Temos vindo a assistir nos últimos tempos a uma vaga de populismo que parece varrer as democracias ocidentais.
Os cientistas políticos chamam à eleição de Trump e à eleição de Bolsonaro fenómenos de populismo. Segundo Cas Mudde (2017) “o populismo é uma ideologia de baixa densidade que considera que a sociedade está, em última análise, dividida em dois campos homogéneos e antagónicos – o povo puro e a elite corrupta – e que defende que a política deveria ser uma expressão da vontade geral”.
O conceito de povo baseia-se na ideia de que este não é a fonte do poder político mas sim a fonte do poder governante, através de um líder que comunica com as massas e interpreta a sua vontade. Rejeita, pois, a democracia representativa e o sistema de partidos, já que o povo não precisa de intermediários.
Neste contexto, é importante notar que Trump havia afirmado “que o seu movimento visava substituir um establishment falhado e corrupto por um governo controlado pelo povo americano (…) Vai ser um tempo novo na América. O governo vai ouvir novamente as pessoas, os eleitores e não os interesses especiais”. O mesmo veio a suceder na eleição de Bolsonaro quando se apresentou como candidato contra o sistema, sendo que os brasileiros aderiram ao seu discurso por causa da corrupção, crise económica e insegurança.
Acontece, porém, que as instituições políticas brasileiras não têm a solidez das norte-americanas, fortalecidas ao longo de mais de dois séculos e que sempre evitaram qualquer tentação autoritária. Veja-se as dificuldades de Trump em lidar com o Congresso. Não é assim no Brasil em que a Constituição data apenas de 1988.
Segundo Oliveira Rocha (2018), a estruturação do atual pensamento populista deve-se a Steve Banon, estratega da campanha eleitoral de Trump. Depois de ser despedido da Casa Branca, Banon fundou uma universidade populista a 130 km de Roma. O pensamento populista na Europa tem como principal líder Mateo Salvini, homem forte do atual governo italiano, o qual se apresenta como antissistema, contra os imigrantes, contra a UE e ideologicamente nacionalista.
Tendo presente esta conceptualização, o populismo está normalmente associado a um líder que corporiza os problemas e os ódios das pessoas que se congregam através dos meios de comunicação social.
Ainda, na mesma trajetória, Lucas Belvaux (2017), refere que “o populismo é a recusa da complexidade das coisas” e “prospera precisamente onde as outras forças políticas falharam”.
Com efeito, o que aconteceu nos Estados Unidos e o que acaba de acontecer no Brasil, não pode ser encarado como “uma brincadeira”, mas deve ser levado muito a sério, podendo ser um sinal de inquietação social, de uma motivação económica ou de uma opção contra a globalização.
Salvo melhor opinião, não vejo uma relação direta entre dificuldades económicas, austeridade e populismo, mas é claro que podem ser um “gatilho”, sendo certo que há muitas outras variáveis culturais que entram em jogo.
Silvério Cordeiro