Os cerca de 300 militares da unidade de elite da GNR que guardam as instalações do Banco de Portugal (BdP) no Carregado, onde são guardadas as reservas do ouro nacional e onde é fabricado o dinheiro, não recebem pelo serviço desde janeiro. E estão a preparar-se, apurou o i, para avançar com uma ação em tribunal para serem pagos.
Em causa está um diferendo entre o governo e o BdP sobre que montantes atribuir aos militares, mas a situação poderá estar resolvida em breve. Ontem, ao final do dia, o Ministério da Administração Interna (MAI, que tutela das polícias) adiantou ao i que “até ao final do mês” será celebrado um novo protocolo de cooperação entre a GNR e o banco, terminando assim as negociações – que já duram desde o início de janeiro, altura em que os guardas deixaram de receber, sem que, contam fontes da Guarda, lhes tenha sido dada qualquer explicação.
Apesar de não serem pagos pelo serviço no Carregado há quase nove meses, ontem o MAI garantiu ao i que os vencimentos dos militares “têm sido assegurados”, apesar de estar em em curso “uma avaliação da compatibilidade do pagamento de ajudas de custo inerentes a deslocações”. A ser assim, e se a verba estará a ser assegurada, onde pára, então, o dinheiro? O comando-geral da GNR encaminhou esclarecimentos para o MAI e o MAI não respondeu à pergunta do i. Já o Banco de Portugal não quis fazer comentários sobre o assunto.
A falta de pagamento aos militares da GNR que fazem a segurança às instalações do BdP no Carregado foi revelada pelo “SOL” em meados de maio. Desde então, nada se alterou e o descontentamento dos guardas tem vindo a crescer. De tal forma que estão a mobilizar-se para recorrer à Justiça. “Começa a ser insuportável assegurar o serviço sem receber um tostão desde o início do ano e sem que nos seja, sequer, dada uma explicação por parte das chefias sobre o porquê de os pagamentos terem sido cortados”, queixa-se um militar. “E entretanto estamos a pagar para trabalhar, porque como os turnos são de dias seguidos, temos de fazer as refeições nas instalações do banco e pagar por elas”, conta outro guarda.
valores de há 23 anos Os pagamentos foram suspensos no início de janeiro porque o BdP e o MAI entraram em negociações sobre os valores que devem ser cobrados pela segurança das instalações. Cada militar recebia, até dezembro, 278 euros por cada semana de trabalho no Carregado – sendo o serviço assegurado 24 horas sobre 24 horas, em turnos de sete dias seguidos, de segunda-feira a segunda-feira. Cada turno é composto por 23 homens, que vão rodando semanalmente entre os 300 elementos do Grupo de Intervenção de Ordem Pública (GIOP), a unidade de elite e mais “musculada” da GNR.
Só que os valores remontavam a outubro de 1995, quando foi assinado o protocolo entre a GNR e do Banco de Portugal (ver excertos do documento na página seguinte). E, nos últimos 23 anos nunca foram atualizados. O desentendimento entre o BdP e o MAI terá começado, aliás, no final do ano passado, quando um grupo de 200 guardas se juntou e contratou um advogado para reclamar a atualização dos honorários. O advogado escreveu ao comandante-geral da GNR a pedir informações sobre o protocolo de 1995 e a reivindicar mais dinheiro. E o então general comandante-geral, Mateus Couto, deu razão aos homens e decidiu renegociar o acordo.
Poucos dias antes do Natal, a GNR enviou uma proposta de aumento ao banco. Só que, entretanto, no início de janeiro, os guardas deixaram de receber. E o comando-geral da GNR abandonou as negociações, que estão agora a cargo do MAI. Em maio, quando o “SOL” divulgou o caso, o gabinete de Eduardo Cabrita negou que houvesse atrasos nos vencimentos. Numa resposta enviada ao jornal, por email, o MAI garantia “não ter conhecimento de qualquer situação de atraso nos pagamentos”.
Roubo lançou alerta No verão do ano passado, a seguir ao roubo de material de guerra dos paióis de Tancos, chegou a temer-se que os explosivos pudessem ser utilizados para atacar o Complexo do Banco de Portugal no Carregado, onde estão guardadas 176 toneladas de ouro, que correspondem a 40% do total das reservas do país. A hipóteses chegou a estar em cima da mesa, há exatamente um ano, numa reunião do Sistema de Segurança Interna (SSI). O alerta surgiu devido à proximidade entre Tancos e o Carregado (apenas 90 quilómetros).