José González. “É bom trabalhar sozinho mas também gosto  de mostrar esta versão de mim”

José González. “É bom trabalhar sozinho mas também gosto de mostrar esta versão de mim”


Há duetos improváveis e depois há colaborações esperadas como a de José González com a orquestra String Theory em estreia em Lisboa


Para esperar pelo inesperado, é melhor procurar noutro lado. Na relação entre o mais latino de todos os suecos e a orquestra germinada em Berlim que em Gotemburgo encontrou asilo com algumas das vozes mais importantes da Suécia (não só José González como os Wildbirds & Peacedrums, El Perro Del Mar e Ebbot Lundberg dos The Soundtrack of Our Lives), reina o conforto sobre o risco. Nem se esperaria algo diferente da folk planante e classicista de González.

Após visitas regulares a Portugal, o escritor de canções estreia-se no Coliseu dos Recreios com a orquestra a avolumar a massa de som sem destruir a beleza serena e, por vezes floral, que sai das seis cordas de González. O concerto está marcado para a próxima semana. No dia 2 de outubro, o Coliseu dos Recreios repousará sobre canções para sonhar como “Down The Line”, “Let It Carry You” e ”Cycling Trivialities”, o ponto de partida de um compromisso no som e no silêncio. Os bilhetes estão à venda a preços entre 28 e 55 euros.

Como surgiu esta união com a String Theory?

Eles convidaram-me para uma colaboração. Já tínhamos gravado uma canção [”Cycling Trivialities”, de “The Göteborg String Theory”, de 2010] para um álbum com uma série de músicos suecos, em que eles fizeram os arranjos, e foi uma experiência muito boa. Há algum tempo que pensava em trabalhar com uma orquestra, mas mais tarde. Entretanto surgiu este convite. É um bom complemento para aquilo que tenho feito ao longo destes anos. Chegamos a diferentes públicos e boas salas como o Royal Albert Hall (Londres) ou o Coliseu aí em Lisboa. 

Qual foi o plano que lhes deu na elaboração dos arranjos?

Na maioria das canções, a abordagem foi muito melódica. O objetivo foi não “destruir” os originais. Depois, há canções como o “Down The Line” com arranjos mais kraut cinemáticos. Já para mim, o desafio foi ser mais profissional. Ter mais atenção aos tempos, à afinação, ao próprio canto… Já era atento a essas questões mas agora preocupo-me muito mais em preparar-me.

Tem formação clássica?

Durante alguns anos, estudei com um professor particular de guitarra que me ensinou melodias espanholas clássicas e me ensinou bastante sobre técnica. 

Trabalhar sozinho é muito diferente do que com um grupo de pessoas?

Eles ensaiaram muitas vezes sem mim, por isso a colaboração foi muito relativa a esse nível. Quando estivemos juntos, deu-me muito gozo. A grande diferença entre estar em digressão a solo, ou com um grupo de pessoas, é que quando o concerto acaba há sempre um abraço de parabéns, quando o concerto corre bem. Musicalmente, também há uma diferença claro. Quando atuo sozinho, a pressão sobre mim é maior, mas por outro lado também estou mais livre para improvisar e mudar o tempo das canções, se me apetecer. 

O que vier a gravar no futuro será influenciado por esta colaboração?

É curioso perguntar-me isso porque quando estava a gravar o meu terceiro álbum [Vestiges & Claws, de 2015] já pensava nessa possibilidade. Para já, vamos editar estas gravações com a orquestra [um álbum ao vivo chegará em breve]. É bom trabalhar sozinho mas também gosto de mostrar esta minha versão.

O que podemos esperar da sua escrita após esta experiência?

A base continuará a ser voz e guitarra. Não há volta a dar, é o que faço melhor. Cresci a ouvir música latina e Beatles mas só comecei a formar o gosto quando comecei a ouvir Bob Marley e Michael Jackson. Passei pelo punk, ouvi Black Flag, Misfits e Dead Kennedys. Sou muito inspirado por alguns modernos mas acabo sempre por voltar aos clássicos como Simon & Garfunkel, Nick Drake e Crosby, Stills, Nash & Young. 

Nos últimos anos, houve uma proliferação de cantautores. É mais difícil ser único, sobretudo quando a música repousa apenas sobre a voz e a guitarra?

Penso que sim. Acho que tem razão. Houve momentos em que pensei muito nisso mas agora sinto-me descontraído. Confio no facto de haver pessoas que gostam de me ouvir. [Haver muitos cantautores] é um desafio, não um factor de stress.

Vem a Portugal com alguma regularidade onde tem um público bastante fiel. Reconhece-se na descrição da relação?

Sim, claro. É um país lindíssimo com cidades muito bonitas onde me sinto muito bem. E a comida é ótima. Não tenho uma história particular para contar das viagens mas lembro-me muito bem do Porto.