O burburinho em crescendo nos últimos dias não é para menos: hoje, Lisboa recebe pela primeira vez a gala de apresentação do Guia Michelin ibérico de 2019, onde a partir de 19h00 serão apresentadas as novidades para o próximo ano. E por novidades entendam-se estrelas. Se a tendência do ano passado se verificar, Portugal deverá continuar a somar pontinhos dourados. Em 2017, não houve perdas de estrelas atribuídas nos anos anteriores e dois novos restaurantes receberam a distinção: o Vista, em Portimão, do chef João Oliveira, e o Gusto, em Almancil, do alemão Heinz Beck e do italiano Daniele Pirillo.
Mais do que os restaurantes que receberão pela primeira vez uma estrela, o grande ponto de interrogação nos últimos dias está um patamar à frente: das três estrelas – a ‘pontuação’ máxima dos críticos, que se traduz numa “cozinha de nível excecional, que justifica a viagem” – e que até à data nunca foram atribuídas a um restaurante português.
Mesmo que o dia 21 novembro de 2018 não se concretize com a entrada de Portugal no Olimpo do guia gastronómico mais prestigiado do mundo – as tais três estrelas – só o facto de a gala ter decorrido em Lisboa é, só por si, um sinal muito positivo para a gastronomia lusa. “Mostra reconhecimento pelo nosso trabalho”, sintetiza João Francisco Duarte ao i. O chef, que deixou recentemente o leme do sushi bar da Bica do Sapato e que também já passou pela cozinha do Eleven, (ambos em Lisboa); do Arola e do Midori (Sintra) e do Sushisamba (Londres) abriu há uma semana o seu primeiro restaurante em nome próprio, o Tarara, no Beato. “Não me quero desligar por completo do sushi mas tinha saudades do fogão”, conta, sublinhando que este é o realizar de um “sonho antigo”.
E nesse sonho caberão, um dia, estrelas? “Qualquer um gostaria”, admite o chef que, como é comum entre quem está no meio, também tem as suas apostas, embora considere difícil que o guia atribua finalmente as três estrelas, até porque ter – e manter – uma estrela Michelin é “caro”. “Os critérios usados na Ásia, por exemplo, são diferentes”, começa por explicar. Por lá há cozinheiros de comida de rua que já foram distinguidos . “Cá é preciso um nível alto de financiamento” para manter o padrão exigido, um patamar que está ao alcance de uma pequena minoria.
Ainda assim, o chef não descarta a hipótese de os inspetores do guia – todos espanhóis, o que, no seu entender, explica uma certa marginalidade das menções de restaurantes portugueses até a um passado recente – distinguirem finalmente um espaço português com o número máximo de estrelas deste firmamento.
“Se o fizerem, julgo que será o Ocean (de Hans Neuner, em Armação de Pêra) e o Belcanto (de José Avillez, em Lisboa)”. Já para receber pela primeira vez as duas estrelas aponta o São Gabriel, de Leonel Pereira (Almancil) e está convicto de que haverá pelo menos mais um restaurante a entrar para o guia pela primeira vez: o Midori, em Sintra.
Uma convicção partilhada por Duarte Calvão, um dos autores do blog Mesa Marcada e que tem acompanhado de perto estas lides. “Sei que Pedro Almeida, do Midori, do hotel da Penha Longa (Sintra) estará e que, a julgar pelo espectacular jantar que tive lá na semana passada, a estrela é mais do que merecida. Seria a primeira cozinha de influência oriental a receber uma estrela em Portugal”, escreveu no seu blogue esta segunda-feira num texto onde antecipa a cerimónia de hoje e onde também aponta o Belcanto e o Ocean como possíveis detentores das três estrelas.
De momento, há 18 restaurantes do país com uma estrela – ou seja, estabelecimentos onde os inspetores consideram que “compensa parar” – e cinco com duas estrelas (“cozinha excelente, vale a pena o desvio”): ao Belcanto e ao Ocean, de que já falámos, juntam-se o Il Gallo d’Oro, no Funchal, sob os comandos de Benoît Sinthon; o The Yeatman, em Vila Nova de Gaia, de Ricardo Costa; e o Vila Joya, em Albufeira, liderado por Dieter Koschina.
Para abrir o apetite
A festa de hoje, para a qual estão convidadas 500 pessoas, acabará com todas as interrogações. O repasto que não pode faltar num momento desta índole ficou a cargo de sete chefs estrelados: cada um apresentará três pratos principais e uma sobremesa. Um extenso menu onde se contam pratos como pudim de codium com santola e água do mar (Loco, de Alexandre Silva); asas de frango com lavagante do Guincho (Lab by Sergi Arola); massada de Peixe (vinda da Fortaleza do Guincho, hoje representada por Gil Fernandes depois de Miguel Rocha Vieira ter abandonado, na semana passada, o projeto); tarte de tomate preservado e papada de porco (do Feitoria de João Rodrigues), rabo de boi com puré de batata e trufa preta (Eleven, de Joachim Koerper); berbigão à bulhão pato (do Alma de Henrique Sá Pessoa) ou bôla de cogumelos silvestres com patê e escabeche de perdiz, uma sugestão do Belcanto de José Avillez, a quem coube também o papel de coordenador-geral do evento.