Belém tem dúvidas constitucionais sobre lei que dá preferência a inquilinos. Veto à vista

Belém tem dúvidas constitucionais sobre lei que dá preferência a inquilinos. Veto à vista


A lei que Catarina Martins invocou estar por detrás da “infâmia” contra Robles deverá ser vetada por Marcelo


A lei que, no sábado, Catarina Martins disse que estava à espera de promulgação pelo Presidente – e que Belém se apressou a comunicar não ter ainda entrado nos serviços da Presidência – pode vir a ser objeto de veto político por parte de Marcelo Rebelo de Sousa, sabe o i. 

Os serviços jurídicos de Belém, apesar de ainda não terem o papel na mão, informaram-se sobre o articulado que foi aprovado na Assembleia da República e consideram que o texto tem várias inconstitucionalidades. Os juristas do Presidente acreditam que a obrigação de ser cumprido o direito de preferência do inquilino, em caso de o senhorio querer vender o prédio, colide com o princípio constitucional do direito à propriedade. 

Só na sexta-feira a lei deverá chegar a Belém, mas a avaliação prévia aponta para que esteja na calha mais um veto político. O envio para o Tribunal Constitucional está afastado – em dois anos e meios de mandato, Marcelo nunca enviou uma lei para o Tribunal Constitucional, ameaçando tornar-se o Presidente que menos trabalho dá aos juízes do Palácio Ratton.

Um outro aspeto preocupa os juristas de Belém relativamente à lei que dá ao inquilino o direito de preferência no caso de o proprietário decidir vender o prédio todo: o facto de entenderem que a lei parece ser feita à medida para travar a venda dos 2 mil imóveis da Fidelidade. E uma lei ad hominem também não tem o apoio da Presidência. O caso da Fidelidade foi apontado claramente pelo Bloco de Esquerda como um dos processos que seria inviabilizado com a nova lei em vigor. 

O decreto da Assembleia, aprovado a 18 de julho, altera o Código Civil “efetivando o direito de preferência pelos arrendatários na alienação do locado e garantindo plenamente esse direito”. Ou seja, independentemente do tempo que o inquilino residir na casa, terá sempre direito de preferência relativamente a outro comprador. E esse direito existirá mesmo se o prédio não estiver dividido em propriedade horizontal. 

Diz a lei: “Caso o obrigado à preferência pretenda vender um imóvel não sujeito ao regime da propriedade horizontal, podem os arrendatários do mesmo, que assim o pretendam, exercer os seus direitos de preferência em conjunto, adquirindo, na proporção, a totalidade do imóvel em compropriedade”. 

Quem é o pai da lei? Depois de Catarina Martins ter insinuado que haveria uma campanha contra Ricardo Robles, até porque estava por dias a entrada em vigor de uma lei que obriga os proprietários a darem direito de preferência aos inquilinos na compra dos imóveis, o PCP reclamou oficialmente a paternidade do projeto. António Filipe fez o esclarecimento no Facebook: “Só para que conste: o texto final do diploma (que ainda não seguiu para Belém, mas seguirá em breve) sobre direito de preferência dos inquilinos na compra da habitação em que vivem (que abrange o conhecido caso da Fidelidade) resultou de uma proposta na especialidade apresentada pelo PCP.”

No sábado, Catarina Martins falou pela primeira vez do caso Ricardo Robles e invocou que as notícias que davam conta de que Robles era coproprietário de um prédio que comprou por 347 mil euros e pôs à venda por 5,7 milhões – conforme noticiou o “Jornal Económico” – aconteciam porque o que o Bloco de Esquerda “está a fazer está a incomodar os interesses imobiliários”. 

A coordenadora do Bloco de Esquerda associava o caso Robles à lei que agora o Presidente da República se prepara para vetar, segundo apurou o i.

 “Isso acontece na mesma altura em que o parlamento aprovou legislação importante para proteger os inquilinos e em que aguardamos, por exemplo, a promulgação a breve trecho do direito de preferência sobre a propriedade que permite que o inquilino possa comprar só a sua fração quando o senhorio quer vender todo o empreendimento e, por isso, será um grande obstáculo a negócios que estão a ser preparados, nomeadamente a Fidelidade, que quer vender um enorme número de prédios em várias zonas do país”, disse Catarina Martins, contextualizando assim a sua veemente defesa de Ricardo Robles.

A lei, de facto, ainda não saiu do parlamento, onde está a passar pelos últimos retoques técnicos, e o Presidente da República prontamente desmentiu que “a promulgação” venha a acontecer “a breve trecho”, já que ainda não tinha dado entrada em Belém.

Só que não é o simples facto de a lei não ter chegado à Presidência que inviabiliza a rápida promulgação – é que o Presidente acha que ela é inconstitucional e o veto político está à vista.