Luís Goes Pinheiro, o novo secretário de Estado da Modernização Administrativa, foi apanhado em escutas da Polícia Judiciária (PJ) no início de 2014, durante a investigação à corrupção nos vistos gold. O agora governante terá sido beneficiado no recrutamento de um concurso para vice-presidente do Instituto dos Registos e Notariado (IRN).
Apesar da “ajuda”, Goes Pinheiro não conseguiu ficar com o lugar e, pelo meio, precisou de receber “orientações” de um elemento do júri para melhorar a sua prestação nas entrevistas de seleção. Foi António Figueiredo, à época presidente do IRN e principal arguido do processo dos vistos gold – cujo desfecho está marcado para dezembro –, quem tentou ajudar o agora secretário de Estado, de quem era amigo. E fê–lo através de Maria Antónia Anes, então membro do júri da Comissão de Recrutamento e Seleção para a Administração Pública (CReSAP). Anes, também arguida nos vistos gold, era amiga de Figueiredo há já mais de dez anos e os dois concordaram, em conversas que a PJ intercetou, que Goes Pinheiro – que era secretário-geral da Câmara dos Solicitadores e se tinha candidatado a dois concursos para o IRN, um para vogal e outro para vice-presidente – seria a melhor escolha. Isto porque, lê-se na acusação do processo, António Figueiredo não “tinha muito interesse” em que os funcionários que à época ocupavam os dois lugares a concurso se mantivessem.
Numa conversa de 15 de janeiro de 2014, Maria Antónia Anes contactou Figueiredo para “obter a sua anuência à promoção e favorecimento da candidatura”. E o então presidente do IRN concordou, explicando que “estando Luís Goes conotado com o PS e estando o governo [de Passos, PSD] em fim de mandato”, a contratação se “revelava adequada”. Figueiredo admitiu ter “boa relação” com o agora secretário de Estado e Anes aproveitou para lhe confidenciar – segundo o Ministério Público, violando o “dever de sigilo” – que Goes Pinheiro se tinha candidatado a outro organismo público e “não estava bem colocado”, acrescentando que se soubesse que era amigo de Figueiredo “o tinha colocado melhor” nas provas.
Após esta conversa, o então presidente do IRN telefonou a Luís Goes para lhe dizer que tinha dado “uma indicaçãozinha” a seu favor junto de um elemento da CReSAP e que, por isso, poderia contar não com uma, mas com duas “cunhazitas” a seu favor nos concursos.
O agora secretário de Estado seria entrevistado três semanas mais tarde, a 7 de fevereiro de 2014, na CReSAP. Logo a seguir à entrevista, pelas 12h30, Maria Antónia Anes mandou uma mensagem a António Figueiredo, recomendando que o candidato, na entrevista que ocorreria ainda nessa tarde para o outro concurso, fosse “mais objetivo” e trouxesse “propostas concretas para o lugar a concurso”. Às 14h44 enviou outra mensagem, acrescentando que Goes Pinheiro tinha feito uma entrevista “pouco objetiva e de conversa de político”.
Depois de ler as mensagens, António Figueiredo telefonou ao agora secretário de Estado para lhe dar as “orientações”. E Goes Pinheiro ter-se-á portado melhor na segunda entrevista: Maria Antónia Anes contou a Figueiredo que o candidato tinha alterado o discurso e se tinha “saído muito bem”. A CReSAP acabaria por levar o nome de Goes Pinheiro à ministra da Justiça, juntamente com dois outros, como manda a lei. Mas Paula Teixeira da Cruz preferiu outro candidato: João Rodrigues, que já estava no cargo antes.
O i contactou o Ministério da Modernização Administrativa para obter uma reação do novo secretário de Estado, mas não obteve resposta.