As lutas do mar português


As lutas “justas” podem ser uma solução para romper um bloqueio, mas também podem representar uma perda para todas as partes, caso estas não sejam capazes de acordar um compromisso com o qual todos possam vir a ganhar


Muitas e diversas são as lutas que têm vindo a travar-se no mar português e que continuarão num futuro próximo. Seguramente, todas elas com o seu grau de importância, umas ajudando-o a crescer, outras garantindo a sua promoção e valorização, e outras ainda para enfrentar adversidades, romper bloqueios e obstáculos.

Defender e reclamar condições justas e adequadas, garantir o desenvolvimento social e económico são provavelmente lutas justas que podem resultar numa solução que rompa um bloqueio e permita construir condições mais ajustadas para um desenvolvimento harmonioso e equilibrado.

Tudo isto vem a propósito das ações de protesto encetadas pelos estivadores do Porto de Setúbal. Ninguém nega a razão a nenhuma das partes envolvidas pois, certamente, os motivos que determinaram os diferentes posicionamentos terão uma justificação mais do que suficiente para os empregados/trabalhadores e empregadores/empresas.

Na verdade, devemos interrogar-nos porque não são capazes os cidadãos do mar, a bem do desenvolvimento, da justiça social, do crescimento económico e do interesse estratégico do país, de antes do conflito promover as condições para a concertação de posições.

É mesmo necessário a exposição pública, o extremar de posições para só a posteriori pensar e encontrar a solução para o conflito? No presente caso, não me parece que as razões sejam suficientes para o agudizar desta luta em que todas as partes podem sair a perder.

Também neste processo, não me parece entendível e percetível o comportamento da instituição pública intermédia, a administração dos portos de Lisboa e Setúbal, que atempadamente deveria tentar mediar o conflito, promovendo as condições necessárias para a concertação entre as partes, e evitar tanto quanto possível a necessidade do envolvimento do Ministério do Mar, que deve ter outro papel, bem mais relevante e reservado, na defesa e implementação da política pública do mar.

O mar português precisa de se envolver e agregar, não de se fracionar. Estas lutas devem ser evitadas, pois podem levar a uma perda de afirmação quer interna quer externa, diminuir a capacidade de captar atividade económica e financiamento, e pôr em risco o seu crescimento e desenvolvimento sustentável.

O futuro dos portos portugueses é e pode ser ainda mais promissor, mas para tal é preciso continuar o seu processo de inovação e automação, de recrutamento e formação de recursos humanos qualificados e justamente reconhecidos social e economicamente, porque são o suporte para garantir a existência de empresas sustentáveis e de elevado grau de eficácia e eficiência.

A contestação dos estivadores, naturalmente, terá as suas razões. No entanto, todos temos a obrigação de perceber que concertar e acordar um compromisso deve permitir que todos saiam a ganhar. O consenso é um sinal de maturidade e de segurança para o futuro.

O mar precisa de trabalhadores, empresários e instituições fortes e unidos em torno de objetivos comuns, em que cada um deve desempenhar bem o seu papel social e organizacional, pois só com pessoas e organizações sólidas e inteligentes teremos capacidade de projetar, valorizar e desenvolver o mar português.

 

Gestor e analista de políticas públicas

Escreve quinzenalmente à sexta-feira