4 de Setembro de 1931. O campeonato nacional das modas e bordados

4 de Setembro de 1931. O campeonato nacional das modas e bordados


Grande entusiasmo em redor da eleição da Rainha de Portugal das Costureiras. Em todas as províncias eram escolhidas as melhores que iriam apresentar-se no Casino do Estoril para a votação decisiva. Em Lisboa anunciava-se até um espampanante cronómetro que iria medir a duração dos aplausos para as mais belas e elegantes, auxiliando o júri na…


“É vê-las/De manhã quando elas vão/Ligeiras como andorinhas…/E acompanhadas algumas/Pelo noivo – ou p’lo irmão/E resignadas/Ao peso duro daquela/Negra vida/De pobreza e desconforto/- Palram, brincam/Dizem coisas de malícia/Mas nos olhos/E na boca/Paira um sorriso já morto”. Era assim que começava um poema de António Botto chamado Costureiras de Lisboa. Esperem um pouco: já verão que vem a propósito.

Repare-se, agora, no que anunciava um vespertino no dia 4 de setembro de 1931: “Em todas as províncias há grande entusiasmo pelas eleições das Rainhas das Costureiras que começam depois de amanhã”. Era aqui que eu queria chegar: a eleição da Rainha das Costureiras fazia furor nesse tempo já tão distante. Depois vinha a lista das prendadas concorrentes: Silvina da Costa Ferreira, de 18 anos, que trabalhava por sua conta; Irene da Conceição Costa, de 18 anos, empregada na Académica de Raul Pais. Estas eram as meninas que se batiam por Viseu. Excecionalmente, e porque estava marcada uma excursão à Figueira da Foz na qual participavam quase todos os membros da comissão de jurados, Viseu iria apresentar resultados dois dias mais tarde. O governador Civil, coronel Numa Pompílio da Silva, garantia a seriedade do acto do alto da sua pompa e circunstância de fazer inveja ao pobre Elgar. 

Em Évora, por seu lado, anunciava-se os esplêndidos prémios que iriam ser entregue à formosa vencedora: um corte de vestido de crepe da China, oferecido pela Casa dos Enforcados e executado no atelier de Mademoiselle Bárbara Montana; uma moldura com inscrustrações da Casa Simões; um lindo estojo com duas escovas em prata da Ourivesaria Lemos; uma caixa de sabonetes finos da Casa Francisco José Petronilha: Como não imaginar os olhos brilhantes das garotas ao imaginar todas estas benesses a caírem-lhes no colo?

 

E na capital? Em Lisboa? O requinte haveria de ser maior, não vos parece? A afluência daqueles que procuravam bilhetes para a grande festa de dia 13 de setembro, às 15 horas, no Coliseu dos Recreios, recrudescia a olhos vistos. A rainha das costureiras de Lisboa seria certamente uma das favoritas a conquistar, uma semana mais tarde, o título de Rainha de Portugal numa cerimónia de arromba marcada para o Casino do Estoril. Afinal “noblesse oblige”.

Os preços para a grande “matinée” do Coliseu não eram propriamente populares no geral: cadeiras de orquestra, 10$00; cadeiras simples, 7$00; geral reservada, 4$00; geral, 3$00; camarotes de 1.ª ordem, 30$00; frisas, 30$00; camarotes de 2.ª ordem, 20$00.

Mas isso não evitava a corrida à bilheteira. Sobretudo porque o pessoal dos grandes armazéns das casas de costura lisboetas apostava em reservar setores inteiros da sala de espetáculos para ajudar com os seus aplausos as concorrentes que os representavam. Enfim, verdadeiras claques.

Anunciava-se uma novidade espampanante: um cronómetro Corbet de 3 metros de diâmetro que registava, à vista do público, a duração dos aplausos a cada competidora, indicação para o júri que teria de votar na mais bela e mais elegante.

Um glamour que António Botto não via nas costureiras das ruas: “Tilintam vozes – São elas/Que procuram a baiuca/Ou a pobre água-furtada/Onde vivem e onde comem/Uma açorda sem azeite/- Costureiras de Lisboa/Lindas caras de madona/Sem o riso de um enfeite!”

Versões diferentes de uma mesma vida…