A laracha pode ter algo de xenófobo, mas esteve na berra, nos últimos dias, um pouco por toda a Inglaterra, onde se disputa, neste momento, o Campeonato do Mundo de Críquete: “Não sei o que aconteceu, mas é impossível apanhar um táxi!”
Claro que o enorme número de condutores de táxis naturais da Índia, do Paquistão ou do Bangladeche não ficaram indiferentes aos últimos confrontos da competição, sobretudo ao Índia-Paquistão do último domingo, que levou a Old Trafford, em Manchester, cerca de 75 mil pessoas e espalhou pelas ruas das cidades inglesas milhares e milhares de indianos (houve quem falasse num milhão) e paquistaneses que se penduraram até nos postes de iluminação dos lugares onde pudessem espreitar os ecrãs através dos quais o jogo foi transmitido. Aliás, convém não esquecer que há cerca de 900 mil indianos (recenseados) no Reino Unido – de longe, a maior comunidade estrangeira do país –, cerca de 600 mil paquistaneses e cerca de 250 mil bengalis. E, já agora, que serão certamente os indianos e os paquistaneses aqueles que vivem mais intensamente, a roçar o fanatismo, esse estranho jogo cujas regras são para muitos de nós praticamente incompreensíveis. Falo por mim que, um determinado dia, algures na Índia, talvez em Jaisalmer, pedi a um rapazinho para se sentar a meu lado e me explicar o que ia sucedendo em mais um desses escaldantes dérbis indo-paquistaneses, transmitido em direto num aparelho decrépito, tendo ficado a ouvir os ensinamentos do moço, não direi como boi olhando para um palácio mas, vá lá, como uma vaca sagrada especada em frente aoTaj Mahal.
A índia entrou em euforia com a vitória por 89 runs, segundo o método Duckworth-Lewis-Stern (DLS), uma fórmula matemática inventada especialmente para calcular o resultado da equipa batedora naquilo a que os ingleses chamam limited overs cricket, interrompido pelo estado do tempo ou por quaisquer outras circunstâncias. Para os leigos como eu, diria que se trata basicamente de um jogo que pode durar um dia inteiro, algo não assim tão pouco vulgar quando falamos de críquete, esse desporto cujas origens remontam ao ano de 1566 e que tem dois objetivos: o primeiro é a defesa eliminar os dez wickets adversários, sendo os wickets aqueles três pauzinhos com um travessão em cima que têm em sua proteção um batedor com a função de impedir a bola de couro de os atingir; segundo, o ataque tenta obter o maior número possível de runs, sendo os runs uma unidade que define pontuação e faz com que o batedor e o não batedor corram no terreno, cruzando-se e tentando chegar primeiro ao outro lado do campo antes de os jogadores de campo recolherem a bola. Confuso. Vão dizer isso aos adeptos dos dez países que, entre o passado 30 de maio e o próximo 14 de julho, disputam este Mundial, sendo a Inglaterra o único representante europeu e as Índias Ocidentais o outro único participante que não vem lá dos confins orientais do mundo. Neste momento, Nova Zelândia,Austrália, Inglaterra e Índia estão nos quatro primeiros lugares, que dão acesso às meias-finais.
Com a final marcada para esse 14 de julho no Lord’s Cricket Ground, em Londres, admite-se que os táxis em Inglaterra continuem a escassear. E pode ser que, finalmente, a Inglaterra consiga o tão ambicionado título, que nunca conquistou desde que os campeonatos do Mundo tiveram início, em 1975, contrariando o favoritismo da Austrália, a maior açambarcadora de troféus (cinco) ou o entusiasmo dos indianos, que olham para Rohit Sharma, Virat Kohli, Vijay Shankar, Bhuvneswhar Kumar, Yuzvendra Chahal ou Hardik Pandya como os adeptos de futebol olham para Lionel Messi ou Cristiano Ronaldo. Afinal, há mais de 1390 milhões de potenciais adeptos de críquete na Índia. Mais supporters, é impossível. Por isso gritam em uníssono: “Hindustani Zindabad!” Longa vida para a Índia.