Paulo Preto, ex-diretor da empresa estatal brasileira que gere as estradas de São Paulo e arguido da Lava Jato, terá tentado fintar as autoridades quanto à sua fortuna, acumulada no Panamá, transferindo 3,7 milhões de euros para uma conta em Lisboa – que está em nome de Santoro Sociedade de Advogados.
Apesar de conhecido no Brasil como Paulo Preto, Paulo Vieira de Souza é o nome deste engenheiro civil, atualmente preso por crimes de natureza económica e contra o qual foi deduzida nos últimos dias uma acusação que acaba por revelar movimentações financeiras de dinheiro alegadamente sujo para um banco português.
Na acusação a que o i teve acesso, Paulo Preto é acusado de cinco crimes de lavagem de dinheiro, por este, em 2016, ter ajudado a ocultar dinheiro que era proveniente de subornos pagos para que a Petrobras adjudicasse serviços a uma construtora brasileira, a UTC – que fazia parte do alegado cartel formado pelas maiores empreiteiras do país. Paulo Preto, conhecido pela proximidade ao partido PSDB e por ter sido intermediário de subornos a grandes figuras deste partido, fez uma transferência de 400 mil dólares de uma conta que tinha na Suíça em nome de uma offshore sediada no Panamá, para uma conta em Hong Kong de Wu-Yu Sheng, também intermediário de luvas no Brasil, com ligações a um outro intermediário, Rodrigo Tacla Duran, que atuava do lado das empresas construtoras.
Esse dinheiro que Paulo Preto fez chegar a uma conta no exterior acabou por ser entregue em notas de real no Brasil ao próprio Paulo Preto, vindos de quem os recebeu, ou seja de Wu-Yu Sheng.
“A partir dessas condutas, Paulo Vieira de Souza realizou uma operação de lavagem de dinheiro por intermédio da tipologia de “dólar-cabo invertido”. Valendo-se dos operadores financeiros Rodrigo Tacla Duran e Wu-Yu Sheng e de contas bancárias em nome de empresas offshores, Paulo Vieira de Souza transferiu US$ 400 mil dólares de dinheiro ilícito que mantinha no exterior e recebeu o montante equivalente em espécie (reais) no Brasil”, refere a acusação.
Punha o dinheiro ao sol Mas se desta vez foi Paulo Preto a receber o dinheiro em cash, por norma era ele quem avançava com as notas. O papel de Rodrigo Tecla Duran para a UTC era arranjar dinheiro em notas para que a empresa pudesse pagar os seus subornos – isto porque o dinheiro sobrefaturado à Petrobras para pagamento de ‘luvas’ tinha de seguir um caminho aparentemente normal. Segundo contaram alguns arguidos que abriram o jogo e colaboraram com as autoridades, Paulo Preto tinha uma casa em São Paulo só para guardar notas. E até lhe dava jeito despachar as notas e depois receber através de um esquema numa conta do estrangeiro: “Paulo Vieira de Souza, de posse de tamanha quantia de dinheiro em espécie e a fim de se proteger de possíveis investigações, buscava remeter esses valores, ao largo do controle das autoridades, para o exterior. Para tanto, disponibilizava dinheiro em espécie a operadores financeiros no Brasil em troca de receber os valores correspondentes no exterior (operações dólar cabo), entre os quais merece destaque Rodrigo Tacla Duran”.
Era tanto o dinheiro que Paulo Preto tinha de o pôr a apanhar sol de vez em quando para que não ficasse com bolor.
Os funcionários de uma empresa de um dos arguidos que colaborou com a justiça terão mesmo contado que “havia um quarto inteiro cheio de dinheiro, e que por vezes testemunharam Paulo Vieira de Souza colocar notas para tomar sol, a fim de evitar que embolorassem”.
Conexão Panamá Lisboa O Ministério Público Federal do Paraná, Brasil, explica que segundo as autoridades suíças em agosto de 2017 Paulo Preto tinha naquele país quatro contas bancárias, cujo saldo era em 2016 de 35 milhões de francos suíços, perto de 32 milhões de euros. Mas assim que soube que estava a ser alvo de uma investigação, o suspeito decidiu fechar todas as contas e enviar o dinheiro para as Bahamas, país que acabou por informar o Brasil sobre as movimentações que se seguiram.
“O que mais chamou atenção na documentação da nova conta aberta em favor de Paulo Vieira de Souza nas Bahamas, contudo, não diz respeito à tentativa de ocultação de sua identidade no controle da conta, mas das transferências internacionais de valores expressivos que a partir dela foram realizadas nos anos de 2017, 2018 e 2019, as quais indicam novas e muito recentes investidas do acusado no sentido de dissipar o seu património ilícito”, refere o MP brasileiro.
As transações, referem os investigadores, “denotam que, mesmo após ter pleno conhecimento de que estava sendo investigado no Brasil pelos ativos ilícitos que mantinha no exterior em nome da offshore Groupe Nantes, Paulo Vieira de Souza buscou dissipar ao menos 2 milhões de dólares e 3,7 milhões de euros, transferindo os valores em dólares para contas em nomes de offshores cujos controladores ainda são desconhecidos e os montantes em euros para escritório de que faz parte um de seus advogados”.
É este último montante que liga Paulo Preto a Portugal: “Em relação às transferências efetuadas em 23/03/2018, 25/05/2018 e 17/01/2019, para o escritório Santoro Sociedade de Advogados, em Lisboa, chama atenção não apenas as datas e circunstâncias em que foram efetuadas (quando Paulo Vieira de Souza já estava sendo investigado em diversos procedimentos), mas também expressivo valor de 3,7 milhões de euros das transferências e o facto de terem sido justificadas, conforme constou nos respetivos swifts (‘loan’), como se fossem empréstimos.”
O MP não acusou para já Rodrigo Tacla Duran e Wu-Yu Sheng, uma vez que ambos se encontram no estrangeiro (o primeiro foragido em Espanha), dado que isso atrasaria o processo, que tem de ser urgente, dado que Paulo Preto se encontra em prisão preventiva.