser as melhores e isso é algo que não é incutido na escola. A escola serve para os professores estarem afundados em burocracia e são obrigados a esquecer aquele que é o seu papel fundamental. A escola tem de ser o elevador social.
Ser advogada da cantora Madonna tem influenciado a sua vida profissional?
Não.
Conhece pessoalmente a Madonna?
Não falo de clientes. É tema tabu.