As tendências vão e vêm, mas os smartwat-ches parecem ter vindo para ficar. É cada vez mais comum ver pessoas a utilizar estes pequenos ecrãs no pulso. Disponível em quase todas as cores, formas e feitios, esta tecnologia pode, de facto, ajudar a salvar vidas. Sim, leu bem. A garantia foi dada por Rui Cruz Ferreira, diretor do serviço de cardiologia do Hospital de Santa Marta, em Lisboa.
“Nós temos neste momento já um programa em funcionamento com o smartwatch”, explicou ao i o responsável. Apesar de o relógio da Nokia utilizado estar à venda nas lojas comuns, tem características diferentes dos smartwatches tradicionais porque tem a vantagem de ter “um sensor que está particularmente vocacionado para avaliar a frequência cardíaca”.
“Conseguimos estar a avaliar continuamente os parâmetros do doente”, esclareceu Rui Cruz Ferreira, acrescentando que, por exemplo, se o doente sofrer uma arritmia e a frequência aumentar muito, a equipa é capaz de a “detetar e depois chamar o doente” ao hospital para perceber o que se passou. Para além do relógio, os utentes deste programa do Hospital de Santa Marta recebem um kit de monitorização composto ainda por uma balança para controlar o peso, um aparelho para medir a tensão e um telemóvel, para conseguirem acompanhar todos os seus parâmetros. O programa, que está a ser desenvolvido dentro do Serviço Nacional de Saúde, não tem quaisquer custos para o doente. “Nós conseguimos um financiamento aqui dentro do hospital”, disse o médico.
Com esta tecnologia, “estamos a avaliar um conjunto de parâmetros desde o peso, frequência cardíaca e tensão arterial e, portanto, com isso conseguimos ter telemonitorização, ou seja, ver à distância como é que o doente se está a comportar ou está a responder à medicação”, referiu. O responsável considera ainda que este método dá outro tipo de segurança ao doente e ao hospital: os doentes “sabem que está alguém a olhar para o que se passa com eles e isso dá-lhes uma segurança muito grande”.
Pioneiros com smartwatches Apesar de outros hospitais já estarem a utilizar outros dispositivos tecnológicos para ajudar a estudar as doenças cardíacas, o Hospital de Santa Marta foi o primeiro a utilizar relógios inteligentes. O programa, que teve início há pouco tempo, em fevereiro, já conta com 12 doentes. A maior parte são “doentes que estão a aguardar transplantação”. E, através do dispositivo, o hospital consegue ter “uma indicação se há algum agravamento” e se o doente precisa de ser internado. Mas a ideia é expandir a tecnologia a mais pessoas. “Estamos a pensar aumentar para outras situações, nomeadamente doentes com enfarte do miocárdio, doentes que estejam a fazer reabilitação”, diz, salientando que para isso ainda são precisos vários estudos.
Apesar do acompanhamento regular, o médico diz também que este dispositivo é muito mais prático do que outro tipo de tecnologia: “É mais prático, porque não estamos a falar de dispositivos que a pessoa tem de colocar”, como um adesivo ou ter um cabo ligado; o relógio não provoca “nenhuma rutura com a realidade” porque é um aparelho que utilizamos diariamente.
Projeto modifica panorama da medicina? O projeto esteve um ano e meio no forno, a ser estudado e testado. Rui Cruz Ferreira acredita que esta tecnologia vai modificar o panorama da saúde nos próximos anos. “São coisas inovadoras”, explicou, e “por isso temos de estar atentos”, porque isto é uma mais-valia “muito grande”.
O especialista reforçou ainda que estes dispositivos ajudam a melhorar a proximidade do doente com os médicos. “Classicamente, os hospitais tratam os doentes numa fase aguda quando têm um problema, dão-lhe alta, fazem uma consulta de rotina e acaba aí o relacionamento”, descreve, frisando que “com isto se pode acompanhar particularmente as doenças crónicas, acompanhar a evolução dos doentes e ser-se muito mais eficaz do que se o doente for a uma consulta” de rotina de vez em quando.
“Sentem-se mais próximos. Ao contrário daquilo que possa parecer, tem mais personalização, nós conhecemos melhor os doentes e temos uma melhor relação pessoal com eles. Esta tecnologia aproxima, não é uma tecnologia que é impessoal e que afasta as pessoas”, afirmou, acrescentando que o smartwatch permite também traçar um melhor historial do doente. No entanto, a equipa – composta por médicos e informáticos – ainda tem um longo caminho a percorrer para perceber bem quais são as situações em que se tem mais vantagens: “É importante perceber que benefício temos agora, qual é o maior benefício que podemos ter e o caminho que temos de percorrer nos próximos tempos.”