As recentes eleições para o Parlamento Europeu trouxeram-nos ainda mais alertas sobre o afastamento contínuo dos nossos cidadãos da sua classe política. Praticamente 70% de abstenção e 200 mil votos brancos ou nulos! Votos brancos ou nulos que são, na sua maioria, votos de profundo protesto pela baixa qualidade da nossa democracia e da nossa classe política.
Vivemos a consequência de os nossos políticos não se concentrarem verdadeiramente na defesa dos interesses dos cidadãos. Se se interessassem, não teríamos passado pela tragédia político-bancária que continua a afetar-nos e que foi a causa de problemas em dez bancos, que apresentaram perdas acumuladas de 46 000M€! Perdas bastante suportadas pelo Estado, ou seja, pelos contribuintes (21 000M€), pelo Fundo de Resolução e depositantes (8500M€), pelos obrigacionistas e pelos acionistas (13 800M€). Um escândalo!
Nesta coluna, já referi anteriormente a situação gravosa das PPP e o enorme impacto da instalação no Sistema Elétrico Nacional de 5600MW de fontes de produção eólica intermitentes ou variáveis, com tarifas muito generosas e em que toda a energia produzida é paga (seja necessária ou não!). Tenho de repetir que esse grande erro económico foi responsável pelo aumento, em cinco anos, do défice tarifário de 1900M€ em 2009 para 5000M€ em 2014. Isto, apesar de, no mesmo período, os custos de interesse económico geral (que nome!) que pagamos na conta da eletricidade terem passado de 500M€ para 2500M€!! Estão os leitores a ver como, apesar de sermos pobres, os políticos nos tratam como se tivéssemos muitíssimo dinheiro?
Peço a todos os leitores que não deixem de ler a carta de demissão de Luís Campos e Cunha de ministro das Finanças, enviada a José Sócrates em 2005. Luís Campos e Cunha, pessoa e profissional de enorme retidão, relata detalhadamente as razões da sua demissão, apontando erros gravíssimos de governação que, não tinha dúvidas, iriam afetar muito negativamente os portugueses. Essa carta mais não faz do que deixar claros os danos que a classe política à época incutiu nos cidadãos, afetando-os negativamente durante décadas.
A sociedade civil portuguesa tem de estar muito descontente com a forma como a Assembleia da República trata de todos estes assuntos e não impede, de uma vez por todas, as negociatas da classe política que, a cada dia que passa, mais enchem de notícias a comunicação social.
Voltando à noite eleitoral, considero que já era tempo de os nossos políticos perceberem que, se há mais de 20 anos foi feita uma revisão constitucional para permitir a introdução de círculos uninominais (em que apenas o candidato mais votado é eleito) na Lei Eleitoral da Assembleia da República, esta reforma já devia há muito ter sido implementada. Estou certo de que a sociedade civil quer esta importante alteração.
Continuo a pensar que os partidos políticos que publicamente anunciarem e apoiarem a remodelação da lei eleitoral tal como menciono neste artigo serão de imediato beneficiados pelos seus resultados eleitorais.
Que esperam o CDS e o PSD para apoiarem a reforma eleitoral prevista na revisão constitucional de 1997? Assunção Cristas prometeu-me em 2017 uma reunião com os promotores do “Manifesto: Por Uma Democracia de Qualidade” que esteve na base da petição que também abaixo descrevo – reunião essa que ainda não se realizou.
O que espera também o PS para apoiar esta reforma já pensada há mais de 20 anos? O PS que até a colocou no seu programa de governo sufragado em 2015! Essa reforma estava no programa do Governo só para português ver? Ou foi Catarina Martins que impediu o PS de continuar a elaborar sobre o assunto?
Será que teremos de esperar pelo aparecimento de novos partidos que apoiem uma reforma do sistema eleitoral para que este seja discutido profundamente e alterado na nossa Assembleia da República? Há claros indícios de que assim será se os partidos atualmente com assento parlamentar não apoiarem esta reforma.
No rescaldo eleitoral, o CDS e o PSD disseram que muito tinha de mudar. Estou de acordo, vamos ver se percebem o impacto da vertente da reforma eleitoral na reabilitação dos seus partidos.
Alerto os leitores para o facto de o nosso sistema eleitoral para a Assembleia da República ser retrógrado, antidemocrático e, simultaneamente, excelente para que no Parlamento apenas sejam discutidos os assuntos da conveniência dos diretórios partidários. Por isso estamos como estamos.
Vivemos atualmente, contudo, momentos de enorme importância para o desen-volvimento da nossa democracia porque, graças ao grande empenho de José Ribeiro e Castro e de uma equipa de motivados juristas, foi possível elaborar a Petição à Assembleia da República “Legislar o Poder de os Cidadãos Escolherem e Elegerem os seus Deputados”. Essa proposta de projeto de lei apresentada propõe uma reforma profunda do sistema eleitoral e antevê, tal como a Constituição já prevê, a introdução de círculos uninominais como forma imprescindível de aproximar eleitos de eleitores. A petição já conta com mais de 7300 apoiantes.
Juntamente com a Sedes, a APDQ – Associação Por Uma Democracia de Qualidade elaborou uma proposta de grande relevo da reforma do sistema eleitoral, apontando para uma Assembleia da República com 105 deputados eleitos pelo mesmo número de círculos uninominais (em que é eleito só um deputado), 105 deputados eleitos por círculos regionais correspondentes aos distritos, 15 deputados eleitos num círculo nacional de compensação para garantir a proporcionalidade da representação parlamentar e quatro deputados eleitos pelos círculos da emigração – uma Assembleia da República com 229 deputados e um sistema eleitoral muito melhorado, tal como a nossa Constituição prevê há mais de 20 anos!
Continuo, por isso, a pedir aos leitores que ainda não o fizeram que assinem e divulguem esta importante petição através do link https://peticaopublica.com/pview.aspx?pi=voto-cidadania porque este é um movimento de grande interesse para a nossa sociedade civil, pelo impacto que pode ter na qualidade da nossa democracia.
Quaisquer dúvidas podem ser esclarecidas e ou debatidas através do email porumademocraciadequalidade@gmail.com