Eleven Sports. O toque de Midas (ainda) não resultou em Inglaterra

Eleven Sports. O toque de Midas (ainda) não resultou em Inglaterra


A empresa de serviço de streaming online entrou no mercado britânico em agosto, mas o reduzido número de subscritores e a ausência de acordo com as distribuidoras de canais televisivos podem ditar um adeus precoce. Para já, em Portugal, tudo ficará na mesma


Caiu como uma bomba no mercado nacional, açambarcando a Liga dos Campeões e os campeonatos espanhol, alemão e francês, bem como a NFL e desportos de combate – além da Fórmula 1, a partir da próxima temporada. A partir daí, todos ficaram a conhecer o nome; já aceder aos serviços da empresa, nem por isso. A Eleven Sports só tem acordo com a Nowo, que há meses tenta negociar – sem sucesso – os direitos dos canais da empresa britânica com a Meo, a Nos e a Vodafone. E, neste caso, sem sucesso significa sem receitas.

É precisamente esse o cenário que se repete também no Reino Unido e na Irlanda, o que levou ao aparecimento de várias notícias, durante o dia de ontem, a dar conta da possibilidade de a empresa deixar o mercado britânico, onde chegou há quatro meses, sensivelmente o mesmo tempo em que está a operar em Portugal. Detida pelo italiano Andrea Radrizzani, desde maio – também dono do Leeds United, um histórico do futebol inglês que há vários anos compete no segundo escalão -, a Eleven Sports está a encontrar muitas dificuldades para implementar o seu modelo de negócio em terras britânicas e procura agora “reestruturar os acordos existentes para que o atual serviço de transmissão continue”, nomeadamente optando apenas pela cobertura online.

“Sem acordos com as plataformas existentes, ao mesmo tempo que enfrentamos os desafios relacionados com a pirataria, as atuais dinâmicas de mercado tornam o Reino Unido e a Irlanda países muito hostis a novos operadores”, explicou um porta-voz da empresa ao jornal britânico “The Telegraph”. O número de subscritores do serviço é reduzido: cerca de 50 mil, de acordo com a imprensa inglesa, a pagar por volta de 6,6 euros por mês, o que rende apenas 334 mil euros mensais. 

Já os prejuízos vão-se acumulando: depois da batalha com a Sky e a BT Sport no início da temporada para conseguir os direitos das ligas espanhola, italiana e holandesa, estão agora a pesar na posição da empresa no mercado britânico. A Eleven Sports pretendia inicialmente conseguir acordos com a Sky, a Virgin e a BT para a distribuição e transmissão dos jogos, mas acabou por não ser bem-sucedida nessa demanda.

Esta realidade é ainda mais exacerbada com as notícias de que a UFC, competição de artes marciais mistas, acionou uma cláusula que lhe permite cancelar o contrato de exclusividade com a Eleven Sports – que deveria arrancar em janeiro -, precisamente pelo insucesso da empresa em chegar a acordo com operadoras de distribuição. Os jogos de futebol têm vindo a ser transmitidos no Reino Unido e na Irlanda unicamente pela internet, com algumas emissões particulares a terem lugar sem custos via Facebook. 

A pouca familiaridade de muitas pessoas com os serviços de streaming online e respetivas plataformas também tem dificultado a entrada da empresa: ficaram célebres as declarações de Ryan Giggs em novembro, com o atual selecionador do País de Gales a assumir que não tinha visto os últimos jogos de Bale pelo Real Madrid por não ser subscritor da Eleven Sports.

 

Franquia lusa sem preocupações

Em muitas situações, estes primeiros focos de instabilidade e/ou insucesso, ainda que num mercado específico, acabam por alastrar de seguida para outras zonas de operação das empresas. Para já, esse não deverá ser o caso da Eleven Sports – pelo menos em território luso. Essa foi a garantida deixada pela Eleven Sports Portugal ao i. 

“Todas as operações da Eleven Sports são independentes nos diversos mercados em que opera. Como tal, a Eleven Sports Portugal mantém a sua atividade em pleno, sem quaisquer efeitos diretos das notícias tornadas públicas sobre a operação no Reino Unido. Temos um portefólio de referência entre as diversas subsidiárias do grupo e com contratos plurianuais, pelo que a aposta no mercado português continua a ser estratégica para o grupo”, referiu a empresa fundada em 2015 e liderada por Jorge Pavão Sousa. 

Esta reação vai ao encontro das palavras do diretor-geral numa entrevista concedida em outubro ao “Jornal de Negócios”. “A Eleven Sports está claramente para ficar por mais anos em Portugal”, afirmava então, frisando ainda a mudança de paradigma no consumo de transmissões desportivas. “Considero que a experiência do futebol deve ser num grande ecrã. Mas há cada vez mais estudos que apontam para perdas da visualização linear de televisão de seis a oito por cento dos grandes eventos desportivos. Temos fenómenos como a ESPN nos Estados Unidos, a perder dezenas de milhares de subscrições, e a Sport TV também a perder parte significativa do seu parque [de clientes]”, salientava Jorge Pavão Sousa, justificando assim a aposta da Eleven Sports no mercado digital. 

O líder da empresa em Portugal sempre sublinhou que o ideal seria conseguir estar presente em todas as plataformas, mas admite que, caso não seja possível, haverá certamente um reforço da procura pelos serviços de streaming. Até aqui, o acordo não foi conseguido porque ainda não foi possível chegar a um valor que agrade à empresa e às operadoras. No entanto, a Eleven Sports Portugal admite continuar a preparar um plano B e reforça que tem tido “uma progressão crescente do número de subscrições”, tendo já “dezenas de milhares”. 

No que respeita às competições sob a chancela da UEFA, por agora, a Eleven Sports também não parece ter a sua posição em risco. O organismo que rege o futebol mundial vende os direitos televisivos em contratos de três anos, e foi nessa base que a empresa britânica assegurou os direitos para a transmissão em Portugal – o único país onde o conseguiu. O i contactou a UEFA em relação a esta questão e a resposta não podia ser mais taxativa: “Não temos comentários a fazer.” Atendendo à posição da Eleven Sports, tudo leva a crer que, pelo menos nas próximas duas épocas e meia, os portugueses continuem a ter de fazer alguma ginástica para assistir à maioria dos jogos europeus – leia-se subscrever a Nowo… ou ser Inácio e recorrer às maravilhas da pirataria cibernética.