A demissão da ministra do Trabalho e Pensões, Amber Rudd, foi mais um golpe para o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson – deixando o Governo em estado de alerta quanto a novas demissões. “Já não acredito que sair [da União Europeia] com um acordo seja o principal objetivo do Governo”, lia-se na carta de demissão de Rudd – considerada a mais influente opositora de uma saída sem acordo dentro do Executivo.
Esta decisão surge dias depois de 21 deputados terem sido expulsos do grupo parlamentar conservador por terem votado contra um Brexit sem acordo, considerando essa atitude como “um assalto à decência e à democracia” e “um ato de vandalismo político”. “Não posso ficar passiva quando conservadores bons, leais e moderados são expulsos”, escreveu a ex-ministra no Twitter.
Rudd sobreviveu à “limpeza” de vozes críticas do Brexit em julho, quando Johnson tomou a liderança dos conservadores. Comprometera-se a aceitar uma saída da UE a 31 de outubro – na esperança de que fosse possível chegar, entretanto, a um acordo. Agora, a ex-ministra afirmou à BBC que “não há nenhum indício de um acordo nem nenhuma negociação formal a decorrer”. E as críticas não ficam por aqui. Rudd revelou também que “80% a 90% do tempo da governação destina-se a preparar uma saída sem acordo”. Um cenário que, ainda a semana passada, foi chamado pelo Parlamento britânico.
Entretanto, o Governo já assumiu que planeia “testar ao limite” a nova lei, desafiando-a em tribunal, segundo afirmou o ministro dos Negócios Estrangeiros, Dominic Raab, em entrevista à Sky News.
Ainda no dia anterior às declarações de Raab, o antigo procurador-geral Ken Macdonald, disse à mesma estação televisiva que, se advogados de Boris tentassem manipular a formulação da lei que proíbe uma saída não negociada, dificilmente teriam sucesso, uma vez que “é bastante clara” – reiterando que “a lei é a lei”. Macdonald notou que, se o primeiro-ministro não pedir um adiamento do Brexit a Bruxelas após ser ordenado a tal pela justiça, poderá ser condenado por “desrespeito ao tribunal” – um crime que pode levar à sua detenção.
Na semana passada, Boris assegurou que preferia “estar morto numa vala” do que pedir um adiamento do prazo limite da saída da UE. Caso o Governo não consiga negociar um acordo de saída – um cenário cada vez mais provável – o adiamento terá de ser pedido a 17 ou 18 de outubro, altura em que vão estar reunidos os líderes europeus, que terão de aceitar o pedido. Algo que não pode ser dado como certo, devido à crescente exasperação de vários Estados membros, que poderão vetar o adiamento. “Não vamos fazer isto a cada três meses”, avisou o ministro dos Negócios Estrangeiros francês, Jean-Yves Le Drian.
Disputas internas Sobre as expulsões e demissões de dirigentes conservadores – sobretudo da ala moderada do partido – Raab considerou que “o primeiro-ministro estava certo em restaurar alguma disciplina”. Já o ministro da Saúde e Serviços Sociais, Matt Hancock – politicamente alinhado com Rudd -, escreveu no Twitter que “o Partido Conservador sempre foi um partido aberto, moldado por quem está dentro dele”, pedindo a outros dissidentes que “fiquem e lutem”.
Contudo, mantém-se a especulação de que outros possam seguir o exemplo de Rudd, como o responsável do Governo para a Irlanda do Norte, Julian Smith, ou o ministro da Justiça, Robert Buckland – que avisou Johnson para cumprir com a lei que proíbe uma saída não acordada.
Entre expulsões e demissões, o Governo conservador parece estar a ser limpo de vozes críticas, e preenchido por apoiantes da estratégia de Johnson quanto ao Brexit. “Muitos tipos novos e ambiciosos já estão a mandar sms”, disse uma fonte no Governo à ITV, após a demissão de Rudd. Entretanto, a ministra acabou por ser rapidamente substituída pela deputada Thérèse Coffey.