Como todos os anos acontece, o Sporting homenageia a sua maior linha avançada de todos os tempos. Tavares da Silva, um dos primeiros mestres do jornalismo desportivo, chamou-lhe Cinco Violinos.
Os Cinco Violinos foram um cometa no céu do futebol em Portugal.
Surgiram no verão de 1946, com a entrada dos jovens Vasques e Travassos no Sporting.
Desapareceram no verão de 1949, com o abandono de Peyroteo.
A lenda ultrapassou em muito o seu tempo curto de vida comum.
Disputaram juntos 56 jogos: somente 56 jogos.
Dezasseis na sua primeira época: 1946-47.
Vinte na segunda: 1947-48.
Vinte na terceira: 1948-49.
Depois passaram a viver para sempre na aldeia branca da nossa memória.
Cândido de Oliveira, uma daquelas figura únicas do futebol e da sociedade portuguesa em diversas das suas vertentes, foi o homem que idealizou os Violinos: uma máquina de futebol de ataque preparada para servir o seu marcador de golos, Fernando Peyroteo.
Peyroteo tinha mais oito anos do que Vasques e Travassos; mais seis do que Jesus Correia; mais quatro do que Albano.
E, sobretudo, tinha mais nove épocas de futebol do que Vasques e Travassos; mais seis do que Jesus Correia e Albano.
Muito se escreveu sobre o abandono de Peyroteo, aos 31 anos.
Ele justificou-se com clareza no dia da sua despedida, em 5 de outubro de 1949, no decorrer de um encontro de homenagem frente ao Atlético de Madrid: “Fui soldado nas fileiras do desporto nacional e um soldado não foge ao cumprimento do seu dever, seja qual for e em que circunstâncias for! Mas, de hoje em diante, reconheço que sou um soldado velho…”
Em Espanha dedicaram-lhe um verbo: “peyrotear” – rematar à baliza com violência inaudita.
A lenda! Não foi por acaso que o Atlético de Madrid serviu de convidado para a despedida de Peyroteo. A lenda dos Cinco Violinos seria fortemente alimentada por um momento extraordinário vivido numa digressão a Espanha no início da época de 1948-49 que serviu como preparação para o início do campeonato nacional. Dois amigáveis em agenda: o primeiro em Madrid, frente ao Atlético, o segundo em Barcelona, frente ao Barcelona.
No dia 5 de setembro de 1948, no Estádio Metropolitano, Cândido de Oliveira faz alinhar o seguinte onze: Dores; Manuel Marques, Passos e Juvenal; Canário e Veríssimo; Jesus Correia, Vasques, Peyroteo, Travassos e Albano.
O Atlético de Madrid fora o terceiro classificado do campeonato espanhol da época anterior, logo atrás de Barcelona e Valência. Mas não podia contar ainda com a sua nova estrela, Ben Barek. Os Cinco Violinos atingiram a excelência.
Nove minutos, 0-1: Peyroteo lança Jesus Correia em velocidade, este isola-se frente ao guarda-redes Domingo e faz o golo com facilidade.
Vinte minutos, 0-2: Peyroteo tem uma arrancada desde o seu meio-campo e, já junto à área madrilena, toca para Jesus Correia fazer o golo com um remate colocado.
Trinta e dois minutos, 0-3: série de tabelinhas entre Peyroteo e Jesus Correia e este a concluir com um remate forte.
Trinta e quatro minutos, 0-4: Albano lança Jesus Correia para novo sprint imparável até ao golo.
Ao intervalo, Travassos, meio combalido, dá lugar a Martins, que vai tomar a posição de ponta esquerda, ficando Albano como interior esquerdo.
Quarenta e nove minutos, 0-5: Jesus Correia em recarga a um remate de Peyroteo.
Sessenta e sete minutos, 0-6: dribles sucessivos de Vasques por entre os defesas espanhóis e passe para Jesus Correia concluir.
Setenta e dois minutos. 1-6, por Escudero.
Setenta e três minutos: 2-6, por Escudero.
Oitenta e nove minutos: 3-6, por Vidal.
Seis golos de Jesus Correia – seis!!!
O público madrileno está rendido: dedica à equipa do Sporting uma ovação entusiástica.
O jogo de Madrid ficou para o imaginário nacional. E para a lenda!
Cândido de Oliveira, modesto: “Não fizemos uma exibição excecional. Mas a velocidade dos atacantes do Sporting baralhou por completo a defesa do Atlético”. À distância, os adeptos de futebol em Portugal desenharam mentalmente a extraordinária exibição dos leões.