Al-Hilal. A febre dos mutahrifeen começou com um irlandês e continuou com Rivelino

Al-Hilal. A febre dos mutahrifeen começou com um irlandês e continuou com Rivelino


O atual clube de Jorge Jesus foi pioneiro na contratação de jogadores não árabes. Teve como treinador Mário Zagallo e como primeiro europeu Eamon O’Keefe, que foi assediado para deixar o futebol e tornar-se amante de um príncipe saudita


Com a chegada de Jorge Jesus ao Al-Hilal, de Riade, Arábia Saudita, uma ventania saudosista recordou, por entre os adeptos, outras figuras internacionais que passaram pelo clube, como foi o caso de Mário Zagallo, treinador campeão em 1979, que já conquistara o título mundial como jogador e como técnico. 

O português tem hoje em dia ao seu dispor oito jogadores estrangeiros: Alberto Botía (Espanha), Carlos Eduardo (Brasil), Gelmin Rivas (Venezuela), Gomis (França), André Carrillo (Peru), Abdulrahman (Emirados), Omar Krihbin (Síria) e Al-Habsi (Omã). Mais do que suficientes, provavelmente, para atacar o título, apesar da forte concorrência do Al-Nassr (só vitórias até ao momento) e do Al-Ahli, mas incapazes de fazerem esquecer as três épocas em que o emblema ornava a camisola de Roberto Rivelino, o extraordinário esquerdino do Corinthians, do Fluminense e do Brasil de 1970.

Foi nesse ano que a federação saudita estabeleceu o estatuto de profissionais, os muhtarifeen, apenas concedido a jogadores estrangeiros que viessem para o campeonato do país. Os sauditas deviam manter-se rigorosamente amadores.
As opções recaíram sobretudo em talentos vindos do Egito e do Sudão, com as aspas devidas a tais talentos. Mas o Al-Hilal foi pioneiro. Decidiu-se por ir buscar jogadores não árabes. Com a chegada do treinador inglês George Smith, a opção foi, naturalmente, por britânicos. Ora, os britânicos não estavam para aí virados e o único que aceitou o convite foi um jovem irlandês de 22 anos chamado Eamon O’Keefe. Mais tarde, O’Keefe viria a publicar uma biografia (“I Only Wanted to Play Football”) na qual revelava que um príncipe saudita lhe oferecera uma vida de luxo desde que abandonasse o futebol e se tornasse seu amante.

A carreira do irlandês na Arábia Saudita foi suficientemente longa para que não deixasse muitas dúvidas sobre as suas opções profissionais e sexuais. E marcou uma era. Quando o Al-Hilal tornou público, em 1978, que assinara um contrato com Rivelino, muitos se perguntaram o que seria o Al-Hilal e que iria o antigo capitão da canarinha para lá fazer. Os valores eram próprios de um país rico: 10 milhões de reais (algo como cerca de 2,5 milhões de dólares). E Rivelino não esteve para brincadeiras: em três anos foi campeão com o seu novo clube por duas vezes (consecutivas, algo de inédito para o Al-Hilal), venceu a Taça do Rei e marcou 23 golos em 50 jogos.

Como seria de esperar, tanto Zagallo como Rivelino abriram as portas a mais brasileiros. O mais marcante de todos na história não apenas do futebol saudita, mas também de todos os países em redor, foi Sérgio Ricardo, depois conhecido por Serginho das Arábias. Em 1998, vindo dos turcos do Fenerbahçe, entrou no Al-Ahli. Quando se retirou, em 2010, tinha passado pelos três maiores clubes do país. E fora o herói de um momento inesquecível: marcou três golos na final da Taça dos Campeões Asiáticos de 2000, derrotando os japoneses do Jubilo Iwata e dando ao clube de Riade o seu primeiro troféu continental. O seu estilo peculiar e a sua personalidade polémica valeram-lhe a alcunha de “Al-Majnoon”, O Louco. Daí para cá, os estrangeiros não deixaram de acorrer ao futebol saudita. Com o anterior treinador de Benfica e Sporting a tentar agora a sua sorte.