Os filhos da troika e adeptos do bota-abaixo estão activos. Reclamam primeiro e vergastam depois. São os “bolcheviques de direita”, arautos da contra-revolução. Agora estão na fase do reclamar. Mas se o actual Governo cedesse e desatasse os cordões à bolsa, eles não deixariam de o vergastar entoando a velha cantilena da bancarrota, do precipício financeiro causado pelas mãos largas do “esquerdalho” sempre que está no poder. Ouvem-se, então, as mesmas melodias: quer a do velho, o rapaz e o burro, quer a do preso por ter cão e preso por não ter.
Há dias, uma estatística dada à estampa no Público era cristalina: “Ausências por greve na Saúde: Costa mais castigado do que Passos em ano de eleições”. A prova: “Até Maio, as ausências por greve equivaleram a 72 mil dias de trabalho perdidos. No mesmo período de 2015, com Passos no governo, a contabilidade estava em pouco mais de 38 mil dias”. Significativo, não acham?! Tudo isto faz parte de uma ideia que os bolcheviques de direita, filhos da troika, têm espalhado, que é a de que Portugal está mergulhado no desespero e no caos. Andam os portugueses a arrancar os cabelos por todo o lado e só a direita pode curá-los!
Atente-se na ofensiva sindical conjunta no sector público da saúde, abertamente apadrinhada pelas ordens dos Médicos e dos Enfermeiros, mas promovida, claro!, pelos sindicatos de ambas as profissões. Palpita-me estarmos perante um conluio objectivo (e porventura subjectivo) entre o bastonário dos médicos, o muito zeloso esculápio Miguel Guimarães, cuja militância contra a ministra da Saúde é deveras estranha, e a empolgante bastonária dos enfermeiros, a militante e ex-dirigente do PPD-PSD Ana Rita Cavaco. “Yo no creo en brujas pero que las hay las hay”! E com que propósito? Na minha modesta opinião, parece-me só poder ser nova tentativa para debilitar e desacreditar o Serviço Nacional de Saúde (SNS), em benefício das grandes corporações privadas que lucram com o negócio da doença, o qual, como em tempos salientou publicamente uma tal Isabel Vaz – então e agora gestora de uma dessas corporações – só é superado em rentabilidade pelo negócio da venda de armas, extremamente útil para fazer a guerra, mas peso morto numa economia civil. Só que as guerras também precisam muito de hospitais!
O contraste patente na notícia do Público acima citada – atestando que o primeiro-ministro António Costa tem sido muito mais castigado com greves em 2019, ano de eleições, do que foi o primeiro-ministro Passos Coelho em 2015, também ano de eleições – é assim um tributo que a cobardia política dos sindicatos presta às virtudes políticas da actual fórmula de Governo. Afigura-se-me, aliás, que o zeloso esculápio Miguel Guimarães e a inefável enfermeira Ana Rita Cavaco estão hoje, em relação à direita que os aplaude, tal como o petulante professor Mário Nogueira está hoje para o PCP mais ortodoxo e vetusto. Os sindicatos de esquerda (vou usar o sentido figurado) que estão mais próximos do PCP, nomeadamente a Fenprof, também se portaram mais mansamente durante a “governança” da direita e da troika do que durante a governação da “geringonça” – como a direita gosta de lhe chamar, indelicada e estupidamente, a meu ver. Mas receio bem que haja no PCP quem admita que o eventual regresso da direita ao poder pudesse ser propício ao recobro de militantes e eleitores dum partido tão depauperado.
Uma dúvida germina, todavia, na minha mente: será que os sindicatos, tanto os encostados à direita como os encostados à esquerda, estão mesmo convencidos de que, se as direitas de Rui Rio e Assunção Cristas conseguissem regressar ao poder, dariam satisfação plena e imediata às reivindicações mais afoitas, directa ou indirectamente relacionadas com salários, que têm feito ao actual Governo?! Atente-se ao menos no que disseram os jornais acerca das promessas de Rui Rio. Cito o i, por exemplo: “PSD. Rui Rio quer reduzir a carga fiscal em 3,7 mil milhões (de euros) até 2023. A redução de impostos está na lista das promessas, mas Rui Rio não explicou como. Só se sabe que será no IRC e no IRS”. De facto, o chefe do PPD-PSD foi, algo contraditoriamente, assaz subtil: “Assumo o compromisso não de baixar impostos, mas de reduzir a carga fiscal”. Como Rui Rio também tenciona aumentar a despesa com um investimento público de mais 3,6 mil milhões até ao ano 2023, digamos que são cerca de 7,3 mil milhões a menos para satisfazer as exigências reclamadas por médicos, enfermeiros, professores, polícias, bombeiros e muito outro pessoal mais! Só os juízes é que já estão felizes!
E novas de Assunção Cristas, política virago tão atreita a excessos e irrisões? Está, ao que se sabe, a percorrer as capelinhas todas (distritais) do seu partido, com o louvável propósito de preparar quer a campanha eleitoral, quer o programa que o CDS-PP submeterá ao eleitorado no dia 6 de Outubro. Ainda não há data marcada para a apresentação do programa, que até poderá beneficiar do conhecimento do programa do PPD-PSD. O povo aguarda, ansioso. Eu, nem por isso!
Para concluir esta crónica: é uma evidência que a direita nunca se conformou com a criação do SNS, há 40 anos. Recordo que o projecto de lei apresentado pelo PS sobre as Bases Gerais do Serviço Nacional de Saúde – do qual foram proponentes António Arnaut, Mário Soares e Salgado Zenha – “foi aprovado” pela Assembleia da República, em 19 de Setembro de 1979, “com os votos a favor do PS, do PCP, da UDP e do deputado independente Brás Pinto, e com os votos contra do PSD, do CDS e dos deputados independentes sociais-democratas”. Eis um facto curioso, no final de 2015: Marcelo Rebelo de Sousa, certamente atacado por momentâneo lapso de memória, não hesitou em afirmar, em público, que ele e o seu partido, o PPD-PSD, apoiaram sempre o SNS. Claro que não é verdade! Mas é por isso que nunca será demais recordar quem votou a favor e quem votou contra o SNS…
Escreve sem adopção das regras do acordo ortográfico de 1990