Com o anúncio dos resultados das eleições para o Parlamento Europeu começou em Bruxelas mais um episódio das chaises musicales. Por junto, é preciso encontrar quem se sente nas cadeiras de presidente do Conselho Europeu, Comissão, Parlamento e alto representante para a Política Externa, ocupadas actualmente por três homens e uma mulher, de um Estado médio-grande (Polónia), de um micro-Estado (Luxemburgo), e, em dobro, no PE e no cargo de alta representante, de um Estado grande (a Itália). De fora do quarteto-maravilha ficam o cargo de secretário-geral da NATO, cujo incumbente viu o mandato prorrogado por mais dois anos para evitar que a escolha contaminasse a pré-campanha presidencial nos EUA, e o cargo de presidente do Banco Central Europeu (que a sra. Merkel pretende separar dos cargos “políticos”, assim tornando mais fácil a escolha de um presidente alemão ou, no mínimo, assimilado).
Quando a música parar de tocar deverá haver um equilíbrio geográfico (com base nos quatro pontos cardeais), político (com uma chave de repartição entre direita, esquerda e liberais), entre Estados grandes e pequenos e entre géneros (dos quatro lugares, dois deverão ser ocupados por mulheres).
Os resultados das eleições para o PE puseram fim à maioria absoluta PPE-PSE e obrigam à entrada de uma terceira família política para o jogo: os liberais ou os Verdes. Os primeiros têm representação no Conselho, o que permite uma decisão entre Governos. Os segundos podem ajudar a aprovar a futura Comissão no PE.
O desenho da nova coligação entre PSE e liberais daria um presidente PSE da Comissão (Timmermans), um(a) presidente liberal do Conselho, um presidente PPE do PE (Manfred Weber, que ninguém imagina presidente da Comissão mesmo tendo sido Spitzenkandidat) e uma alta representante do PPE.
Este desenho pode ser rasgado se Macron retomar o eixo Paris-Berlim e propuser como a primeira presidente da Comissão Europeia Christine Lagarde, dando assim ganho de causa à francofonia, à igualdade de género e ao PPE.
De caminho, as eleições para o PE fizeram já cair os Governos na Grécia e na Áustria e, pela Bélgica, Louis Michel arrisca-se a ficar à frente de um Governo de gestão por muitos meses, tal é a separação política entre as duas metades linguísticas do plat pays.
O papel do PE sairá reforçado com aprovação da Comissão precedida da audição aos candidatos, num escrutínio apertado dos mais problemáticos. Na Comissão Barroso, este poder já serviu para eliminar Rocco Buttiglione, uma infeliz escolha pessoal de Berlusconi que conseguiu reunir quase todas as más vontades do PE. Os candidatos a comissários apresentados pela direita nacionalista ou populista (não acontecerá na Grã-Bretanha nem em França, Farage e Le Pen não estão no Governo) serão examinados à lupa. Poderá acontecer em Itália, Hungria e Polónia (embora estes dois Estados tenham escolhido como comissários no actual colégio figuras incontroversas).
Se o Conselho impuser a sua vontade na dança das cadeiras, é provável que consiga controlar o número suficiente de eurodeputados para garantir que a Comissão Europeia é aprovada. Mesmo que o PE obrigue à queda de alguns candidatos a comissários mais impalatáveis, indicados pelos Governos nacionalistas (vide Salvini), tal só reforçará a coligação PPE/PSE/ALDE em apoio do novo colégio remodelado. Com o atraso provocado pelos sucessivos arranjos, Juncker arrisca-se a ficar em funções para lá do Natal.
Escreve à sexta-feira, sem adopção das regras do acordo ortográfico de 1990