A escolha do tempo e do local da batalha são determinantes para qualquer vitória. O 45.o Presidente não é versado em estratégia militar, embora tenha já abatido um número considerável de generais que incautamente aceitaram colaborar com a sua administração. Folheando o menu dos conflitos, há uma retirada em curso no Afeganistão ao mesmo tempo que decorrem negociações com os talibãs, deitando a perder os enormes esforços em blood and treasure. Para a Venezuela é feito um discurso musculado mas sem retomar a tradição de invadir o quintal a sul de Miami (manu militari na Nicarágua, Costa Rica, Panamá, Granada, por via do apoio aos defensores da liberdade através da CIA, também em todos os restantes Estados da América Latina). Na Líbia, Trump escolheu um vencedor da guerra civil (Khalifa Haftar) apenas porque aparentava ser o vencedor (muito longe do realismo de Franklin D. Roosevelt a propósito de Somoza na Nicarágua: “He may be a son of a bitch, but he’s our son of a bitch!”), não reparando no patrocínio de Moscovo. A gestão teatral de expectativas no relacionamento com a Coreia do Norte deu lugar ao regresso à normalidade: sanções dos EUA contra lançamento de mísseis por parte de Pyongyang. O interesse de Trump pela Guerra Civil Síria durou um par de horas, para provar que, ao contrário de Obama, era capaz de bombardear as forças de Hassad. O conflito com Pequim, gerido de forma igualmente teatral, vai assistindo a uma escalada da guerra comercial paga pelo consumidor americano.
Trump gostaria de ter uma vitória militar retumbante e rápida, sem baixas significativas. Sabe quão reduzido é o apetite do eleitorado americano por mais um conflito num país de nome impronunciável de onde possam passar a chegar com regularidade cadáveres enrolados na bandeira americana.
Na impossibilidade de vencer uma guerra real, sobra a possibilidade de tentar ganhar uma guerra encenada. As guerras comerciais permitem-no, como já aconteceu com a renegociação do acordo NAFTA: o novo acordo é quase idêntico ao primeiro, mas Trump representou o papel de negociador implacável e aparentou defender os interesses americanos perante o “oportunismo do Canadá e do México”.
Admitamos que em Junho, no encontro entre Trump e Xi Jinping, haja suficiente talento teatral para oferecer uma vitória retumbante ao primeiro sem que o segundo perca a face. A continuação da guerra comercial entre as duas maiores economias levará a uma diminuição do crescimento económico que só poderá trazer más notícias para todos.
Já a multiplicação de sanções económicas contra o Irão e o reforço da presença militar dos EUA no golfo Pérsico poderão gerar de forma artificial um casus belli. Há uma tradição local de provocações de parte a parte que já incluiu o abate de aviões civis confundidos com aviões militares hostis. Uma guerra aberta entre Teerão e Washington terá consequências regionais muito mais dramáticas do que a proxy war que se vive na região há várias décadas. Desde logo poderá levar ao derrube das lideranças das diversas petromonarquias sunitas. Garantidamente levará ao disparar dos preços do petróleo, algo que não cai bem na carteira do eleitor americano. Esta guerra, a acontecer, mostrará o isolamento dos EUA: não haverá uma coligação poderosa como na defesa do Kuwait contra a agressão por Saddam. E Teerão terá todo o apoio de Moscovo, num remake dos piores momentos da Guerra Fria.
Escreve à sexta-feira, sem adopção das regras do acordo ortográfico de 1990