Há cerca de dois anos, a cada dia que passava, Catarina Dornelas Pinheiro sentia-se cada vez mais cansada. Depois vieram os suores noturnos, os estados semifebris, a comichão nos braços e nas pernas. A par disso, perdeu peso de forma acentuada. Um dia apercebeu-se de que tinha um caroço “talvez do tamanho de uma azeitona” na axila esquerda que não lhe doía, mas que lhe causava algum incómodo. E foi aí que decidiu ir ao médico.
“Se conseguia justificar o aparecimento de todos os sintomas, atribuindo-os a um ano de trabalho intenso, o certo é que foi o caroço na axila o grande sinal de alerta que me levou a consultar um médico”, recorda. Não ficou satisfeita com o primeiro especialista a quem recorreu e, cerca de dois meses depois de ter descoberto o caroço, decidiu consultar outro médico, um especialista em medicina interna. À primeira consulta, como conta ao i, “seguiram-se muitas análises e exames de despiste de variadíssimas doenças, e com o passar dos dias os sintomas agravavam-se e surgia uma violenta tosse com dor no peito e um aumento significativo do caroço na axila – que chegou a atingir o tamanho de uma bola de golfe”. Ao mesmo tempo apercebeu–se de mais caroços, desta vez no pescoço.
Depois do despiste de várias doenças, o veredicto resumia-se a dois diagnósticos: a doença que estava na base de tais sintomas só poderia ser mononucleose ou linfoma. A resposta seria dada por uma biópsia a um gânglio linfático e a sentença chegou a 29 de julho de 2015: Catarina tinha um linfoma de Hodgkin.
Perante o diagnóstico, era preciso atacar o mais rápido possível a doença e, duas semanas depois, iniciou os tratamentos de quimioterapia, que se estenderam por “seis ciclos com duas sessões mensais”, recorda. Os tratamentos chegaram ao fim em janeiro de 2016, mas Catarina continuou a fazer “regularmente análises e exames complementares” que mostram que “a doença se encontra em total remissão desde o fim dos tratamentos”. Hoje, com 37 anos, mostra-se positiva: “O passado está fechado. O presente é para viver como se não existisse amanhã. O futuro a Deus pertence”, afirma.
O linfoma de hodgkin O linfoma é um tipo de cancro no sangue que afeta os linfócitos. Por sua vez, como explica ao i Isabel Barbosa, presidente da Associação Portuguesa de Leucemias e Linfomas (APLL), “os linfócitos são um tipo de glóbulo branco e fazem parte do sistema imunológico, que defende o organismo contra infeções”.
Em Portugal, todos os anos são diagnosticados cerca de três mil casos de linfomas. Entre eles, o linfoma de Hodg-kin corresponde a apenas 10 % dos casos de linfoma diagnosticados. “O linfoma de Hodgkin é um tipo raro de linfoma caracterizado pela presença de células anormais, denominadas Reed-Sternberg, e que não estão presentes noutras formas de linfoma”, elucida a médica.
Os especialistas não conhecem ao certo as causas que estão na base da ocorrência deste tipo de linfoma, mas acredita-se que o estilo de vida ou determinadas mudanças que ocorrem no sistema imunológico possam potenciá-lo. E o leque de sintomas não é específico da doença. Entre os principais sinais está “a perda de peso repentina e sem razão aparente, o inchaço indolor dos gânglios linfáticos do pescoço, axilas ou virilhas, fadiga persistente, prurido e coceira intensa na pele, febre e suores noturnos”, acrescenta a responsável da APLL. Um estudo realizado no início deste ano na Europa, EUA e Canadá veio mostrar que a fadiga é especialmente comum neste tipo de doença, com dois terços dos doentes com linfoma a indicarem esse sintoma.
O estudo, desenvolvido pela Lymphoma Coalition – uma rede mundial composta por 75 organizações de doentes com linfoma de 50 países –, contou com a participação de 6600 doentes oriundos de 14 países e foi divulgado na última semana para assinalar o Dia Mundial do Linfoma, comemorado a 15 de setembro. Entre as principais conclusões, dá ainda conta de que “um em cada três doentes vive com preocupações significativas de que o cancro retornará, o que geralmente conduz a ansiedade e depressão”.
Apesar de poder desenvolver-se em pessoas de qualquer idade, o linfoma de Hodgkin é mais comum entre os mais jovens, em pessoas entre os 20 e os 25 anos. Tem também maior incidência em pessoas com mais de 50 anos. E por motivos que os médicos ainda não conseguem explicar, a doença é mais comum nos homens do que nas mulheres.
E quais os tratamentos indicados? “A doença é tratada com quimioterapia ou radioterapia”, refere Isabel Barbosa, mas, recentemente, a imunoterapia tem vindo a ganhar terreno e a afirmar-se como uma resposta que traz bons resultados. Porém, como explica a médica, “a transplantação de medula óssea – transplantação hematopoiética – é também um possível tratamento para estes doentes”. De resto, quanto mais cedo for feito o diagnóstico, mais hipóteses de sobrevivência existem. “Em geral, a taxa de sobrevivência é boa. Para doentes mais jovens e mais velhos, o objetivo é alcançar uma cura, e isso é conseguido na maioria dos casos”, assegura a médica. E os números são esperançosos: os tratamentos curam cerca de oito em dez doentes diagnosticados com o linfoma de Hodgkin.