Alguém Perdeu. CMTV admite voltar a apostar na ficção

Alguém Perdeu. CMTV admite voltar a apostar na ficção


A telenovela para a qual a CMTV ambicionou revolucionar o mercado televisivo português terminará bem antes do previsto, com menos de metade dos episódios. Ao i, o diretor executivo da estação diz que é “obrigação” do canal “escutar sempre os espetadores”.


Não era já novidade que os resultados daquela que foi descrita como a maior aposta de sempre da CMTV não estavam a corresponder ao esperado pela estação. As provas tinham sido dadas pela alteração do horário de transmissão de Alguém Perdeu, a primeira telenovela do canal da Cofina. Ainda assim, a notícia da comunicação do cancelamento das gravações ao elenco e à equipa técnica, com a antecipação do final da novela, caiu como uma bomba.

Estreada em horário nobre, com a promessa de revolucionar o mercado televisivo português, a telenovela produzida pela SP Televisão (a mesma que assina as novelas da SIC) para a CMTV com a história de uma tragédia que, apregoava o slogan, “podia ser a sua”, foi encurtada dos 200 episódios inicialmente previstos para 82, segundo confirmou ao i Carlos Rodrigues, diretor executivo do Correio da Manhã e da CMTV.

Uma fonte próxima do projeto, explicou ao i que os 82 episódios que serão exibidos correspondem à primeira temporada das três ao longo das quais se prolongariam os cerca de 200 episódios com que a novela foi anunciada. Segundo a mesma fonte, a aposta nesta produção própria de ficção veio provar o que já se sabia: que o público daquele canal é maioritariamente masculino. “Sempre que a novela ia para o ar, as audiências caíam.” Face às audiências que o canal teria se estivesse a transmitir, por exemplo, notícias.

Mesmo que não se trate de uma questão de tipo de público, os resultados tornaram claro que não é um produto de ficção — pelo menos, não com aquelas características — que os espetadores procuram na CMTV. Numa troca de emails com o i, Carlos Rodrigues deixa claro que não haveria, perante os resultados, outro desfecho possível: “O desígnio do CM e da CMTV é sempre liderar. Logo, um produto que não tem um desempenho consentâneo com o canal que lidera o cabo há 29 meses consecutivos não cumpre, manifestamente, o objetivo.”

Números por revelar Nem junto da CMTV nem da SP o i foi capaz de chegar aos números que justificaram a tomada de uma medida tão drástica como o cancelamento das gravações antes do inicialmente previsto. Mas quer a produtora quer a estação desdramatizam o desfecho. “Os projetos que a SP Televisão desenvolve são feitos à medida do cliente. Por isso, é recorrente que os nossos produtos de ficção sofram alterações, ao longo das gravações, quer em número de episódios, ou até mesmo através da adaptação da própria história, mas sempre em conformidade com os nossos clientes”, respondeu a SP ao i por email. “Neste caso, a ideia inicial seria produzir mais episódios, o que não se veio a verificar. Há produtos que terminam com um número diferente de episódios do que o previsto, sempre de acordo com o que cada cliente nos requisita.”

Não escondendo o falhanço, o diretor executivo da CMTV, que recorda como “o lançamento foi rodeado da maior campanha de marketing da história da estação” com a mobilização de “todos os meios disponíveis”. Sobre o investimento feito, que o i sabe ter sido bastante inferior ao das produções do género encomendadas pelos canais abertos generalistas, revela apenas que “o investimento feito pela CMTV era ajustado à contratação de uma produção sólida, de qualidade e com resultados consentâneos com os do canal, e representava um enorme esforço financeiro”, adequado, nas suas palavras, “aos objetivos do canal, que passam por liderar e crescer permanentemente”. E sublinha, na mesma linha da SP: “Em televisão, todos os produtos podem ser interrompidos a qualquer momento, porque o veredicto é sempre dos telespetadores. Uma das razões para o sucesso da CMTV é a capacidade de auscultar permanentemente as mensagens que nos são enviadas pelos nossos telespetadores. A avaliação é feita diariamente, ao segundo, através da medição de audiências. Os nossos espetadores aguardaram pacientemente que melhorássemos o produto. Cabe-nos agradecer a paciência que tiveram connosco. Agora, chegou a hora de atuar de acordo com o veredicto do público”.

Segundo ainda Carlos Rodrigues, antes de avançar para a decisão de interromper o projeto antes do esperado, foram tomadas várias medidas: “Desafiámos a SP a fazer alterações ao produto, e mudámos a hora de emissão, das 20h30 para as 19h. Não obstante, a reação do público manteve-se. E a CMTV tem a obrigação de escutar sempre o que os nossos espetadores nos dizem.”

Segundo o i conseguiu apurar, ainda que não tenha conseguido obter reação de nenhum dos atores ou membros da equipa técnica que tentou contactar, as gravações já chegaram ao fim. Segundo conseguiu apurar, os contratos foram rescindidos contra o pagamento das indemnizações devidas. Mas, sobre esse assunto, a CMTV remete qualquer esclarecimento para a SP — “não tenho dados sobre a forma como a SP planeia, executa e concretiza as suas produções, até porque se trata de uma produtora com uma experiência enorme na área, razão, aliás, que nos levou a associarmo-nos a ela neste projeto”, sustenta Carlos Rodrigues — que, por email, explica que “as equipas são contratadas por projeto e alocadas a cada um deles” e que, neste caso, “todos os contratos foram cumpridos”.

Sobre futuras apostas em produtos de ficção, mais ajustados ao que a estação acredita que seja o interesse do seu público, Carlos Rodrigues deixou um cenário aberto: “Neste momento é prematuro falar dos próximos projetos da CMTV na ficção. A proposta de valor da CMTV é conhecida do mercado, dos espetadores e da comunidade em geral. Fazer sempre mais e melhor é o nosso objetivo permanente, sempre com a missão de liderar o mercado. Os resultados do canal dão-nos a consciência de que estamos no bom caminho”.