Escuteiros. Guerra entre paróquia e dirigentes de agrupamento deixou 120 jovens sem atividades

Escuteiros. Guerra entre paróquia e dirigentes de agrupamento deixou 120 jovens sem atividades


Cerca de 120 jovens dos escuteiros de Almada estão agora impedidos de continuar as atividades por causa da demissão dos dirigentes do agrupamento. Os desentendimentos entre a paróquia e o grupo de escuteiros não são recentes, mas intensificaram-se nos últimos meses 


Foi há 43 anos que nasceu o Agrupamento 555 de escuteiros de Almada. O grupo foi crescendo e, até à semana passada, 120 crianças, jovens e adultos reuniam-se semanalmente para, entre muitas outras, atividades de campismo e voluntariado. Hoje, o grupo já não existe. Uma guerra entre a paróquia de Almada e os dirigentes do agrupamento resultou no pior cenário: o fim da atividade deste grupo. 

Os escuteiros são organizações em que a comunicação entre a paróquia e o grupo é fundamental e, no caso do Agrupamento 555, as instalações eram mesmo dentro da paróquia. A chefia do agrupamento católico 555 anunciou a sua saída e, por isso, as atividades foram suspensas. Até agora, o grupo de cerca de 120 jovens era chefiado por Paulo Santos, que coordenava as equipas desde outubro de 2004. 

De acordo com um documento a que o i teve acesso, os desentendimentos entre as duas partes – igreja e escuteiros – arrastam-se há alguns anos e intensificaram-se nos últimos meses. E o pároco de Almada, padre Marco Luís, e a coordenadora paroquial da catequese, Isabel Rosado, enviaram um comunicado urgente aos pais onde deram conta das principais divergências. 

“Tomou a chefia do agrupamento atitudes de falta de comunhão com o seu Bispo, a diocese, o seu pároco e a paróquia de Almada”, refere o documento. A paróquia sublinha ainda os pedidos do Agrupamento 555 para se deslocar para outro espaço que não a Igreja de Almada e a exigência de um novo assistente. Estes pedidos foram recusados pelo bispo diocesano, neste caso pelo D. José Ornelas, de Setúbal, “depois de um longo processo de escuta”. 

Ao que o i apurou, o descontentamento dos pais é geral, uma vez que, neste momento, cerca de 120 escuteiros de Almada estão impedidos de se reunir como habitualmente faziam, tudo por causa das desavenças entre a igreja e os dirigentes do agrupamento. 

Petição ao Bispo Com “informação manipulada” Os desentendimentos não terminam por aqui e, de facto, intensificaram–se nos últimos tempos. Em setembro deste ano, a propósito da celebração dos 50 anos da Igreja de Almada, as duas entidades não chegaram a consenso e a igreja católica diz mesmo que o agrupamento se manifestou contra as mudanças do mobiliário litúrgico na Igreja da Assunção, não tendo disponibilizado qualquer ajuda para o projeto. E aqui destaca-se “a dinamização de uma petição pública online dirigida ao Bispo de Setúbal com manipulação de informação”, conforme referido no documento a que o i teve acesso. A petição pública em questão, disponível na internet e assinada até agora por 594 pessoas, refere-se às eventuais obras a realizar na Igreja de Almada. 

O documento “pela preservação da Igreja de Almada (obra icónica da cidade)” aponta como maior problema, e mais preocupante, a proposta de obras que é feita “à revelia dos direitos” dos arquitetos que projetaram o edifício. De acordo com os autores da petição pública, os princípios da obra foram “escrupulosamente respeitados” pelos antecessores do atual padre e “nada na Igreja de Almada está degradado ao ponto de necessitar de obras de reparação, muito menos de substituição”. Ao Bispo de Setúbal é então pedido que “impeça imediatamente a realização desse atentado ao património histórico-cultural” da cidade de Almada. 

Ao i, a Diocese de Setúbal e o Corpo Nacional de Escuteiros (CNE), em comunicado conjunto, afirmaram que a paróquia é uma comunidade composta por diversos grupos e “no decorrer normal da relação entre esses grupos, há opiniões e modos diferentes de tratar diversos temas, sendo os mesmos debatidos e tratados no seio da família/comunidade paroquial”, acrescentando que “na sequência de algumas dessas diferenças, entendeu-se ser necessário suspender o agrupamento”. 

Estrutura dos escuteiros em Portugal No nosso país, o número de escuteiros é mais do que suficiente para encher um estádio de futebol. Em 2016 registaram-se cerca de 72 mil escuteiros divididos em cinco grupos – dirigentes, lobitos, exploradores e moços, pioneiros e marinheiros e, finalmente, caminheiros e companheiros. O Corpo Nacional de Escutas (CNE) é a maior organização de juventude de Portugal, não só pelo número, mas também pelas atividades e encontros que promove. Desde os seis anos – idade mínima permitida -, os jovens são inseridos em ambientes que estimulam o espírito de cooperação e, sobretudo, os valores. Segundo os dados disponibilizados pelo CNE, cada voluntário dedica em média quatro horas semanais às atividades e 208 horas por ano. 

Quanto ao Agrupamento 555, os escuteiros estão agora impedidos de dedicar o seu tempo às atividades habituais, pelo menos até que haja um entendimento entre a paróquia e os dirigentes do grupo.

A Diocese de Setúbal e o CNE garantem que ambos “estão em processo de discernimento, no sentido de encontrar as adequadas soluções”, sendo a principal preocupação “as 120 crianças e jovens que querem continuar a viver a pedagogia e o método escutista à luz da fé cristã”.